Greve da educação federal: os limites e as conquistas


Publicado em: 11 de junho de 2024

Movimento

Por Luciano Aires, de Campina Grande (PB)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Movimento

Por Luciano Aires, de Campina Grande (PB)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Compartilhe:

Ouça agora a Notícia:

Estamos há quase dois meses de greve do ANDES-SN. Já são 65 instituições em greve o que demonstra a força nacional do movimento paredista em unidade com o SINASEFE e a FASUBRA. Força essa que tem feito o governo federal se movimentar na conjuntura política a ponto do próprio presidente da república, acompanhado de ministros de estado, se reunir com reitores/as com a preocupação de encerrar nossa greve.

Penso que se faz importante atualizar o balanço do movimento, apontando os limites colocados para a luta sindical e as conquistas já sinalizadas ainda no curso da greve. A política econômica centrada no arcabouço fiscal, no déficit zero e na disputa de fundo público por parte dos capitais, tem feito o pêndulo do relógio da história se movimentar mais rapidamente para o lado da Faria Lima. A correlação de forças no congresso nacional, por sua vez, também nos é bastante desfavorável, pois o legislativo resolveu bater o martelo sobre a execução do orçamento federal e de quebra leva um bom montante em emendas parlamentares para reproduzir o clientelismo político em âmbito municipal. Somado a isso, a PEC do judiciário reserva quinquênios vultosos para juízes/as, depois de policiais também embolsarem uma boa grana em suas carreiras em 2024. Cada fração de classe do andar de cima e do alto escalão de carreiras de Estado já reservaram a sua parte nesse latifúndio que é o orçamento, restando migalhas para a educação pública federal.

Além disso, o governo Lula de fato escolheu o peleguifes para “negociar”. Feijó disse isso em alto e bom som na mesa do dia 27 de maio, que aceitava “dá um tiro no pé” e assinar com uma federação, mesmo que sem carta sindical e baixíssima representatividade. Na sala ao lado, em um gesto profundamente antidemocrático, o MGI e a PROIFES se entendiam muito bem, apesar da própria base desta federação não autorizar a direção fazer aquele ato burocrático. A 3ª vara federal de Sergipe reconheceu a ilegalidade daquele “acordo” e, por meio de medida cautelar, suspendeu o mesmo. Como não bastasse, o governo agora concede carta sindical ao peleguifes, no dia 6 de junho de 2024, justamente durante o curso da greve da educação federal e da derrota do seu braço sindical. O ANDES-SN se agiganta nessa greve e continua fiel aos princípios classistas e de decisões pela base. A memória histórica dessa greve certamente colocará na conta da PROIFES e do governo os desacertos antidemocráticos e os acordos costurados nos bastidores da burocracia. Que o tempo se encarregue de fazer a justa memória!

Contudo, penso que também devamos dar destaque às conquistas resultantes dessa greve ainda em curso. Politicamente, é importante ressaltar os aspectos organizativos, a realização de assembleias expressivas, o ingresso de novos camaradas nos comandos de greve, a experiência da luta de classes no chão de Brasília, as audiências públicas no congresso nacional, o número de instituições que aderiu à greve, etc. Nosso sindicato, certamente, pode se orgulhar desse saldo político importantíssimo e de quebra assistir a PROIFES voltar para a lata de lixo da História.

Também devemos comemorar os avanços conseguidos na nossa pauta resultado da greve. Para isso, é preciso frisar que na mesa de negociações realizada no dia 18 de dezembro de 2023, o governo apresentou para o conjunto dos/as servidores/as públicos a seguinte proposta: 0% (2024), 4,5% (2025) e 4,5% (2026), além do reajuste nos benefícios: vale alimentação (1.000,00), auxílio creche (215,00) e auxílio saúde (484,90). Apagaram-se as luzes de 2023 sob uma gritante insatisfação dos/as servidores/as públicos federais. Feliz ano novo? Nada disso. Na mesa realizada no dia 10 de abril de 2024, o governo manteve a proposta apresentada no ano velho e fechou a mesa nacional de negociação, criando mesas específicas para tratar das carreiras. E aí veio a greve. Com o movimento paredista já iniciado pelos/as camaradas da FASUBRA e SINASEFE, com o ANDES-SN iniciando sua greve em 15 de abril, realizou-se outra mesa, desta feita, em 19 de abril. Nesse dia, e por conta da força do movimento sindical, o governo se movimentou um pouco e apresentou a seguinte proposta: 0% (2024), 9% (janeiro de 2025), 3,5 (janeiro de 2026) e alteração nos steps da carreira de 4 para 4,5% (2025) e para 5% (2026). As assembleias de base do ANDES-SN rejeitaram, em ampla maioria, essa proposta que não recompõe sequer o índice inflacionário para 2024, exclui aposentados/as e pensionistas, desestrutura ainda mais a nossa carreira e sequer avança na pauta do “revogaço”. Contudo, não fosse a força da greve, não teríamos esse pequeno avanço por parte do governo. Não custa lembrar que a proposta de 2023 era de 4,5 (2025) e 4,5% (2026) e que arrancamos, na mesa, os 9% para janeiro de 2025.

A equiparação dos benefícios com os valores dos outros poderes também está na nossa pauta da greve. Apesar do governo não atender integralmente e ainda colocar como condição para aceitar o 0% em 2024, resta avaliar que se não fosse o movimento paredista sequer teríamos os valores já incorporados no contracheque de maio. Por fim, o orçamento da educação federal. Na reunião de Lula com reitores foi anunciado o “PAC da Educação” com anúncio de investimentos para as universidades e institutos federais já existentes, expansão de novos campi e construção/reforma de hospitais universitários. Ainda não temos uma avaliação dessas atividades de hoje, pois ao encerrar esse artigo ainda estava ocorrendo a reunião do Comando Nacional de Greve do ANDES-SN. Todavia, podemos concluir que essa iniciativa do governo dialoga diretamente com a greve, e isso fica visível no último trecho do discurso de Lula.

Enfim, a greve da educação federal aponta para outro projeto de sociedade e de universidade. Ela é pedagógica. Lança, ao conjunto da esquerda brasileira, do próprio governo e da sociedade englobante, lições políticas importantíssimas para enfrentar a conjuntura. A pandemia nos mostrou a relevância dos serviços públicos e dos/as servidores/as públicos, por isso mesmo é fundamental a luta contra o privatismo, o rentismo, a precarização do trabalho, o arcabouço fiscal e todas as mazelas do capitalismo neoliberal. Mas também é na luta de classes que podemos derrotar o neofascismo, pois apenas nas trincheiras dos combates para além da institucionalidade eleitoral, podemos derrotar a extrema direita no Brasil e no mundo. A greve é pedagogia política contra a conciliação de classes.

Luciano Aires é doutor em História, professor da UFC e membro do GCLG-ADUFCG/ANDES-SN

Top 5 da semana

Contribua com a Esquerda Online

Faça a sua contribuição