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Por que não apoiamos o Arcabouço Fiscal?

Mesmo compondo a base de apoio a Lula no Congresso, o PSOL foi e é contra o arcabouço porque criará uma nova camisa de força para governo

Redes sociais/Matheus Gomes

Matheus Gomes

Deputado estadual pelo PSOL no Rio Grande do Sul, Matheus Gomes é historiador, servidor do IBGE e ativista do movimento social há mais de 10 anos. Sua coluna mostra a visão de um jovem negro e marxista sobre temas da política nacional e internacional, especialmente dos povos da diáspora africana.

Em 2016, logo após o impeachment da Dilma, foi proposto por Michel Temer e aprovado pelo Congresso a criação do teto de gastos. Segundo essa nova regra, o Brasil ficaria 20 anos sem reajustar suas despesas acima da inflação, mesmo com o crescimento populacional de 1,5 milhão por ano.

Claro que o teto não funcionou. Serviu mais como ferramenta de chantagem do centrão e do mercado. Nunca se cumpria o teto, mas para burlá-lo o governo tinha que liberar todos os anos dinheiro e cargos para o Centrão, e promessas de mais submissões ao mercado.

O teto foi criado ignorando todos os problemas reais do país. Uma crise social se misturou a uma crise sanitária, gerando mais fome, mais desemprego e miséria no país. Neste contexto, é que o presidente Lula prometeu a revogação do teto de gastos.

No entanto, ao invés da revogação, o governo propôs um “novo arcabouço fiscal”. Ao nosso ver, um erro. Não precisamos substituir o teto de gastos por uma nova regra, e sim revogá-lo. Não existia teto de gastos até 2016, e não era por esse motivo que a economia ia mal. Muito pelo contrário, desde 2016 o Brasil não sai da lama.

Nos 13 anos em que o PT governou o país, as despesas do governo cresceram em média 6% ao ano, ou seja, muito superior ao limite que está sendo proposto, de 2,5%. Em 2010, quando chegou ao Brasil a grande crise econômica dos EUA, as despesas do governo aumentaram em 16%! Tudo isso para combater aquela crise, e deu certo.

Estamos novamente em um momento delicado para a economia. Crise, persistência, desemprego e estagnação. O governo tem que aumentar gastos, como já vem fazendo, revitalizando programas sociais de renda, moradia, educação e saúde, além dos investimentos para a economia voltar a crescer. Com o arcabouço fiscal isso não será possível, ao menos não na intensidade e urgência que precisamos. Afinal, revogar o teto é também uma medida para avançar contra o bolsonarismo, que não será superado definitivamente enquanto não melhorarmos concretamente as condições de vida da classe trabalhadora.

Até o FUNDEB está dentro do limite, o que nem o teto de gastos fez. Este é um grande exemplo de como o arcabouço fiscal poderá impedir os avanços necessários do governo. Com restrição ao crescimento do FUNDEB como os estados e os municípios pagarão o piso do magistério? Como será possível continuar a valorização do salário da categoria? Como será possível acabar com o déficit de vagas nas creches? Agora pensem isso com o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Reforma Agrária, merenda escolar, SUS… vai ser bem difícil!

Outro problema é que o arcabouço limita os efeitos de políticas econômicas necessárias, como a reforma tributária justa, criação de impostos sobre riqueza, impostos sobre exportação de commodities etc. Mesmo se voltarmos a cobrar imposto sobre exportações de commodities (petróleo, minérios, soja, carne) ou sobre dividendos, isto não poderá se reverter em expansão de gastos sociais.

Mesmo compondo a base de apoio ao governo Lula no Congresso Nacional, o PSOL foi e é contra o arcabouço porque criará uma nova camisa de força para governo. Sai teto de gastos, entra arcabouço. Claro que uma versão menos ruim, ainda assim com o poder de impedir que o governo cumpra plenamente suas promessas de campanha e recoloque o pobre no orçamento. O voto contra o arcabouço foi uma defesa do programa que elegeu Lula.

Artigo originalmente publicado no portal Sul 21