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Argentina: depois da greve geral da CGT
A massas trabalhadoras se mobilizam e param o país enquanto o governo se ajoelha frente a Trump e o FMI
Publicado em: 14 de abril de 2025
Foto: André Valuche/Esquerda Online
Entre quarta-feira, 9, e quinta-feira, 10 de abril, houve uma mobilização maciça e uma greve geral convocada pelas organizações centrais de trabalhadores, que paralisou a economia do país, expressando o crescente repúdio das massas trabalhadoras aos ataques do governo aos seus interesses vitais: salários, condições de vida e trabalho.
Embora essa greve não seja suficiente para deter o governo, ela marca o caminho que o povo trabalhador e suas organizações devem seguir para reunir a força necessária para derrotá-lo, e levanta a necessidade de dar continuidade a ela com novas ações de massa, construídas por meio de assembleias, plenárias e órgãos democráticos que promovam o protagonismo das bases. Tudo isso no contexto de um ano eleitoral que já está começando nas províncias e que culminará com as eleições nacionais em outubro.
O confisco violento de salários, pensões e programas sociais, as demissões em massa, o fechamento de repartições públicas, a eliminação de direitos por decreto, a repressão, a perseguição, as ameaças e a intimidação pública do governo e de suas principais autoridades provocaram mobilizações e ações de massa em repúdio à sua política econômica e às suas afrontas às liberdades democráticas.
O discurso de Milei em Davos, em janeiro passado, estigmatizando o movimento de mulheres e a dissidência sexual, gerou uma assembleia antifacista autoconvocada no Parque Lezama, CABA, que convocou uma mobilização maciça no sábado, 1º de fevereiro, com centenas de milhares de pessoas em todas as cidades do país, em resposta à escalada autoritária do governo contra a dissidência sexual e as liberdades democráticas.
Os aposentados que se mobilizam semanalmente às quartas-feiras no Congresso para reivindicar contra os salários de miséria, contra o fim da moratória previdenciária que permitia que aqueles que não podiam fazer todas as contribuições tivessem acesso ao benefício previdenciário, contra a eliminação de benefícios como remédios gratuitos, entre outros, foram catalisadores do descontentamento social, que todas as quartas-feiras desafia a repressão brutal das forças federais, reunindo apoio e simpatia e expondo a passividade e a cumplicidade das lideranças sindicais em particular.
A liderança burocrática da CGT, em particular os setores mais favoráveis aos patrões e em diálogo com o governo, que desde a aprovação da Lei Básica em junho de 2023 haviam se retirado das ruas, facilitando o avanço do governo e dos patrões, foram forçados a se reajustar ao tamanho do ataque sofrido pelos aposentados, acompanhados por vários setores sindicais, sociais e políticos, incluindo os torcedores dos clubes de futebol que, diante do abuso e da repressão, se mobilizaram em solidariedade e também foram reprimidos de forma selvagem pelo governo.
Essa resistência, que estava ganhando apoio semana após semana, de vários setores, forçou as lideranças sindicais a convocar a mobilização de 9 de abril e a greve geral de 10 de abril, que colocou grandes setores da classe trabalhadora e suas organizações de volta às ruas, confrontando um governo que é um agente direto do FMI, das multinacionais e do capital financeiro.
A Argentina sob a tutela do Fundo Monetário Internacional
O governo de Milei, surgiu depois de décadas de crise e decadência econômica e política, com a consequente frustração de amplos setores sociais que ficaram sem a possibilidade de viver dignamente, como resultado da submissão aos desígnios do capital financeiro, que endividou o país uma e outra vez, com a ditadura, incluindo especialmente a dívida privada das empresas, fazendo com que todo o povo pagasse, um mecanismo que de várias formas se repetiu desde então com todos os governos da democracia. Essa frustração com os políticos da democracia burguesa é o que o atual presidente conseguiu capitalizar com um discurso neofascista. Diante dessa profunda desilusão das massas com o PJ, a UCR, o PRO e outros, Milei prometeu baixar a inflação aplicando um ajuste sem precedentes, nunca melhor simbolizado por uma motosserra que cortaria “os interesses da casta política”, o que lhe permitiu capitalizar o descontentamento e se manter no poder até agora, causando danos profundos ao país e a toda a classe trabalhadora.
O caráter neofacista de Milei, complementar ao seu fundamentalismo de mercado, é dado pela necessidade de impor uma derrota histórica à classe trabalhadora argentina, destruindo suas organizações, demonizando seus líderes e tentando impor um senso comum de criminalização de qualquer reivindicação, mobilização e luta popular ou democrática. Ousa-se até mesmo levantar novamente a teoria dos dois demônios ou defender genocídios. A burguesia e o imperialismo encontraram nele um novo, desavergonhado e violento expoente de seus interesses, independentemente de ele ser capaz de atingir seus objetivos.
É improvável que um sistema capitalista imperialista que está desmantelando rapidamente os estados de bem-estar social, que precisa destruir os direitos e as conquistas sociais alcançados pela classe trabalhadora no século XX, arrastando a humanidade para a barbárie, a guerra e a destruição ambiental, ofereça uma liderança política democrática. É por isso que, além do nome que finalmente se encaixa nesses governos, o de Milei e outros como ele adotam uma política e práticas que remetem à busca de uma “solução de força”, como era chamado o objetivo perseguido pelo facismo em sua época: destruir as organizações de trabalhadores e atacar as liberdades democráticas, chegando até o extermínio de setores da população, como o Estado de Israel está fazendo hoje em Gaza.
É necessária uma política para continuar a luta nas ruas até que Milei e seus cúmplices sejam derrotados
Embora Milei tenha chegado ao poder por meio de eleições e faça uso de mecanismos institucionais, sua política está bem fora dos limites da democracia burguesa, precisando sacudir o regime e impor novas regras do jogo, como vem demonstrando nos últimos tempos com decretos, repressão, denúncias persecutórias de líderes, demonização de piqueteiros, organizações sindicais e de gênero etc., invasões de instalações, entre outros. Não é um perigo apenas pelos interesses que representa (especialmente do exterior), mas também pelos métodos que busca estabelecer, legais e ilegais, estatais e paraestatais, recorrendo à violência em todas as suas formas.
É necessário derrotá-lo com mobilização nas ruas, com novas greves, bloqueios, piquetes e outros métodos da tradição operária argentina e mundial, uma estratégia que só podemos levantar a partir das organizações revolucionárias que não estão comprometidas com o regime e que o enfrentam de forma consistente em todas as áreas, buscando uma solução política anti-imperialista e socialista que os partidos e as lideranças tradicionais não serão capazes de fornecer.
Essa estratégia pode ser implementada com base em uma proposta unificada para continuar o confronto com Milei, promovendo a unidade de ação, a organização comum, a coordenação de ações e iniciativas para fortalecer as lutas parciais e a mobilização, com amplitude e respeito a todas as organizações, na medida em que contribuam para a força social que precisamos reunir nas ruas para derrotá-lo.
Diante de um presidente que está golpeando duramente a classe trabalhadora, com o risco de infligir-lhe uma profunda derrota, fazendo-nos regredir qualitativamente, a militância trotskista deve tirar o pó dos ensinamentos do mestre antes do advento do nazismo na Alemanha, de 1928 a 1933, quando travou memoráveis batalhas políticas para que o Partido Comunista Alemão formasse uma frente unida com o Partido Social Democrata Alemão, com o objetivo de impedir a ascensão do nazismo ao poder. Seus fundamentos e críticas lúcidas devem ser conhecidos e aplicados ao momento atual, sob circunstâncias diferentes, mas com inimigos que não podem ser enfrentados a não ser como um todo.
A esquerda revolucionária tem sido e é um fator importante no confronto com Milei, embora não tenha, por enquanto, influência e força suficientes para vencer essa luta sozinha. Mas, com uma política justa e unida, ela pode colocar em ação uma força muito superior àquela que cada um deles exerce separadamente. E não se trata de uma questão de unidade de ação entre as próprias organizações revolucionárias, mas com as bases e as lideranças dentro do peronismo, que devem ser corretamente desafiadas à unidade, o que seus líderes não querem, porque temem a influência e o merecido prestígio da esquerda revolucionária.
Entre os novos elementos da situação, que explicam o reajuste da CGT, estão as mobilizações nacionais maciças de 1º de fevereiro, convocadas pelos dissidentes sexuais, bem como as de 8 e 24 de março, Dia Internacional da Mulher e aniversário do golpe de Estado de 1976, bem como o protagonismo dos torcedores de futebol e dos setores que se juntaram às mobilizações de quarta-feira, os aposentados, que finalmente forçaram a CGT a nacionalizar o conflito convocando uma greve geral. Agora, é a própria CGT que pretende tomar a iniciativa de convocar a comemoração do 1º de maio. É com uma coluna independente que devemos responder a essa situação ou é com uma política unida, que faça com que nossa abordagem estratégica seja ouvida e compreendida por mais setores do que apenas o nosso? Não há uma receita para todos os momentos, depende dos objetivos que temos, seja para nos reafirmarmos ou para avançarmos nas fileiras das lideranças traidoras.
Esse enfoque unitário hoje envolve a criação de assembleias, plenárias, reuniões e espaços unidos e amplos, com o foco na derrota de Milei, seu governo e seus cúmplices políticos e sindicais, uma experiência a partir da qual a militância revolucionária se dirige a setores mais amplos e testa seu valor, suas consequências, sua metodologia, ganhando no processo essa autoridade política, base da luta pela liderança dos setores de massa. Os órgãos convocados pelas correntes que orientam o sindicalismo militante no país devem adotar essa política, que é mais justa e adequada para influenciar as fileiras da burocracia.
A greve geral e a mobilização desta semana mostram que a classe trabalhadora argentina e suas organizações não foram derrotadas e estão lutando para reverter o ataque do governo Milei, que agora voltará recarregado com o apoio do FMI e de Donald Trump para continuar aplicando sua cruel motosserra.
Vamos nos basear na experiência de nossa classe e na tradição revolucionária para dar respostas no presente aos desafios da luta das massas trabalhadoras para derrotar os inimigos de classe, seu governo, seu estado e seus representantes.
*SUTEBA – Sindicato Unificado de Trabajadores de la Educación de Buenos Aires.
Tradução por Bruno Rodrigues/Esquerda Online
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