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CULTURA

Franquismo e futebol na Catalunha

Michel Goulart da Silva
La Razón

Embora o futebol no presente seja um comércio lucrativo e os clubes tenham se convertido em empresas que movimentam milhões em dinheiro, em muitos casos a história de alguns times está marcada pela identificação cultural com sua região e mesmo com importantes processos políticos. Um dos exemplos mais marcantes disso certamente passa pelo FC Barcelona, time de futebol da Catalunha, que, em sua história, também carrega uma forte ligação com a luta contra o governo do ditador Francisco Franco.

O movimento em defesa da autonomia da Catalunha mantém um processo de resistência contra as imposições políticas e culturais oriundas do poder central da Espanha. Essa resistência teve, ao longo dos séculos, momentos de avanços e recuos, como no referendo que aprovou a independência da Catalunha em 2017. O processo que culminou na vitória separatista com cerca de 90% dos votos contou com mobilizações de massas, inclusive com uma greve geral em outubro de 2017. Contudo, o processo sofreu com a repressão por parte do governo central da Espanha.

Esse recente processo de mobilizações contou com a participação de jogadores ou de outras figuras associadas ao FC Barcelona. Poucos dias antes do plebiscito, o zagueiro Pique escreveu em suas redes sociais: “A partir de hoje e até domingo, vamos nos expressar pacificamente. Não vamos dar a eles qualquer desculpa. Isso é o que eles querem. Cantaremos bem alto e forte”. Pep Guardiola, ex-técnico do Barcelona, também se pronunciou: “A única coisa que queremos, e eu imagino que toda a Europa saiba disso, é votar. Porque não pedimos independência, pedimos direito ao voto. É uma questão de democracia”. Em 2015, Guardiola participou da lista independentista nas eleições regionais da Catalunha.

Em outubro de 2019, nove líderes do movimento pró-independência foram condenados por envolvimento na tentativa de independência na região em 2017. Os réus foram absolvidos da acusação mais grave, a de rebelião, mas receberam penas de prisão de 9 a 13 anos por sedição, ou seja, uma forma mais branda de rebelião contra autoridade. Essa sentença provocou uma série de protestos na Catalunha, havendo, em alguns casos, confrontos entre forças de segurança e manifestantes.

Diante das prisões, o próprio FC Barcelona se posicionou de forma crítica. O clube, em nota pública, se colocando “como uma das entidades de referência da Catalunha, e de acordo com sua trajetória histórica, desde a defesa da liberdade de expressão e o direito a decidir”, afirmou na nota:

“Por isso, agora mais do que nunca, o clube pede a todos os responsáveis políticos que liderem um processo de diálogo e negociação para resolver este conflito, que também deve permitir a liberação dos líderes civis e políticos condenados. O FC Barcelona manifesta também todo seu apoio e solidariedade às famílias daqueles que são privados de suas liberdades”.

Em comparação, o Espanyol, outro clube catalão, se manifestou de uma forma neutra, se reivindicando uma “entidade puramente esportiva”, afirmando “nosso respeito pelas decisões judiciais e lamentamos o sofrimento que, infelizmente, certas situações processuais podem gerar para pessoas, suas famílias ou sentimentos coletivos”.3 Portanto, mesmo diante do regime de execução imposto pelo governo central contra a Catalunha, o Espanyol se limitou a dizer que respeitava o andamento do processo judicial. Esse tipo de posição do Espanyol não chega a ser novidade, afinal

“o nome do clube explicita tanto o patrocínio real quanto sua perspectiva de uma nação espanhola (‘espanyol’) e, em seus primórdios, o clube classificava o Barcelona como um time de ‘estrangeiros’. Seus membros fizeram uma petição antiautonomia em 1918 e, na Guerra Civil, combateram ao lado dos falangistas de Franco”.

O posicionamento do FC Barcelona nos processos políticos da Catalunha não se dá ao acaso, mas é produto de uma trajetória que inclui o combate ao franquismo e a defesa do direito de a população catalã decidir os rumos de sua nação. Esse processo, além de expressar as lutas recentes pela independência catalã, tem relação com disputas políticas ocorridos no contexto da guerra civil e a resistência contra o franquismo.

Guerra civil e ascenso do franquismo

Embora o tema possa causar polêmicas inclusive entre historiadores, a Catalunha foi independente entre os séculos XII e XVIII. Nesse período, a região “tinha parlamento próprio, sistema jurídico próprio e um código comercial copiado por todo o mundo mediterrâneo”. Essas instituições foram dissolvidas após a Guerra da Sucessão (1701-1714), travada pela herança do trono real da Espanha depois da morte do então rei Carlos II, em 1700.

Em março de 1713, as tropas de Felipe V iniciavam o cerco à cidade de Barcelona, que resistiu à ocupação estrangeira. Os dezoito meses de cerco e de lutas ferrenhas obrigaram a Catalunha a capitular em 11 de setembro de 1714. Sabe-se que “o cerco a Barcelona é visto por testemunhos contemporâneos como a agressão a um povo que havia feito da liberdade o fundamento das suas instituições”. Essa é a explicação para que o dia 11 de setembro permaneça como um marco na luta pela independência da Catalunha.

No começo do século XX, em meio ao ascenso do movimento operário, a Espanha viu a derrubada da monarquia. Em 1930 terminou na Espanha a ditadura do general Primo de Rivera, iniciada em 1923. Em meio à polarização entre republicanos e monarquistas, o rei Afonso XIII convocou eleições municipais em abril de 1931. O historiador Pierre Broué define o resultado deste processo eleitoral como um “verdadeiro maremoto”, diante do “comparecimento excepcionalmente elevado”, com “maioria esmagadora para os republicanos em todas as grandes cidades, e principalmente em Madrid e Barcelona”.1

Em meio a manifestações que exigem a instauração da República, o rei abdicou, sendo proclamada a República no dia 14 de abril de 1931. Contudo, esse processo se mostrou cheio de contradições, como se percebe, entre outros elementos, pela composição do governo provisório que assumiu o poder:

“Todos são homens de ordem, desejosos de impedir, até de combater, a Revolução, e sua aliança – nessa base negativa – é impotente diante das tarefas da ‘revolução burguesa’ que se impõem à Espanha para sair das suas contradições seculares: o problema da reforma agrária, a questão das nacionalidades, as relações entre Igreja e o Estado, o destino do aparelho burocrático do exército da monarquia que é confiado ao único homem novo dessa equipe, o republicano de esquerda Manuel Azaña”.2

Em setembro de 1932, nesse processo de democratização, diante da constituição da república, foi aprovado o Estatuto de Autonomia da Catalunha. Em agosto de 1931, no processo de debate e elaboração do estatuto, um referendo popular com a participação de cerca de 75% dos eleitores aprovou o texto quase por unanimidade.

No ano seguinte, foram convocadas novas eleições. Consequência de uma significativa abstenção, impulsionada pela CNT, de influência anarquista, e ancorada na frustração de grande parte dos trabalhadores com o governo, a coalizão de direita, formada pela Confederação Espanhola de Direita Autônoma (CEDA), simpática ao fascismo, e pelos republicanos de direita, obteve a maioria. Iniciava-se assim o período conhecido como “Biênio Negro”, entre 1933 e 1935.

Em 1936, uma aliança de socialistas, comunistas e republicanos ganhou as eleições, dando início ao governo da Frente Popular. Esse bloco eleitoral defendeu como base de um programa mínimo o “retorno à política religiosa, educacional e regional dos primeiros dois anos da República; reforma agrária mais rápida e mais eficiente; e anistia imediata para os 30 mil presos políticos ainda na cadeia em razão dos acontecimentos de 1934”.3

Os setores de direita continuaram a se organizar em mobilizar. Em julho de 1936, um levante militar colocou de forma explícita o cenário de guerra civil. Nesse cenário de conflito, diante da ação da direita,

“[…] ou os militares venceram, e as organizações operárias e camponesas são proibidas, seus militantes aprisionados e abatidos, a população trabalhadora submetida à mais feroz dos terrores brancos. Ou a sublevação militar malogrou, e as autoridades do Estado republicano foram varridas pelos operários que travaram combate sob a direção das suas organizações reagrupadas nos ‘comitês’ que se atribuem, com o consentimento e o apoio dos trabalhadores em armas, todo o poder, e lutam pela transformação da sociedade. A iniciativa da contrarrevolução desencadeou a revolução”.4

Na luta que se seguiu, a direita venceu muitos dos combates, se beneficiando da ajuda externa, especialmente dos governos nazista da Alemanha e fascista da Itália. Em 1939, terminou a guerra civil, com o General Franco afogando em sangue a revolução e estabelecendo uma ditadura que durou décadas.

Com o ascenso e a vitória franquista na Guerra Civil, a Catalunha voltou a ser reprimida; teve instituições fechadas e a língua foi proibida. Franco, em lei de abril de 1938, afirmava que o estatuto da Catalunha havia deixado de ter validade desde julho de 1936. Com um novo documento, Franco afirmava buscar “restabelecer um regime de direito público que, de acordo com o princípio de unidade da Pátria, devolve àquelas províncias [abrangidas pelo estatuto de 1932] a honra de ser governada em pé de igualdade com seus irmãos do reto da Espanha”.5 O FC Barcelona, orgulho da cultura catalã, não passou ileso por esse processo.

O FC Barcelona e o franquismo

O FC Barcelona já se manifestava contra ditaduras como a de Primo de Rivera, iniciado com um golpe, em 1923. Outro exemplo se deu dois anos depois, quando o hino da Espanha foi vaiado em um jogo. O clube foi punido, com o fechamento por seis meses e a renúncia forçada do presidente da equipe, Joan Gamper. O FC Barcelona era um importante time nesse momento: “Até o início da Guerra Civil Espanhola o Barcelona já havia conquistado nove títulos nacionais, entre eles a primeira edição da Liga em 1929 e tinha milhares de sócios que consideravam o clube como legítimo representante da cultura catalã”.12

Essa postura de apoio ao nacionalismo catalão incomodava os setores que combateram os republicanos na guerra civil. Um ano depois de iniciar seu mandato como presidente do FC Barcelona, Josep Sunyol i Garriga, membro da Esquerda Republicana da Catalunha, partido independentista ainda hoje existente, foi fuzilado no dia 6 de agosto de 1936. Durante a Guerra, o Barcelona o considerou como “presidente em ausência” e passou a ser gerido por um comitê. Em setembro de 1939, para investigar a morte, foi aberto um inquérito, encerrado em julho do 1944. Para os relatores do processo, Josep Suñol era “um comunista, separatista, responsável pelo marcado rumo anti-espanhol do FC Barcelona”.

Com o início da ditadura de Franco, foi proibido o uso de símbolos regionais e reprimindo manifestações nacionalistas. Esses princípios estavam destacados em um aparato legal elaborado pelo franquismo. Um exemplo dessas concepções está expresso em documento de 1958:

“A comunidade nacional baseia-se no homem, como portador de valores eternos, e na família, como base da vida social; mas os interesses individuais e coletivos devem estar sempre subordinados ao bem comum da Nação, constituída pelas gerações passadas, presentes e futuras. A lei protege igualmente os direitos de todos os espanhóis”.6

Diante desse tipo de aparato legal, imposto pelo franquismo, não havia espaço para a autonomia catalã, que deveria fazer parte obrigatoriamente da nação espanhola. Nesse contexto, o clube teve forçosamente o nome trocado, passando de Fútbol Club Barcelona (FCB) para Club de Fútbol Barcelona (CFB). Os símbolos e escudos do time também tiveram que ser alterados:

“O escudo tradicional do clube tinha quatro faixas vermelhas e cinco amarelas, alusivas à bandeira catalã. Porém, durante o novo regime as quatro listras vermelhas se tornaram duas para serem similares a bandeira nacional da Espanha. Em 1949, ano do cinquentenário do Barcelona, a agremiação foi autorizada pelo governo a utilizar o escudo antigo com a bandeira da Catalunha”.

O FC Barcelona também sofreu com o impacto financeiro. O número de sócios caiu em pouco tempo devido a Guerra Civil. Na época, muitos homens foram convocados para combater nos campos de batalha e, de quase 8 mil sócios em 1936, o clube passou para cerca de 3 mil membros em 1939.

Nesse período, o FC Barcelona sofreu a intervenção por parte do regime. Sua diretoria foi preenchida por membros de confiança de Franco, que buscava controlar os maiores clubes da Espanha. Esse controle, que se dava tanto por meio de cooptação de sua direção como pela repressão e perseguição a seus membros, se deu também, entre outros clubes, no Atlético Madrid e no Real Madrid, que, assim como o FC Barcelona, em diferentes momentos e de diferentes formas, também foram usados como instrumento de propaganda pelo franquismo. O FC Barcelona assim comenta em sua página oficial, sobre as ações do governo franquista:

“Há um desejo claro de aniquilar para sempre o carácter cívico e o significado sociocultural que o FC Barcelona teve desde a sua criação. O Estado assume a responsabilidade, através da Delegação Desportiva Nacional, da elaboração dos estatutos dos clubes, da nomeação dos seus presidentes e da expurgação dos seus dirigentes, funcionários e atletas não relacionados com a nova ordem. O sócio não tinha direito a nada, nem mesmo a se reunir em assembleia”.

O FC Barcelona, depois da vitória dos franquistas na guerra civil, passou a ser gerido, durante um ano, por uma comissão de gestão imposta pelo regime. Posteriormente, Franco nomeou como presidente uma pessoa de sua confiança, Enrique Piñeyro Queralt, marquês da Mesa de Asta, comandante do exército franquista, que se manteve no cargo até 1943. Queralt foi o primeiro presidente da história do clube escolhido sem consulta democrática prévia aos sócios.

Com a mudança de estatuto, no começo da década de 1940, cresceu também o controle do governo sobre o clube. Foi constituído um conselho com 12 a 18 membros, que poderiam ou não ser sócios da entidade, tendo sido indicados vários dos aliados de Franco. O presidente era nomeado pela Federação Catalã de Futebol com a aprovação da Federação Espanhola. E isso nem era a pior parte, como relata o próprio clube:

“para demonstrar a afinidade do presidente com o regime será necessário comprovar: onde trabalhou antes da guerra, onde foi surpreendido pelo golpe de Estado e o que fez durante o conflito e até ao seu fim. Estas exigências também serão estendidas aos executivos que, assim como o presidente, não poderiam renunciar ao cargo sem o consentimento das autoridades”.

Esse autoritarismo imposto ao clube previa inclusiva a ameaça de expulsar os membros “pelo seu comportamento moral, social ou político”. Embora haja uma progressiva abertura política, como a possibilidade de realização de assembleias (ainda que apenas com até 1% dos sócios), somente com o fim do regime franquista os membros do FC Barcelona voltaram a poder participar plena e livremente da vida do clube.

Durante a ditadura, o FC Barcelona se tornou um meio de transmitir o nacionalismo franquista, que procurava mostrar a Catalunha como parte integrante da nação espanhola. Eram feitas grandes atividades públicas, que associavam o clube ao governo, como foi a inauguração do estádio Camp Nou, em maio de 1957. Essa celebração contou com uma missa oferecida por Monsenhor Narciso Jubany e com a presença de José Solís, Ministro Secretário Geral do Movimento, e José Antonio Elola Olaso, Delegado Nacional de Educação Física e Esportes. O governo contribuiu materialmente no processo que levou à construção do novo estádio.

Exemplos de cooptação também foram as honrarias entregues a Franco pelo clube ao longo do período ditatorial. Na época, todas as entidades tinham de conceder essas distinções, legalmente ou por obrigação tácita. No caso do FC Barcelona, em 1951, Agustín Montal Galobart, presidente do clube desde 1946, após uma final de Copa del Rey, por iniciativa própria, impôs uma homenagem do clube a Franco. Em 1971, Franco recebeu outra condecoração, em que a direção do clube agradeceu o governo pela colaboração na construção das suas novas instalações.

Em fevereiro de 1974, veio outra medalha a Franco, poucos dias depois de um clássico entre o FC Barcelona e o Real Madrid. Esse jogo, vencido por 5 a 0 pelos catalães, foi considerado um marco simbólico no contexto que levou à derrubada do regime ditatorial. Um jornal de Madrid comentava, diante do resultado do jogo: “Todos os homens do Barcelona eram homens livres, como se houvessem resolvido através do futebol um problema social e político. Sim, o jogo do Barcelona foi um canto à liberdade, quase revolucionário”.

Portanto, diante da repressão do regime e de cooptação por parte do governo, o FC Barcelona se tornou um clube institucionalmente franquista. Contudo, a torcida, expressando a resistência catalã, via o clube como um orgulho de sua cultura. Essa disputa simbólica – que expressava uma tensão política e social – desagradava o governo, mas, ao final, o povo catalão conseguiu fazer o FC Barcelona voltar a ser uma representação de seus anseios.

Crise do franquismo e abertura política

Na década de 1960, a ditadura franquista começou a mostrar o processo de crise, impactando a situação na Catalunha e no controle sobre o FC Barcelona. Com o passar dos anos, o FC Barcelona foi recuperando sua autonomia. Em 1974 novamente mudou de nome e passou a adotar o nome atual de Fútbol Club Barcelona. Além disso, para celebrar os 75 anos do clube, foi composta a canção Cant del Barça, que passou a ser adotada como hino. Sua letra, recheada de menções as suas origens, mostra a ligação entre o Barça e a sociedade catalã,

“com trechos que remetem a irmandade sob uma bandeira [una bandera ens agermana], a união que faz a força entre torcedores e jogadores [Jugadors, Seguidors, tots unit fem força], os tempos difíceis durante a era Franco [son molts d’anys plens d’afanys], que ninguém poderá abater o clube [que mai ningú no ens podrà tòrcer] e a alusão a um grito que todos conhecem [tenim un nom, el sap tothom: Barça!, Barça!, Barça!]”.

Com a queda do franquismo e a transição da ditadura na Espanha, os torcedores do Barcelona também puderam se manifestar mais livremente. Um dos exemplos disso foi o retorno das consultas livres para a escolha do presidente do clube, cuja comemoração dos 40 anos foi assim noticiada no próprio sita oficial do FC Barcelona:

“Com o processo de transição da ditadura franquista para o novo regime democrático, o Barça conseguiu livrar-se do anacrônico sistema de eleições presidenciais por um sistema de delegados escolhidos por sorteio e pode estabelecer o sufrágio universal. Desta forma, as eleições de 1978 foram as primeiras totalmente democráticas”.

O clube seguiu sendo um símbolo da luta pela autonomia da Catalunha, sendo levado para seu estádio muitas vezes referências a essas lutas. Essas questões passam por aspectos como a mensagem més que un club (“mais que um clube”), gravada nas arquibancadas do Camp Nou, como ações vindas da torcida ou do próprio clube. Criado no final da década de 1960, o lema “mais que um clube” busca “expressar esse sentimento social de orgulho e valorização cultural dos catalães, sugerindo que o clube transcendia a esfera esportiva e possui um compromisso sociocultural”.7

Nos anos recentes, a resistência catalã se expressou também nas vaias da torcida ao hino espanhol durante a final da Copa do Rei, em maio de 2015. Ou quando os torcedores gritam “independência” durante as partidas no minuto 17’14. Outro exemplo desses embates passa pela retirada das condecorações a Franco, em assembleia realizada em fevereiro de 2019. Na época da realização da assembleia, depois da votação quase unânime (671 votos a favor, 2 contra e 7 abstenções), o FC Barcelona noticiou em sua página que “a retirada formal destas medalhas tem sido uma exigência periódica de muitos membros”.

Embora muito do simbolismo político tenha se enfraquecido diante da crescente força da mercantilização do futebol, a história da resistência catalã continua a ser revisitada. Esse processo político pela autonomia permanece como uma ferida aberta, depois de tantos séculos, e certamente os catalães não deixarão de fazer seu principal time expor e se posicionar sobre essa luta.

NOTAS
1 Pierre Broué, A Revolução Espanhola (1931-1939). São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 18-9.
2 Pierre Broué, A Revolução Espanhola (1931-1939). São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 33.
3 Ian Gibson. Frederico García Lorca: a biografia. 2ª ed. São Paulo: Globo, 2014, p. 551.
4 Pierre Broué, A Revolução Espanhola (1931-1939). São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 76-7.
5 O documento está disponível em https://www.boe.es/datos/pdfs/BOE//1938/534/A06674-06674.pdf
6 Ley de Principios del Movimiento Nacional. In: Leyes Fundamentales del Reino. Madrid, DONCEL, 1975, p. 10. Disponível em https://www.cervantesvirtual.com/portales/constituciones_hispanoamericanas/obra/leyes-fundamentales-del-reino/
7 Jonathan Rocha de Oliveira & André Mendes Capraro. Independência catalã, identidade e globalização no Fútbol Club Barcelona. Motrivivência, 32(61), 2020, p. 9. Disponível em http://educa.fcc.org.br/pdf/motrivivencia/v32n61/2175-8042-motri-32-61-e64993.pdf