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Colunas

Nem toda CT, mas sempre uma CT!

Mais uma morte em Comunidade Terapêutica

Reprodução/YouTube

Saúde Pública resiste

Uma coluna coletiva, produzida por profissionais da saúde, pesquisadores e estudantes de várias partes do País, voltada ao acompanhamento e debate sobre os ataques contra o SUS e a saúde pública, bem como às lutas de resistência pelo direito à saúde. Inaugurada em 07 de abril de 2022, Dia Mundial de Luta pela Saúde:

Ana Beatriz Valença – Enfermeira pela UFPE, doutoranda em Saúde Pública pela USP e militante do Afronte!;

Jorge Henrique – Enfermeiro pela UFPI atuante no DF, especialista em saúde coletiva e mestre em Políticas Públicas pela Fiocruz, integrante da Coletiva SUS DF e presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal;

Karine Afonseca – Enfermeira no DF e mestre em Saúde Coletiva pela UnB, integrante da Coletiva SUS DF e da Associação Brasileira de Enfermagem, seção DF;

Lígia Maria – Enfermeira pela ESCS DF e mestre em Saúde Coletiva pela UnB. Também compõe a equipe do Programa de Interrupção Gestacional Prevista em Lei do DF;

Marcos Filipe – Estudante de Medicina, membro da coordenação da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (DENEM), militante do Afronte! e integrante da Coletiva SUS DF;

Rachel Euflauzino – Estudante de Terapia Ocupacional pela UFRJ e militante do Afronte!;

Paulo Ribeiro – Técnico em Saúde Pública – EPSJV/Fiocruz, mestre em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH/UERJ e doutorando em Serviço Social na UFRJ;

Pedro Costa – Psicólogo e professor de Psicologia na Universidade de Brasília;

Por Pedro Costa

Na última segunda-feira, dia 08 de julho, mais uma pessoa foi morta, assassinada em uma Comunidade Terapêutica (CT). Jarmo Celestino de Santana, de 55 anos, acabou falecendo depois de ser espancado, amarrado, torturado na Comunidade Terapêutica Efata, que fica em Cotia, São Paulo. Não bastando a própria barbárie dos atos, os funcionários da respectiva CT se vangloriam de sua covardia, riem da violência que cometeram e da condição de Jarmo, conforme é possível ver em vídeos que foram publicados na internet.

Para adicionar mais camadas de barbaridade, a CT era vinculada a uma igreja evangélica – como são a maioria das CTs –, sendo coordenada pelo pastor Cléber Fabiano da Silva, que, segundo relato do funcionário, um ex-interno, também auxiliou na violência à Jarmo.

Trata-se de mais um “caso isolado” de violência e de morte neste tipo de instituição manicomial, que tem se apresentado como instituição de cuidado, de tratamento para pessoas com necessidades assistenciais atreladas ao uso de drogas, mas que, na verdade, são instituições da violência, de desumanização, de mortificação – física e simbólica. A ironia aqui vem com muita indignação, afinal, é recorrente o discurso dos “casos isolados” toda vez que uma violência em CT é denunciada. Cabe ressaltar que essa é a mesma retórica das violências cotidianas das polícias em nosso país. E o que une ambas as instituições, para além da normalidade e normalização da violência? É que essa violência como normal se volta, majoritariamente, contra pessoas negras, pobres. Ou seja, é uma violência racista; são instituições racistas.

Para piorar, é necessário ressaltar, de novo, que essa violência normalizada, racista das CTs, tem sido cada vez mais chancelada pelo Estado brasileiro, nas esferas municipal, estadual e federal, na forma de crescentes fatias do fundo público, bem como por financiamentos públicos indiretos (a partir da concessão de inúmeros privilégios, como, por exemplo, a imunidade tributária). Resgatando e parafraseando Marielle Franco, que acertadamente captou – e denunciou – o caráter racista da chamada guerra às drogas, que de guerra nada tem, muito menos se volta às drogas: quantos mais terão que ser violentados e morrer nas CTs para que o Estado deixe de financiar essa mistura de manicômio, prisão, igreja e senzala? Quantos mais terão que morrer para que o Estado brasileiro dê fim às CTs?

Vivemos em tempos em que não só é preciso dizer o óbvio, mas reforçá-lo! A violência da CT com Jarmo, resultando em sua morte, não se trata de um caso isolado. Não é só a violência de uma CT, mas da CT como instituição manicomial. Portanto, não adianta bradar que nem toda CT… Ora, nem toda CT, mas sempre uma CT! Por isso mesmo, nenhuma delas pode continuar existindo.

Pelo fim de todos os manicômios! Pelo fim das CTs!

Justiça para Jarmo!