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MOVIMENTO

Para entender as três principais polêmicas do Congresso do PSOL

No 8º congresso, os e as filiadas podem decidir sobre o futuro do partido. Um diálogo com o artigo “Algumas palavras sobre as polêmicas do PSOL” publicado na Revista Movimento.

Deborah Cavalcante, de São Paulo (SP)

Há muito em jogo e um grau razoável de confusão durante os debates nas plenárias do Congresso do PSOL. As milhares de pessoas que dedicam seu tempo participando de reuniões longas, debatendo e votando em diferentes teses merecem de nós nitidez sobre as polêmicas políticas. Este texto está a serviço desse objetivo.

Em primeiro lugar, a polêmica e confusão está presente na discussão sobre o balanço do PSOL – que hoje tem 13 deputades federais, 300 mil filiados e vai disputar com força a candidatura de Guilherme Boulos à prefeitura de São Paulo. O partido deu um salto positivo na sua inserção nos movimentos sociais e populares, com a presença forte do MTST e a atuação de destaque na Frente Povo Sem Medo. Nas plenárias, dois temas têm sido apresentados como acordos: a importância de apoiar Lula no primeiro turno para derrotar Bolsonaro e de fazer campanha para Guilherme Boulos em São Paulo. Decisões que se deram no marco da luta contra o golpe, da campanha Lula Livre e da rejeição às posições lava-jatistas de exaltação a Moro e Dallagnol. Mas é preciso expressar os acordos nas resoluções que serão votadas no Congresso Nacional, até para ser consequente com o discurso na base.

Ora, esses dois temas foram votados no PSOL contra uma expressiva minoria de 42%, mesmo sendo tão óbvio agora que são questões corretas. No percurso do debate interno do partido em 2022, houve forte polêmica por parte do Movimento Esquerda Socialista e do “campo de oposição” contra o bloco que votou e garantiu ambas as posições, o PSOL de Todas as Lutas. A tese minoritária foi a de que o PSOL deveria lançar um candidato a presidente para demarcar posição, já que o governo Bolsonaro havia derretido e a vitória do Lula era certa. Também que a tática de apoio a Lula no 1º turno seria uma diluição do projeto do PSOL, o que o levaria a eleger menos parlamentares. A mesma lógica valeu na discussão da tática eleitoral de SP, onde Tarcísio Freitas da chacina do Guarujá foi eleito, já que a oposição também estava contra apoiar Haddad no 1º turno.

Um partido democrático é assim, mas é justo que os filiados do PSOL na base conheçam ou relembrem os debates que acontecem no Diretório Nacional. Diferente do que diz o artigo sobre o tema na Revista Movimento, o balanço dos acertos e erros importa. O critério deve ser sempre o papel que determinada linha política cumpriu na realidade, influenciando na luta de classes. Afinal, o destino do PSOL está totalmente relacionado ao destino da classe trabalhadora. E sim, o resultado de uma eleição pode fazer grande diferença: estaríamos mais perto ou mais longe de uma derrota histórica com o Bolsonaro eleito novamente? A suposta ideia de que a tese 3, do PSOL de Todas as Lutas em São Paulo, ao levantar este balanço nas plenárias estaria “na vala comum da partidocracia que só pensa em eleições” além de errada no conteúdo, também é uma contradição com a ideia seguinte, de valorização do papel da campanha presidencial da Luciana Genro. Quando se trata da Luciana Genro tudo muda e não é eleitoralismo?

A segunda polêmica e confusão está no debate sobre como enfrentar a extrema direita, com quais táticas. A necessidade de colocar o combate à extrema direita como a primeira tarefa do PSOL se tornou uma visão comum durante as plenárias em 2023. No entanto, o MES e o “campo de oposição” continuam a rejeitar a tática de Frente Única da esquerda no movimento social. Portanto, romperam com a principal unidade que se formou durante o governo Bolsonaro, o operativo de frentes que reunia a Frente Povo Sem Medo e a Brasil Popular, os principais partidos e movimentos sociais da esquerda brasileira e tentaram emplacar uma articulação paralela (Povo na Rua) que não demonstrou qualquer capacidade de mobilização. Desprezam e não participam diretamente das convocatórias das mobilizações unitárias desta Frente com a Brasil Popular e o Fórum das Centrais Sindicais. Explicam que a única tática possível é a da unidade de ação (junto com todos os setores de classe do campo democrático) e que a Frente Única leva a uma “diluição do PSOL no PT” e seria fruto de “ideias do populismo de esquerda”, quando na verdade faz parte da tradição da III Internacional. É incontestável o papel que essas frentes cumpriram na luta de rua nos últimos anos. Assim como a autoridade e relevância que o PSOL passou a ter na luta de massas. Por acaso, seria mais fácil ou mais difícil encarar um “novo junho de 2013” após a fundação da Frente Povo Sem Medo? Nossa hipótese é que seria mais fácil.

A terceira polêmica e confusão diz respeito ao debate da linha política sobre o governo do PT. O campo PSOL Semente já escreveu uma contribuição que propõe critérios para evitar uma linha sectária ou adesista: nossa independência política e de classe está a serviço de apoiar medidas positivas do novo governo, sempre articular a luta por reformas estruturais, criticar medidas negativas que expressem retrocessos fiscais ou sobre direitos constituídos. O PSOL não é oposição de esquerda ao novo governo Lula, nem é meramente uma “ala à esquerda” que aposta na disputa por dentro do governo. Todos os deputados votaram juntos contra o arcabouço fiscal e a única diferença se deu pela abstenção dos 3 deputados do campo de oposição em relação à Reforma Tributária – posição já vastamente criticada pela vanguarda. Queremos fazer frentes de partidos de esquerda para enfrentar a extrema direita e a direita neoliberal em cidades importantes, como São Paulo (com Guilherme Boulos na cabeça) e Porto Alegre, em negociações hoje entre PSOL (pela direção do MES) e o PT. Está difícil entender, dessa vez, onde está a ameaça de liquidacionismo do projeto fundacional de nosso partido.

Por fim, a ideia de que está posto no Congresso do PSOL um debate central sobre estratégia do partido ou um antagonismo entre os que defendem um “PSOL militante” e quem não defende não se sustenta. Todas as teses defendem bandeiras anticapitalistas para um partido “da nova esquerda”. Todas as correntes organizam militantes, ativistas e filiados – essa é uma das grandes vantagens da construção no PSOL.

Que os debates nas próximas plenárias possam ser mais generosos com aqueles e aquelas que chegaram agora e ficam horas sentados ouvindo uma plenária com enorme dificuldade de compreender diferenças e polêmicas.