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CULTURA

A locomotiva da História e o vagão chamado Arte

Pablo Henrique, de Belo Horizonte (MG)
“Camaradas:
Os trabalhadores
e as tropas de Cantão
tomaram Xangai!”
Como se amassassem o aplauso
com a palma das mãos
crescia a ovação,
crescia em força.
Cinco,
dez,
quinze minutos,
o salão aplaudia.
[…]
Haverá por acaso
liga de maior força
que a solidariedade
da colméia operária?
Aplaude,
obreiro têxtil,
aos desconhecidos
e queridos
coolies da China!
Trechos do poema Meu melhor verso, de Maiakóvski

Século XXI, o século que sucede o século das grandes transformações em diversos aspectos da vida humana. Às vezes parece o século da desesperança. Se é verdade a premissa de Marx que as revoluções são a locomotiva da História, o século das revoluções puxou dezenas de vagões: educação, saúde, ciência, igualdade, paz, terra, trabalho. Contudo um desses carros reboque da locomotiva do século XX, veio para trazer além de pão, a poesia. Ele é o vagão da Arte.

Engana-se quem acha que as transformações da Arte no século passado se refletiram apenas nos traços e estilos literários. Ela moldou também o comportamento dos artistas, agora não era só a busca pelo belo, mas pôr o belo nas ruas. Maiakóvski declama ás multidões que os operários de Cantão tomaram Xangai. Ovacionado pelos ouvintes por quinze minutos afirma que não há força maior que a solidariedade. Diego Rivera, além de produzir grandes murais que cantam a vitória da revolução Mexicana, junto a André Breton e Leon Trotsky escreve o manifesto por uma arte revolucionária e independente, um chamado aos artistas do mundo a revolução. Frida, mesmo muito debilitada, participa de uma manifestação contra o golpe na Guatemala, dias antes de morrer. Miguel Alandia Pantoja, militante aguerrido, pintor excepcional, transforma seu ateliê no Quartel General Gráfico do POR (Partido Obreiro Revolucionário). Enquanto tentava transcrever para as telas as teses de Pulacayo, sai de seu ateliê com armas em punho e toma as ruas junto a milhares de trabalhadores na revolução Boliviana em 1952.

No Brasil, primeiro a LCI (Liga Comunista Internacional) tinha entre seus quadros Mário Pedrosa, Patrícia Galvão, Lívio Abramo, Lélia Abramo, Rachel de Queiroz e outros que tentavam se enraizar nas lutas operárias e campesinas. Depois, após algumas reorganizações e já com outro nome, POR-T (Partido Operário Revolucionário), conseguindo uma pequena inserção, mas não insignificante, em São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Rio Grande do Sul e Pernambuco. Foi no interior de Pernambuco, na cidade de Itambé, que tiveram uma grande perda: o jovem gráfico Paulo Roberto Pinto, que com 22 anos já dirigia as lutas campesinas, foi assassinado com disparos pelas costas por latifundiários.

Esses são apenas exemplos. As lutas contra as ditaduras na América Latina e no Caribe, a luta de independência nacional na África e Ásia, todas essas grandes agitações que o mundo passou durante o século XX nos presentearam com uma avalanche de artistas que não pediram, parafraseando Maiakóvski, mas fizeram uma nova Arte, que deu a sua contribuição para arrancar o mundo da escória.

Já estamos no século XXI. Às vezes nos dá impressão de que tudo isso é passado, a locomotiva já não anda. Há quase 50 anos da última revolução vitoriosa (o Vietnã) a distância de quase cinco décadas de uma ação coletiva nos joga cada vez mais a refletir sobre a busca por uma saída individual? Teria nosso vagão descarrilhado? Vitória da extrema direita pelo mundo, o avanço conservador, os genocídios dos povos negro, indígenas e palestino continuam, feminicidios ocupam as capas do jornais, os crimes contra a comunidade LGBTQIAP+ não cessam.O PL monstruoso que quer obrigar crianças a seram mães de estupros. Será que todas essas lutas de gerações foram inúteis? Não, na verdade nada foi inútil, os que vieram antes de nós só desenharam o caminho, mostraram que é possível uma arte que seja uma das múltiplas ferramentas usada pelos os oprimidos e explorados do mundo em busca por sua libertação. Mais do que nunca se faz necessário um chamado aos artistas para se ligarem às lutas de seu tempo, e o nosso tempo nos exige muitas lutas.

A locomotiva apenas está passando por um caminho mais lento e sinuoso, o Vagão da Arte te espera, sempre tem vaga, são infinitos seus assentos, e precisa de você, ligado as lutas, para conseguirmos colorir esse trem com as cores de toda diversidade de nossa classe. A passagem é gratuita, tarifa zero, e o destino é o unico local onde a Arte pode florescer, onde todos são livres, e só indivíduos libertos podem criar uma Arte Livre: O Futuro.

Marcado como:
arte / cultura