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MOVIMENTO

Encerrada a greve dos rodoviários de Recife

Categoria protagonizou uma das greves com maior adesão da sua história e varreu da Convenção Coletiva de Trabalho, cláusula nociva implementadas pelas gestões anteriores

Por Bruno Rodrigues e Sérgio Prado, de Recife (PE)

Encerrou-se nesta terça, 13, após audiência de conciliação no Ministério Público do Trabalho, a greve rodoviária de Recife. Além do reajuste acima da inflação, no ticket e no abono por dupla função (direito que até então não era cumprido por todas as empresas) há dois pontos fundamentais para os rodoviários que só foram possíveis por conta desses dois dias de greve.

Um deles é a conquista do plano de saúde. Durante as negociações anteriores à greve, os patrões até admitiam falar nesse tema, mas sem aceitar assinar nada. Um evidente engodo para engabelar o sindicato e a categoria. Com a greve, foi possível um avanço concreto: o MPT irá convocar e mediar uma audiência, em janeiro, com o objetivo de discutir a implementação desse benefício para os trabalhadores. Uma decisão que os empresários tiveram que assinar muito a contragosto.

O segundo avanço, talvez um dos temas que mais tenha incentivado a adesão da categoria, foi a mudança na cláusula do controle de jornada. Essa cláusula, que da maneira que estava elaborada, heranças das gestões pelegas de Grilo e Patrício, estabelecia mecanismos que roubavam dinheiro do motorista, escondendo dele o controle da própria jornada exercida na empresa. Assim, até então o trabalhador fazia uma espécie de login no GPS do veículo somente após o procedimento de check list. Dessa maneira, os minutos perdidos no check list acabavam não sendo remunerados. Ocorria da mesma maneira ao fim do expediente, em que o trabalhador fazia o logoff no GPS para, somente em seguida, fazer a prestação de contas na empresa. Esse pequeno espaço de tempo, do deslocamento até a garagem e da prestação de contas, todos os dias, também não era remunerado. Ocorria o mesmo com o tempo de embarque e desembarque de passageiros nos terminais, que também não era contabilizado como tempo de trabalho, portanto, não era remunerado.

Com a greve, foi possível conquistar mudanças nessa cláusula de modo que todo o conteúdo anterior acabou sendo varrido. Assim, o trabalhador só fará o check list no carro depois de fazer login no GPS e só fará log off no GPS, depois de deixar o carro na garagem e de prestar contas ao responsável. Além disso, o tempo de embarque e desembarque nos terminais, passará a ser contabilizado como hora trabalhada e, portanto, será remunerado. Ao mesmo tempo, o acordo garantiu que todo trabalhador passará a ter acesso à sua jornada, seja de forma impressa, seja através de aplicativo. Pelos cálculos dos diretores, essa mudança, aparentemente pequena, terá um impacto sensível nos ganhos financeiros dos trabalhadores.

A negociação também estabeleceu que não haverá desconto dos dias parados, mas compensação, ou seja, cada trabalhador que fez greve, a partir do mês de setembro, poderá trabalhar no máximo 1h por dia, até perfazer 14h40min, para compensar os dias de greve. Numa situação ideal, greve que é um direito constitucional, não deveria ser compensada. Contudo, entre o abono do dia e o desconto no contracheque do trabalhador, a compensação acaba servindo como um meio termo que menos prejudica o trabalhador.

Mais uma vez fica demonstrado que apenas a luta e organização dos trabalhadores é capaz de arrancar conquistas. A categoria e o sindicato deu mais uma demonstração de luta e determinação. Tem à sua frente uma direção firme, independente dos patrões e dos governos, impulsionada pelos militantes  do Coletivo Travessia, da Resistência-PSOL e independentes que orgulham todo o movimento Sindical por sua garra e tenacidade.

O importante apoio dos movimentos sociais e organizações políticas à Greve

A bravura dessa categoria conquistou a simpatia da população pernambucana, refletido no apoio massivo à greve, o que se verificou claramente nas redes sociais, e também com uma importante rede de apoio formada por sindicatos (CUT, Federação Rodoviária do Nordeste, Simpere, Sismo, Petroleiros de Aracaju, Andes-SN, Metroviários de São Paulo e Metroviário de Pernambuco, Movimento Luta de Classes/UP, Travessia Sindical), movimentos sociais (MST e MTST), movimento estudantil (Afronte e UJC) e organizações de esquerda (LSR) que, entendendo a dimensão e importância dessa luta, estiveram lado a lado com o Sindicato dos Rodoviários, nos piquetes, nas garagens e nos enfrentamentos com a patronal e com a PM de Raquel Lyra.

O nefasto papel do Governo de Raquel Lyra (PSDB)

A postura levada a cabo pelo Grande Recife Consórcio de Transporte, órgão responsável pelo gerenciamento do transporte público de passageiros e subordinado ao governo do estado, foi absurda. Desde o início da Campanha Salarial o Sindicato dos Rodoviários vinha exigindo a participação do Governo Raquel Lyra nas negociações, afinal só este ano este órgão destinará em torno de R$400 milhões em subsídios aos empresários.

No entanto, o governo adotou a política do avestruz e fez de conta que nada tinha a ver com o problema do transporte que ele mesmo administra, ignorando todas as solicitações feitas pelo sindicato.

Durante a greve, por diversas vezes, o Sindicato tentou, inclusive através da Deputada Dani Portela (PSOL), uma intermediação para que os rodoviários e rodoviárias fossem ouvidos, mas o Lyra nada disse.

Lyra, no entanto, não se furtou em enviar sua PM para as garagens para impedir a Greve e reprimir grevistas e apoiadores, uma vergonh e um verdadeiro constrangimento.

Em defesa dos empregos da Vera Cruz

A luta pela migração de Trabalhadores da Vera Cruz (empresa que recentemente entregou suas linhas) precisa seguir como prioridade nesse momento. O Governo do Estado deve garantir, junto às empresas que assumirão essas linhas, a contratação dos trabalhadores demitidos, com estabilidade de 01 ano para todos e todas.

Duas batalhas políticas para encerrar 2024: eleições para as CIPA´s e eleições do sindicato

Depois dos ganhos materiais, que só foram possíveis depois de dois dias de uma poderosa greve que impactou em cheio a capital pernambucana, é hora da categoria lutar por suas conquistas políticas.

Assim, a próxima batalha se dará nas empresas Mirim e Mobi Brasil, quando se realizarão as eleições para Comissão Interna de Prevenção de Acidente, as CIPAs. Está na ordem do dia eleger cipeiros comprometidos com a categoria, que fiscalizem de forma rigorosa as péssimas condições de trabalho impostas pelos patrões e atuem como ponto de apoio do sindicato em cada uma dessas empresas e nos TIs.

O segundo desafio político, que fechará este ano, marcado por enormes batalhas sindicais, será a reeleição do grupo O Guará para o próximo mandato do sindicato. Essa será a batalha mais importante porque, caso a categoria perca seu sindicato, corre o sério risco de retroceder nas conquistas econômicas alcançadas até aqui.

Esse risco é real, porque até as inúmeras estátuas espalhadas pela cidade de Recife sabem que os coronéis da Urbana-PE investem dinheiro pesado no grupo pelego de Roberto Carlos, com o objetivo de destruir o sindicato. Na greve de 2023, Fernando Bandeira, então presidente da Urbana-PE, chegou a falar para cada um dos diretores que queria “ferrar com o sindicato”. Esse grupo, um ajuntamento de pelegos truculentos e perigosos, estará disposto a fazer absolutamente tudo, para impedir a reeleição do grupo O Guará. Um dos apoiadores desse grupo até chegou a alertar que, nas eleições, poderá morrer gente.

O sindicato rodoviário de Recife, depois dessa greve, que coroa cinco anos de um mandato combativo, consolida-se com uma indispensável ferramenta de luta, não só da categoria, mas da cidade e do movimento sindical brasileiro. O próprio Fernando Bandeira admitiu isso publicamente, durante a audiência no MPT, quando queixou-se irritado das 29 paralisações realizadas pelo sindicato só no ano de 2024. Essa ferramenta precisa ser resguardada, a ferro e fogo, da investida dos patrões. Assim, será fundamental o apoio político, militante e financeiro por parte conjunto do movimento sindical de todo o país, ao grupo O Guará, no desafio que serão as eleições no fim deste ano.