No momento em que este texto está sendo escrito o número de mortos pela passagem do ciclone no Rio Grande do Sul já passa de 40. Infelizmente a tendência é que este número aumente conforme as buscas avancem. Além das vidas perdidas, são mais de 60 mil atingidos diretamente pelas chuvas. Muitas famílias perderam tudo: móveis, casa, produção agrícola, negócios. Algumas cidades foram completamente varridas, com um cenário descrito por muitos como “cenário de guerra”.
As cenas apresentadas na cobertura jornalística confirmam a escala da calamidade. Cidades como Muçum, uma das mais afetadas pelo ciclone, encontram-se em uma situação de completa destruição. O centro do pequeno município foi completamente destruído e a cidade está devastada. A situação é semelhante em diversos municípios da região, sendo que muitos declaram que um colapso econômico devido a devastação causada pelas chuvas é iminente. Somado a isto, as chuvas derrubaram pontes e bloquearam rodovias e estradas, dificultando a chegada de ajuda e afetando completamente o funcionamento da região.
Infelizmente, a situação está longe de chegar a uma resolução. As cidades afetadas lidam com a procura de desaparecidos, alocação das famílias que perderam tudo e tentativas de lidar com os estragos físicos causados, mas a previsão é de que o volume de chuva siga alto nos próximos dias.
A emergência climática é aqui e agora
A triste realidade que o Rio Grande do Sul está enfrentando não é uma exceção ou uma tragédia fora da curva. Trata-se de uma realidade grave que seguirá evoluindo para cenários mais complexos e devastadores. É impossível pensar a situação atual no estado sem entender pelo prisma da crise climática. Os ciclones — em especial o mais recente — que vem assolando o território gaúcho se dão por uma combinação de elementos diretamente ligados às mudanças climáticas, além da passagem do El Niño.
Eventos como o que ocorre no sul do Brasil reforçam a urgência do debate sobre a emergência climática. Os eventos climáticos extremos já são uma realidade presente em todo o mundo e nosso país não está isento dos seus efeitos. A ocorrência destes eventos vem crescendo vertiginosamente nos últimos anos e, por consequência, multiplicam-se as tragédias decorrentes. Tratar o ciclone como uma tragédia natural ou algo que “simplesmente ocorre” é tentar fugir da realidade: não se trata de um ciclo normal da natureza, mas é o resultado do impacto humano no meio ambiente. Mais concretamente, é o resultado de um sistema econômico que age de maneira predatória e destrutiva em relação à natureza. Enquanto a norma for priorizar os desejos do sistema capitalista, a regra será morte e destruição, em especial para a população negra, periférica e em regiões mais precárias no geral.
Eduardo Leite tem culpa!
Nesta quarta-feira (06/09) Eduardo Leite e o jornalista André Trigueiro discutiram durante uma entrevista concedida à Globo News. O governador comentou que foi pego de surpresa pelo alto volume de chuvas ocorridas nos últimos dias, reação que foi contestada pelo jornalista. Trigueiro foi certeiro na sua constatação: não faz sentido expressar surpresa a cada evento extremo que ocorre no estado. O Rio Grande do Sul é porta de entrada para diversos eventos extremos que ocorrem no país. Apenas neste ano os gaúchos já sofreram com 4 ciclones, todos ocorridos em poucos meses. Mais do que isto, é de conhecimento que o sul do Brasil é a região com a maior incidência de ciclones e eventos similares. O consenso científico, algo que deveria ser de conhecimento de qualquer pessoa no poder executivo, é de que a incidência desses eventos aumentará com rapidez com o passar do tempo. Como pode um governador se dizer surpreendido pelos eventos recentes?
Eduardo Leite afirmou que os modelos matemáticos não previam o volume de chuva observado. Contudo, isso não é verdade. No final de agosto a MetSul já alertava sobre o risco de chuvas volumosas, tempestades e enchentes. Despreparo por parte do governo estadual já seria algo grave, mas diante do conhecimento que já temos sobre os impactos da crise climática no Rio Grande do Sul e as informações sobre a possibilidade de eventos do tipo em setembro, além do fato do estado já ter sido atingido por uma sequência de ciclones em 2023, demonstram que não se trata de despreparo: a palavra correta é negligência. Como afirmou o Deputado Estadual Matheus Gomes em seu twitter: “Em 2023, Leite diminuiu os recursos para o aparelhamento das Defesas Civis e os investimentos em prevenção de enchentes. Ele não prepara o RS para lidar com a emergência climática: aqui avança a monocultura, os agrotóxicos, a megamineração”.
A realidade é que o governo não possui qualquer plano de ação estruturado para esse tipo de situação. Enquanto o Rio Grande do Sul é assolado por eventos climáticos extremos, como as tempestades e estiagens, observamos um governador que atua de maneira improvisada e muito aquém da necessidade de atuação rápida e eficiente. Um governo sem um plano concreto de contenção de danos nesse tipo de casos só pode resultar em mortes e destruição. Além disto, deveria ser prioridade para o governo aperfeiçoar seu sistema meteorológico para ter uma melhor detecção de quando condições como a atual estiverem próximas. Entretanto, vemos que a retórica preocupada de Eduardo Leite sobre os impactos das mudanças climáticas não passa de discurso vazio para aparentar ser um político moderno e a par dos desafios para o poder público no nosso tempo. A prática é o critério da verdade e Eduardo Leite não passa no teste. Infelizmente, quem seguirá sofrendo é o povo gaúcho.
É hora de organizar e mobilizar: Audiência Pública em Porto Alegre (18/09)
Está evidente o imobilismo do governo estadual e sua inabilidade em tratar a situação com a gravidade que merece. A saída, entretanto, passa pela nossa ação organizada. Enfrentar a emergência climática significa entrar em rota de colisão com o poder econômico e com aqueles no poder público que atuam para blindar os que lucram com a forma que o sistema opera. Apenas a mobilização social pode causar a pressão necessária para que medidas reais sejam tomadas.
No dia 18/09 ocorrerá a primeira audiência pública sobre a crise climática na história do Rio Grande do Sul. A audiência é uma iniciativa do mandato do Deputado Matheus Gomes e de movimentos como o Eco Pelo Clima, responsável por organizar a Greve Global pelo Clima no estado. Será um momento crucial para pensarmos como o Rio Grande do Sul pode se preparar para a realidade presente, priorizando a proteção das vidas e da natureza em um contexto no qual veremos situações como a atual acontecerem cada vez mais. A audiência ocorrerá no Auditório Dante Barone, praça Mal. Deodoro – Centro Histórico de Porto Alegre. Das 14h às 16h.
1 Militante do Afronte e Resistência/PSOL de Porto Alegre
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