Fala-se muito em regime partidário e centralismo democrático. Isso é assim porque trata-se de um tema decisivo na construção das organizações socialistas revolucionárias neste e em qualquer tempo. Nós mesmos já analisamos esse complexo problema aqui. Para lembrar uma definição simples, o regime partidário é o método de funcionamento interno de uma organização: Como nos organizamos? Quais são os mecanismos de tomada de decisões e resolução de conflitos? Qual a relação entre centralismo (disciplina) e democracia dentro da organização? Etc. Na tradição leninista, definimos que o regime partidário é estruturado segundo os métodos e princípios do centralismo democrático. Este, por sua vez, funciona de acordo com a fórmula sintética: “ampla liberdade de discussão, total unidade na ação”. Essa fórmula é bastante aberta e por isso não é uma garantia contra todos os problemas, como também o demonstramos no artigo citado, mas aponta um certo horizonte, uma certa tendência. Sobre essa base, cria-se um estatuto, uma tradição interna, uma cultura política e organizativa que caracteriza um determinado partido. Cada organização terá uma interpretação distinta do centralismo democrático, e portanto criará um estatuto distinto, uma cultura distinta etc. É por isso que não existem duas organizações absolutamente idênticas.
Mas o que é então a concepção de partido? A concepção de partido é um nível mais elevado de abstratação, uma outra dimensão da organização partidária. Ela inclui o regime interno, mas não se limita a ele. A concepção de partido é a visão geral sobre a organização: Qual sua estratégia? Sua relação com a teoria marxista? Sua visão sobre o internacionalismo? Sua relação com a classe trabalhadora e os sindicatos? Como aborda as questões morais e metodológicas? Sua postura diante dos movimentos e lutas contra as opressões? A luta parlamentar e a ação direta? E um longo etc. É conscientemente um termo bastante amplo. Nele cabe quase tudo que diz respeito à organização. Exatamente por isso é um assunto tão importante.
Visão geral
Partimos do princípio de que reivindicar a concepção leninista ou bolchevique de partido não é obedecer a um dogma, mas apreender uma essência. A essência contida em Que Fazer? e em Um passo em frente, dois passos atrás é a ideia de um partido político nacional centralizado democraticamente e formado por militantes orgânicos. Não há nessas obras qualquer imperativo organizativo dizendo que o partido deve funcionar desta ou daquela forma específica. Os bolcheviques até produziram alguns textos mais rígidos nos tempos da III Internacional. Por exemplo, existe a famosa resolução intitulada “A Estrutura, os Métodos e a Ação dos Partidos Comunistas”, de 1921. Mas o próprio Lenin fez uma autocrítica desse texto já em 1922, referindo-se a ele como excessivamente fechado e “saturado de espírito russo” (Intervenção de Lenin no IV Congresso da Internacional Comunista, 1922). A ideia de que o bolchevismo é uma fórmula organizativa específica aplicada universalmente é contrária ao marxismo e a toda a experiência do movimento operário internacional.
Há também um debate muito importante entre os socialistas sobre o sentido do partido, sobre o porquê de sua existência. Segundo Kautsky (o revolucionário, não o renegado), o marxismo é a união do programa socialista (fruto da experiência histórica da classe trabalhadora e da análise científica dessa experiência) com o movimento proletário realmente existente. Nisso, o socialismo científico de Marx e Engels se diferencia de todas as formas anteriores de socialismo (socialismo utópico), que elaboravam um futuro brilhante sem levar em consideração a realidade e sem fazer uma análise científica dessa realidade. Mas o marxismo se diferencia também das outras correntes do movimento do proletariado, que tomam o movimento proletário na sua forma mais bruta, espontânea, imediata (e portanto abstrata) e não submetem esse movimento a nenhuma crítica teórica, não possuem um programa científico.
Assim, o partido não é necessário para que exista movimento proletário, e nem mesmo para que esse movimento proletário obtenha conquistas econômicas ou até mesmo conquistas sociais e políticas parciais e transitórias. O partido é necessário para dotar o movimento proletário de um programa revolucionário e marxista (científico). O programa da ditadura do proletariado (entendida como o governo da ampla maioria trabalhadora sobre a ínfima minoria exploradora) não pode vir do movimento espontâneo porque o socialismo não é o destino inexorável da luta de classes. O movimento dos trabalhadores não “tende” ao socialismo. Sua forma espontânea e “natural” é o sindicalismo, ainda que seja um sindicalismo combativo. O socialismo é uma proposta, baseada na análise científica da realidade. Por isso, o programa não nasce “das lutas”, mas da elaboração marxista. Obviamente, os marxistas elaboram esse programa a partir da realidade concreta, em permanente diálogo com o movimento real dos trabalhadores, observando sua dinâmica, seus métodos, suas demandas, suas vitórias e derrotas.
O leninismo como concepção de partido
Em Que fazer? Lênin defende a ideia de um partido político nacional em oposição aos círculos dispersos economicistas (sindicalistas, se quisermos). Depois, em Um passo em frente, dois passos atrás aborda o caráter orgânico da militância.
O debate entre Lênin e Rosa Luxemburgo no início do século 20, logo depois da publicação de Que fazer?, foi muitas vezes mal-interpretado pela esquerda revolucionária: Lênin nunca pretendeu que a fórmula bolchevique fosse universal. E admitiu isso explicitamente no debate. Para ele, suas propostas organizativas eram especificamente russas. Em 1907 (Ver artigo “Em doze anos”), o líder da Revolução Russa revisita a discussão e mantém apenas a luta contra o sindicalismo como eixo da elaboração de Que fazer?.
O partido bolchevique foi fruto da genialidade organizativa de Lênin, mas também foi o resultado prático de uma experiência política de quase 15 anos de luta fracional interna ao Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR – 1903-1917). E mesmo a própria fração bolchevique nem sempre foi igual a si mesma. Houve distintos momentos em sua história: antes e depois de 1905, durante os anos de refluxo, durante a luta pelo poder, após a tomada do poder, durante a guerra civil (ver o conceito de “militarização do partido” em Bukharin) etc etc etc. Nenhum desses “vários” partidos bolcheviques é igual ao outro.
Por exemplo, o historiador francês Pierre Broué fala em “fusão entre o partido e o movimento de massas” durante o segundo semestre de 1917. O trotskista argentino Nahuel Moreno fala a mesma coisa em O Partido e a Revolução quando diz que, durante a crise revolucionária, desaparecem as diferenças entre o partido e o movimento de massas, pois ambos “realizam uma única e mesma tarefa: a tomada do poder”.
O movimento trotskista depois de Trótski
A marginalidade do trotskismo do pós-guerra e, por outro lado, o peso do stalinismo provocaram distorções importantes nos regimes partidários de várias correntes trotskistas. O mito do partido bolchevique monolítico, o culto à personalidade e o mito da infalibilidade da direção penetraram com força o trotskismo. Isso se deu por pressão do stalinismo, ainda que o stalinismo fosse um elemento externo. A democracia interna bolchevique foi derrotada historicamente pelo stalinismo. O stalinismo permaneceu como único modelo “vivo” de partido, já que o verdadeiro modelo bolchevique tinha ficado apenas nos documentos históricos e na memória dos dirigentes mais velhos.
Assim, dentro da IV Internacional se desenvolveu uma concepção de “partido-fração”, com um regime avesso à luta política (Ver James Cannon sobre “os tipos de direção partidária”). Esse regime de “partido-fração” foi um dos fatores que fizeram com que as pequenas organizações trotskistas enfrentassem uma dinâmica terrível de sucessivas rupturas (e muito poucas unificações), muitas vezes por questões táticas ou regimentais.
Por tudo isso, uma organização revolucionária no século 21 não pode ser a tentativa de uma reprodução caricatural do partido bolchevique. Segundo o próprio Lênin, o partido bolchevique é único em sua história (Ver Esquerdismo, doença infantil do comunismo). Não se trata de copiá-lo mecanicamente, mas de captar a sua essência e adaptá-la à realidade do século 21.
Qual a nossa concepção de partido?
Quais seriam, portanto, as características fundamentais de uma organização revolucionária no século 21? Arrisquemos uma primeira sistematização:
a) Deve ser uma organização democraticamente centralizada, com mecanismos de discussão e tomada de decisão. Não pode ter uma estrutura militar de comando rígido e autoritário, mas também não pode ser uma rede horizontal amorfa, nem funcionar por consenso. Isso não significa ser insensível às diferenças que surjam dentro do partido, mas que o sentido do partido é a sua atividade prática, e não o debate em si. Discutimos para agir e não para outra coisa. Uma organização não pode proibir o debate porque precisa agir, mas também não pode ficar paralisada porque existem diferenças em seu interior. Deve discutir essas diferenças democraticamente e adotar resoluções práticas. Quem define quando terminam as discussões e começa a tomada de decisões? Ora, os próprio organismos. Cabe à direção ter a sensibilidade e a inteligência para conduzir o debate de maneira sábia, equilibrada, democrática, inclusiva, mas também firme e principista. Nenhuma fórmula antecipada é possível porque ainda não há substituto para a inteligência humana (James Cannon). Ainda assim, os mecanismos fundamentais devem ser estabelecidos pelo estatuto da organização: estrutura organizacional, mecanismos de consulta, periodicidade de congressos e conferências, permissões e proibições elementares etc.
b) Deve possuir um centro político nacional, não pode ser uma federação de grupos semi-autônomos, unidos apenas por proposições socialistas e revolucionárias gerais. Este é o perigo oposto ao do ultracentralismo: o da dispersão. Quando uma organização revolucionária é heterogêna e radicalmente democrática (e deve sê-lo!), corre por outro lado o risco de sucumbir à pressão regional, de grupos internos, aparatos sindicais e parlamentares e se transformar em uma federação frágil e incapaz de uma ação centralizada. Sua direção nacional paira no ar, se encontra incapacitada para tomar decisões porque o centro se deslocou de fato do âmbito nacional para os grupos internos, gabinetes parlamentares, diretorias sindicais, aparatos diversos controlados pela organização etc. A organização acaba funcionando por acordos internos entre pequenos bonapartes, o que é o oposto do centralismo democrático. Assim, toda organização revolucionária deve priorizar a construção de um centro político nacional, onde os dirigentes de maior prestígio serão integrados plenamente e serão parte de um coletivo que realmente faz debates decisivos e toma resoluções que nem sempre agradam a todos, mas que são necessárias.
c) Deve cultivar em seu interior uma moral revolucionária. A construção de um novo ser humano, livre dos limites e distorções impostos pelo capitalismo, é uma hipótese teórica levantada ainda por Marx e Engels e desenvolvida por teóricos da personalidade humana como Liev Vigótski e outros. Mas não é um fato. Como mínimo, não é ainda um fato. Assim, toda organização humana, incluindo as revolucionárias, viverá conflitos internos que vão muito além da política e da organização e que dizem respeito à própria moral revolucionária, entendida como o conjunto de valores que preservam a unidade e a fraternidade do coletivo. Casos de machismo, lgbtqifobia, racismo, grosserias, violações gerais da individualidade militante – tudo isso existe no seio das nossas organizações. Não se trata, portanto, de negar a existência de tais problemas, mas de encará-los de frente. Toda organização revolucionária deve cultivar em seu interior uma moral que preserve, desenvolva e faça aflorar o que existe de melhor em cada indivíduo. Sempre que essa moral for violada ou houver suspeitas de que foi violada, o caso deve ser abordado com seriedade, de preferência por uma comissão especial separada da direção (separada, portanto, dos debates e polêmicas políticas). Pode ser uma comissão permanente, uma comissão com mandato determinado, ad hoc ou outra forma qualquer. Não há receita. O fundamental é que o militante ofendido, oprimido ou destratado tenha a quem apelar. O stalinismo transformou as questões morais em instrumentos da luta política. O leninismo do século 21 admite a imperfeição humana e portanto a existência de problemas morais nas organizações revolucionárias, mas separa esse problema da luta interna cotidiana.
d) Deve incentivar e possibilitar a formação marxista. Como dissemos mais acima, o socialismo é uma proposta teórica, não o resultado inevitável do desenvolvimento social e histórico. Como teoria, o socialismo deve ser estudado. Uma organização revolucionária que não promove a formação marxista de seus militantes terá uma vida interna pobre, com debates concentrados na direção e entre os quadros mais antigos, sem uma participação ativa dos militantes de base. É preciso formação teórica para pensar o socialismo, mas também para interpretar criticamente as resoluções tomadas pela direção e organismos partidários. Quem não tem formação marxista dificilmente pode se opor ou questionar as decisões vigentes. O militante sem formação marxista fica na prática impossibilitado de contribuir para a correção de rumos e o avanço da organização. Fomentar a formação não é alimentar um dogma, mas promover o estudo crítico, vivo da teoria marxista em todos os seus aspectos. Os cursos, publicações, seminários, debates em organismos de base – tudo isso ajuda a criar uma cultura crítica, em que todos os militantes carregam a responsabilidade de pensar e contribuir teoricamente para o avanço do movimento.
e) Deve almejar construir vínculos internacionais, rumo a uma organização marxista revolucionária internacional, mas sempre levando em consideração a real situação do movimento revolucionário mundial (dispersão, fragilidade e marginalidade de todos os “centros” atualmente existentes). Não basta juntar dois ou três frágeis grupos (ou mesmo vinte) e proclamar “uma nova Internacional”. Isso não passa de uma ilusão messiânica. A ideia de um partido mundial rigidamente centralizado onde os partidos nacionais são meras “seções nacionais” com pouca autonomia não perece ter passado a prova da história. É preciso mais flexibilidade. Como mínimo, o atual estágio de desenvolvimento do movimento revolucionário mundial exige uma boa dose de humildade na hora de construir os tais “centros”. Por outro lado, o nacionalismo exerce pressões deletérias sobre as organizações nacionais, o que implica a necessidade de algum grau de coordenação internacional de esforços, tanto para a análise política, quanto para a ação prática. Estabelecer laços, trocar experiências e quadros, debater diferenças – tudo isso é parte da necessária reconstrução do internacionalismo proletário, processo esse de longo prazo que exigirá muita firmeza, mas também paciência por parte dos revolucionários.
f) Deve ser um partido orgânico. Não há democracia interna sem organismos vivos (de direção, intermediários e de base) onde as diferenças possam ser debatidas. Também não há ação prática sem organização. Partidos que não exigem organicidade de seus militantes, que funcionam em base ao “comando” vindo de cima podem até parecer mais leves e dinâmicos, mas se tornam ao fim incapazes de agir nos grandes processos da luta de classes. O partido bolchevique, ao contrário, é um partido relativamente lento porque tudo nele precisa ser orgânico, estar embasado em discussões e ações coletivas.
g) Ao mesmo tempo, deve ser um partido para ação. Não pode ter uma vida interna hipertrofiada em relação ao movimento real da classe trabalhadora e suas reais tarefas. O excesso de internismo é causa e consequência da marginalidade e do espírito de seita. Discute-se para atuar. A vida interna do partido, suas relações sociais e de amizade não podem substituir os vínculos com a classe real. O partido é um instrumento para a ação política, não um meio social.
h) O partido não pode ignorar a realidade do mundo do trabalho. Em Lênin, isso significava profissionalização (assalariamento) dos militantes, clandestinidade etc. No século 21, isso significa essencialmente formas flexíveis de organização que permitam incorporar os setores mais explorados do proletariado, os que mais trabalham, os que têm menos tempo. A militância não pode ser sinônimo de reuniões intermináveis com pontos intermináveis e falas intermináveis. Ela deve significar relações com a classe, atuação sobre a classe.
i) Deve ter uma camada de quadros profissionais, que se dedicam integralmente à atividade partidária e têm seus salários pagos pelo partido. Isso não significa que esses militantes são os únicos militantes ativos. Ao contrário. O objetivo dessa camada de companheiros é justamente garantir que o conjunto da militância se envolva e possa participar de todas as tarefas e atividades partidárias. Os militantes profissionais são uma necessidade do partido. Ser profissional da organização muitas vezes significa abrir mão de uma ascensão profissional (promoção, consurso, cargo) em benefício da causa comum. Por isso, profissionais devem ser valorizados. Ao mesmo tempo, a própria profissionalização não pode ser sinônimo de ascensão social. Os salários dos profissonais devem ser dignos, deve haver critérios para escolha dos companheiros e companheiras que assumirão a tarefa profissional e rodízios periódicos porque os longos períodos de afastamento da classe também acarretam distorções.
j) Deve ser um partido de luta e disputa política. Não pode ser um “comentador da luta de classes”. Inclusive, deve fazer luta política e ideológica contra outras correntes. Mas essa luta deve ser leal e construtiva. O partido não pode ter uma postura parasitária ou comensalista em relação a outras correntes. Não se pode tratar da mesma forma os inimigos de classe e os adversários internos ao movimentos de massas. Quadros e militantes saem e ingressam em distintas organizações e há disputa nesse terreno. Mas o centro da luta está fora do movimento revolucionário. Disputa-se a consciência da classe, não os militantes das outras correntes.
h) Deve se construir em base ao programa, à compreensão das tarefas de fundo, não em base às demandas políticas conjunturais. Construir uma organização a partir das tarefas imediatas e captar militantes baseado unicamente nessas tarefas é a receita certa para a ruptura e a desmoralização. Amanhã mudam as condições, muda a política e a toda a organização desmorona. Um partido saudável está quase sempre dividido em relação às táticas da conjuntura. A saúde de uma organização não está em evitar as diferenças e agrupamentos temporários, mas em fazer com que esses agrupamentos sejam exatamente isso – temporários, transformando-se em novos e diferentes agrupamentos na medida em que mudam as tarefas e a conjuntura. O que une os militantes e evita a ruptura é a solidez programática, não o acordo sobre esta ou aquela questão particular momentânea. Para isso, deve haver uma permanente discussão estratégica, teórica e programática no interior da organização e todo o militante que ingressa no partido deve participar também desses debates.
i) Deve se construir sobre os setores mais dinâmicos e importantes do proletariado, entendido como a classe dos trabalhadores assalariados ou que geram capital (trabalhadores de aplicativos, “autônomos” que não são autônomos etc.). Ao mesmo tempo, não pode se abster da disputa de outros setores sociais, de representantes das classes médias, intelectualidade, pequenos proprietários, estudantado etc. A causa do socialismo só terá futuro se atrair os melhores elementos de todas as classes e setores sociais.
j) O partido não confunde a luta política por seu programa e suas palavras de ordem com as tarefas comuns de toda a classe. Por isso, luta por táticas unitárias nos sindicatos e em todas as tarefas mínimas ou democráticas que possam fortalecer o proletariado ou defendê-lo de ataques por parte da classe dominante e do imperialismo. Não confundimos a classe e suas bandeiras com as direções burocráticas e traidoras que possam estar à frente dessas lutas. O partido se constrói também no combate contra essas direções. Mas precisa ser um combate inteligente. Por isso, não pode ignorá-las. Tampouco é suficiente o denuncismo permanente de tudo e de todos. A ideia de que a separação orgânica (“não se misturar”) por si só é a melhor forma de combater essas direções não corresponde à tradição do marxismo.
k) O partido atua nas lutas econômicas mínimas e batalha por influenciar os sindicatos com sua política revolucionária. Mas não reduz sua atuação à disputa dos aparatos sindicais. A disputa concreta deste ou daquele aparato sindical depende da possibilidade e da utilidade política.
l) O partido considera que as eleições burguesas jamais poderão levar ao socialismo, mas podem servir como escola de luta política para a classe trabalhadora. Por isso, a disputa desses processos é obrigatória para os revolucionários enquanto houver ilusões na democracia burguesa ou não estiver colocada a possibilidade de substituir o regime burguês pelo regime proletário. Da mesma forma, a atuação nos parlamentos burgueses (sempre que essa possibilidade se apresentar) é uma obrigação para os revolucionários, que devem fazer da tribuna parlamentar um espaço de denúncia do capitalismo e de disputa da consciência das massas.
m) Todo partido revolucionário aspira à completa independência política em relação a quaisquer aparatos reformistas ou centristas. Mas isso não implica em que não se possa utilizar, em relação a esses aparatos, táticas políticas e de construção que impliquem, por certo período, em acordos organizativos ou a coexistência em frentes políticas, eleitorais, partidos amplos, movimentos etc. Em cada caso, o partido avaliará a utilidade ou não de tais acordos e táticas.
Consideremos esse tópicos como uma primeira hipótese de definição geral de uma organização revolucionária no século 21, ou seja, uma primeira hipótese de concepção de partido. Certamente, muitas outras características ficaram de fora. Talvez elas sejam objeto de um próximo artigo de nossa autoria, mas o melhor é que surjam do próprio debate a partir de outros interlocutores. Esse é o nosso desejo sincero.
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