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Sobre o segundo turno em São Bernardo do Campo – SP

Elber Almeida, do ABC Paulista (SP)
Câmara dos deputados

Infelizmente, o primeiro turno em São Bernardo do Campo seguiu a tendência nacional: vitória da extrema-direita e da direita tradicional, o assim chamado “centrão”. Isso frustrou a expectativa de que a vitória de Lula em 2022, quando ele foi o candidato mais votado para a Presidência da República na cidade, com 262.223 votos (53,83%), ampliaria o espaço eleitoral da esquerda, principalmente em seu domicílio eleitoral e na cidade onde ele se tornou a principal liderança dos trabalhadores nas greves históricas do movimento operário entre 1978 e 1980.

A esquerda permaneceu do mesmo tamanho na câmara. O PT, que estava com 3 vereanças agora possui 4, mas em 2020 também havia eleito 4, antes de um dos vereadores se debandar para a direita. O PSOL, PCdoB e PSTU não elegeram.

Teremos um segundo turno disputado por dois projetos iguais. O PT ficou pelo primeiro turno, com o deputado estadual Luiz Fernando atingindo 23% dos votos, praticamente repetindo o ocorrido em 2016 quando o atual prefeito, Orlando Morando (PSDB), venceu pela primeira vez num segundo turno contra Alex Manente (Cidadania). Naquela ocasião o golpe que derrubou Dilma Roussef fez a diferença ao desmoralizar o PT que disputava na cidade com Tarsicio Secoli, que atingiu 22,5% dos votos e também não avançou para a segunda etapa.

Em 2024, Alex Manente concorrerá com Marcelo Lima (Podemos), que sofreu cassação por infidelidade partidária de seu mandato de deputado federal após se desfiliar do PSB. Existe alguma diferença real entre os dois?

Alex Manente é do Cidadania, antigo PPS, partido que enfrentou crise recente sobre a localização frente ao governo Lula. Um grupo de parlamentares, principalmente do nordeste, procurava estar no governo, enquanto a maioria do sudeste defendeu a localização de oposição de direita. Manente é um típico político da direita tradicional. Além do fato do partido do mesmo estar em federação com o PSDB, podemos citar a sua votação a favor das reformas da previdência e trabalhista no Congresso Nacional enquando deputado federal, além da campanha ativa feita pelo mesmo anos atrás pela redução da maioriadade penal, com outdoors espalhados pela cidade.

Não podemos dizer que o mesmo é um bolsonarista, porém, seu vice Paulo Chuchu sem sombra de dúvidas se encaixa nessa definição. Acusado recentemente de ameaçar um jornalista enquanto estava armado em plena câmara de vereadores, Chuchu foi o articulador e proponente da entrega do título de cidadão São Bernardense para Bolsonaro e um de seus filhos na câmara municipal. O mesmo é ex-assessor parlamentar de Eduardo Bolsonaro. Sua prática desrespeitosa ao provocar servidores em greve em 2023 é só a ponta do Iceberg de sua prática política.

Por outro lado, Marcelo Lima foi vice do atual prefeito, Orlando Morando. No curto período em que esteve na câmara federal, o mesmo foi ativo defensor do fim da audiência de custódia, projeto da extrema-direita para ampliar o encarceiramento em massa no país. Além de tudo, fato que passa despercebido por muitos, tem como um dos principais apoiadores Rafael Demarchi, ex-prefeiturável que não decolou nas pesquisas, porém é um bolsonarista convicto, sendo que foi apoiar a campanha de Pablo Marçal do PRTB à prefeitura de São Paulo, cidade vizinha. No Instagram, Demarchi chega a se declarar como coordenador de Marcelo Lima.

Ambas as “alternativas” representam o mesmo: duas coalizões da direita tradicional com o fascismo e outras variantes da extrema-direita. Marcelo Lima disputou os votos do PT na periferia da cidade, com o apoio de mais da metade da base de apoio do atual governo na câmara, a princípio 13 vereadores. Agora, conta com o apoio de algo em torno de 20 vereadores. Talvez, por este peso institucional que atinge a periferia da cidade através do voto orientado por bairro, lideranças populares e ativistas se sentem tentados a apoiar o mesmo.

Porém, o apoio do atual prefeito, Orlando Morando, e de sua sobrinha e ex-candidatada à prefeitura, Flaávia Morando, a Lima no segundo turno, é um fator a mais que demonstra a natureza de sua candidatura. Orlando representa uma tendência mais à direita dentro do próprio PSDB, sendo público o seu conflito com o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. O mesmo prefeito realizou despejos em meio à pandemia. Práticas como fechamento de bibliotecas e demolição de teatro na periferia, retirada do ensino de capoeira das escolas, perseguição às batalhas de MC’s, tentativa de despejar o histórico Projeto Meninos e Meninas de Rua do centro da cidade levaram a uma denúncia protagonizada pelos movimentos sociais que foi a diversos órgãos nacionais e internacionais, como Ministério Público e ONU, acusando a atual administração municipal de racismo institucional.

No que diz respeito aos trabalhadores do serviço público, Limaassinou uma carta-compromisso em que diz atender diversas demandas da categoria de trabalhadores municipais. Porém, com o apoio do atual prefeito Orlando Morando, que teve como prática a desvalorização da categoria desde 2017, como tais compromissos podem ser levados a sério? Orlando deslegitimou o SINDSERV-SBC mais de uma vez, não apenas ao ignorar a abertura de mesas de negociação, como chegou a impedir o desconto em folha da mensalidade sindical dos trabalhadores sindicalizados, o que foi interrompido pela justiça. Durante seus mandatos, os servidores foram desvalorizados com perdas salariais frente à inflação, não pagamento de progressões e precarização das funções, como acúmulo de trabalhos burocráticos, insegurança quanto à titularidade dos postos de trabalho e o avanço do processo de terceirização no ensino infantil e fundamental, sem falar na implantação do projeto de EJA-EAD propagandeado como inclusão educacional após o efechamento de várias unidades de EJA na cidade.

Marcelo Lima faz parte do projeto neoliberal, assim como Alex Manente, e ambos flertam abertamente com a extrema-direita e o neofascismo, seja através de seus posicionamentos ou de suas composições. O PT liberou sua militância a anular ou a votar em Lima. Porém, fica a pergunta: para quem Lima governará se chegar ao paço municipal? Os Morando entraram na campanha de Lima sob a exigência de excluir a possibilidade do PT ingressar na mesma. Isso é um indicativo de que a campanha se insere na aposta de normalizar o antipetismo em todas as camadas sociais, abrindo ainda mais a via para a extrema-direita, o que possui um peso simbólico extra na região que é um dos berços do Partido dos Trabalhadores.

A indicação do voto nulo pelo diretório do PSOL na cidade demonstra que o partido, apesar dos desafios, está disposto a enfrentar com a mesma intensidade o futuro governo, seja qual for, e deverá fazê-lo apoiando-se na mobilização do movimento antirracista, feminista, indígena, LGBTQIA+, estudantil e sindical. O partido segue chamando a esquerda da cidade para preparar as lutas que virão, sendo que construção de uma futura oposição de esquerda municipal desde já é o caminho possível a trilhar e o voto nulo acompanha essa saída.