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MOVIMENTO

A greve dos TAE 2024 como parte da luta de classes brasileira: a quem deve servir a universidade?

Wagner Pires - Coordenador do SINTUFCE e Servidor TAE da UFCA
Sintufce

Em 2024 a FASUBRA e seus sindicatos de base realizaram uma das maiores greves da história das universidades. Mesmo sufocados pelo governo de Extrema-Direita, os sindicatos seguiram atuando, primeiro liderando as maiores manifestações contra os cortes na Educação e depois, dando suporte às ações dos TAE durante a Pandemia. A derrota de Bolsonaro nas Urnas reavivou a atuação sindical, primeiro, com o Congresso da FASUBRA, que iniciou as discussões sobre um novo Plano de Cargas e Carreiras, momento que possibilitou tanto a aproximação de camaradas que estavam afastados do movimento, como o surgimento de novas forças que vieram somar nos debates e nas lutas. Pouco depois dos TAE das universidades entrarem em greve, os docentes os acompanharam, bem como os trabalhadores TAE e docentes dos Institutos Federais. A greve então se caracterizou por uma forte unidade entre essas categorias em luta, passando a receber o título de Greve da Educação Federal.

Conjugando tradição e inovação, os sindicatos começaram a utilizar as redes sociais, como o Instagram, o youtube e outras para agitação, mobilização e divulgação de informações por toda a base. Tornaram-se comuns, em boa parte dos sindicatos de base, as assembleias híbridas que possibilitaram a ampliação da participação de servidoras e servidoras, que antes não participavam dos fóruns de decisão da categoria. Para além disso, seguiram as manifestações e mobilizações nas ruas e nos locais de trabalho, tornando a greve de 2024, uma greve total. Isso deu às Técnicas e Técnicos uma visibilidade jamais vista.

E aqui, podemos dizer que a greve, que por excelência é parte da luta de classes, um campo de disputa por excelência. Influencers e mesmo os parlamentares da extrema-direita, buscaram utilizar as mobilizações de greve como forma de atacar o governo. Tentaram emplacar a narrativa de que Bolsonaro havia feito concessões e cuidado muito bem das universidades. Mas o próprio movimento soube sair das armadilhas e repudiou o uso da greve pelos oportunistas.

Anulados em seu intento, os diversos grupos de extrema direita passam a atacar a greve. Agora esta era a responsável pela paralisia das universidades e causava prejuízos aos estudantes, escondendo a condição de penúria em que ficaram as universidades quando o governo de extrema direita esteve no poder. Situação que realmente prejudicou aos estudantes, que só não ficaram sem aulas, graças a atuação dos trabalhadores que fizeram esforços gigantescos para manter o funcionamento das instituições.

o orçamento do governo federal, deve privilegiar os direitos da população, como a saúde e a educação e suas trabalhadoras e trabalhadores, ou ser direcionado para o grande capital, por meio dos juros da dívida pública?

Mas, não foi só a extrema-direita, nem a grande imprensa vendida aos interesses do capital que tentaram golpear a greve. O velho Marx já nos ensinou que o Estado é o escritório de negócios da burguesia e que os governos, ali, tratam dos interesses da burguesia. Ora, a greve no serviço púbico é sempre uma disputa pelo Fundo Público. Ou seja, o orçamento do governo federal, deve privilegiar os direitos da população, como a saúde e a educação e suas trabalhadoras e trabalhadores, ou ser direcionado para o grande capital, por meio dos juros da dívida pública?

A esta pergunta, a resposta do governo foi a de que o Arcabouço Fiscal, a política de responsabilidade fiscal que prioriza a austeridade, cortando direitos e deixando à míngua a população mais pobre, deveria ser respeitado e mantido acima de tudo. As categorias em luta travavam uma batalha contra a grande banca internacional de credores, os especuladores das bolsas de valores, contra a rapina dos oportunistas do centrão que dominam o congresso. E só podiam contar com as suas próprias forças e a solidariedade de classe de outras categorias do serviço público.

Os dias se passavam e o governo, esperando o desgaste, não apresentava nada de concreto para a categoria. Mas, isso só fazia aumentar a adesão à greve e a combatividade nas universidades. A cada assembleia as propostas rebaixadas do governo iam sendo repudiadas de forma firme. Aos poucos a categoria avançava. Mas queria mais.

Porque a luta não era apenas por salários. Era pela concepção de trabalho de uma categoria, que, dentro das universidades, desempenhava um papel bem mais relevante do que gostariam os inimigos da Educação Superior.

Porque a luta não era apenas por salários. Era pela concepção de trabalho de uma categoria, que, dentro das universidades, desempenhava um papel bem mais relevante do que gostariam os inimigos da Educação Superior. E que queria esse reconhecimento como contrapartida em sua luta. A nova carreira TAE deveria fazer com que as técnicas e técnicos pudessem ser reconhecidos em seus fazeres, saberes e na geração de novos conhecimentos. Em uma linha bem diferente do que realizam os docentes, mas ainda assim, contribuindo no planejamento, oferta e execução das atividades de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura de nossas universidades.

Para isso era preciso arrancar a recomposição do orçamento das Universidades e Institutos Federais e melhorar a remuneração das carreiras como forma de manter nela as trabalhadoras e trabalhadores com maiores contribuições para as instituições. Uma luta árdua que envolve mesmo a definição do status dessas universidades: serão geradoras de novos conhecimentos a serem partilhados com a sociedade, beneficiando a todos? Ou serão apenas repetidoras de conhecimentos gerados outrem, produzindo profissionais padronizados segundo a vontade do mercado, tal como se maquiladoras de gente em capital?

O que deseja o movimento é uma universidade que atente para o conflito de classes e siga ao lado da classe trabalhadora. Uma universidade democrática, com uma gestão paritária composta por técnicas e técnicos, docentes e estudantes.

A greve foi arrancando as conquistas: a recomposição parcial do orçamento das universidades, o anúncio de novos investimentos de expansão e consolidação por meio do PAC das Universidades, uma reestruturação da carreira que não é a ideal, mas que aponta para melhorias expressivas, para aquela que é a categoria que detém a pior remuneração e a maior taxa de rotatividade do serviço público, embora seja uma das categorias com maiores taxas de escolaridade. Enfim, dezenas de pontos que ainda precisam ser discutidos e superados ficaram para depois. Mas a vitória do movimento foi indiscutível.

Uma vitória que, não podemos deixar de afirmar, por pouco não foi por água abaixo pela atuação de um campo político sindical, que dentro da FASUBRA, atuou como se, parte do governo fosse, freando a categoria e expressando acordo com as posições de governo, mesmo sem consulta às bases. Esse é um aspecto interessante desse campo, desde os primeiros governos do PT: são o para-choque para críticas e ações mais contundentes contra o governo.

A base criticou fortemente essa postura. Porque o que se queria desde o início era que o governo pudesse atender as reivindicações das categorias que foram suas bases desde a campanha eleitoral e que atuam na Educação, que desde o primeiro momento foi chamada de prioridade pelo governo.

Encerrada a greve, com os TAE retornando aos locais de trabalho, surgem outras movimentações da luta de classe na educação: Haddad anuncia cortes significativos na Educação e na Saúde, para preservar o arcabouço fiscal e a Câmara dos Deputados, por meio de manobras de Arthur Lira, aprova o Novo Ensino Médio, sem as significativas alterações que deveriam tornar o projeto menos danoso aos jovens brasileiros do que o anterior que foi derrotado pela movimentação de estudantes, educadores e trabalhadores da educação. Isso só demonstra a necessidade dos TAE de continuar mobilizados. Muito do que foi acordado na greve ainda será objeto de estudos do MEC e do MGI e passará pelo Congresso. A luta segue. Afinal é uma disputa pelo futuro das Universidades brasileiras.