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BRASIL

Nota do Afronte: Responder nas ruas a ofensiva da direita sobre o orçamento, o meio ambiente e os povos originários

Coordenação Nacional do Afronte!
Tiago Miotto/Cimi

Esta semana foi marcada por uma importante ofensiva política da direita sobre o governo Lula e o Congresso: além da aprovação do arcabouço fiscal, que foi proposto pelo próprio Ministério da Fazenda, também avançou uma proposta de reorganização ministerial que amplia o poder do centrão e foi votada a urgência do Marco Temporal (PL 490), que representa um enorme retrocesso aos povos originários.

A esquerda precisa responder a esses ataques nas ruas, retomando uma agenda nacional de mobilizações e ampliando a sua disputa sobre a sociedade. Somente assim poderemos reverter as condições ainda desfavoráveis do contexto político nacional.

Arcabouço Fiscal é aprovado na Câmara sob a resistência dos parlamentares do PSOL

A eleição de Lula no ano passado abriu melhores perspectivas para o povo brasileiro e permitiu a aprovação de medidas progressivas, como o reajuste do salário mínimo e das bolsas estudantis, o fim da “política de paridade internacional de preços” na Petrobrás, a redução do preço do gás, além da retomada de programas como o “Minha Casa, Minha Vida” e o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), entre outros exemplos.

Mas no Congresso, a maioria dos eleitos foram representantes do “Centrão”, da direita e da extrema-direita, que hoje tentam impor ao Brasil a agenda derrotada nas urnas no ano passado. No Senado, o cenário é um pouco melhor, mas na Câmara, Lula conta com 130 votos de um total de 513 deputados e, na sociedade, o bolsonarismo segue com influência de massas, apesar do seu recuo nas mobilizações de rua desde janeiro. Além disso, outras instituições importantes, como o Banco Central, seguem comandadas por figuras da extrema-direita e conduzem uma política reacionária, o que piora ainda mais a correlação de forças.

Para contornar essas condições adversas, Lula e o seu governo apostam em uma política de conciliação com o mercado, sendo o “Arcabouço Fiscal” o principal exemplo disso. Este Projeto de Lei Complementar foi proposto por Haddad (Ministro da Fazenda) para substituir o antigo Teto de Gastos, mas reproduz os mesmos mecanismos neoliberais do modelo anterior, com imposição de limites aos investimentos públicos [1], incluindo o FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), gatilhos que obrigam a contenção de despesas em caso de descumprimento das metas e até punição ao governo por crime de responsabilidade. [2] O projeto ainda vai passar pelo Senado e pode sofrer alterações.

Os efeitos do novo Arcabouço Fiscal comprometem as promessas de Lula na campanha e a possibilidade de implementação de um programa popular que ajude a esquerda a conquistar maioria social e derrotar definitivamente o bolsonarismo. Além disso, diante da profunda crise acumulada nos últimos anos, os limites aos investimentos podem trazer frustração e desaprovação ao governo.

Foram essas as motivações que orientaram toda a bancada federal do PSOL a votar contra o Arcabouço, diferentemente da posição dos parlamentares do PT, PCdoB e outros partidos da base governista, salvo pouquíssimas exceções, que votaram favoráveis ao projeto. O papel desempenhado pela bancada do PSOL foi importante, porque apesar da sua condição minoritária na Câmara dos Deputados, os destaques propostos e as defesas expressas no plenário podem servir como um ponto de apoio para o desenvolvimento das lutas no próximo período.

A linha do PSOL também vai ao encontro da política da maioria dos movimentos sociais e sindicatos, que nas últimas semanas se manifestaram contrariamente ao Arcabouço [3].

Centrão e a direita querem passar a boiada sobre o meio ambiente e os povos originários

Além do Arcabouço, também vimos modificações importantes na Medida Provisória 1154/23, que alterou a organização ministerial do governo Lula e foi assinada ainda durante a posse. Por ser uma Medida Provisória, ela tem efeito imediato, mas pode ser alterada pelo Congresso dentro de um prazo que será encerrado em 1º de junho. No último mês, o relator da proposta, Isnaldo Bulhões (MDB-AL) e outros parlamentares ligados à Bancada Ruralista aprovaram mudanças no texto inicial que reforçam o poder do Centrão, dos Militares e enfraquecem os Ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Originários [4].

Segundo a proposta, que ainda passará pelo plenário da Câmara e do Senado, a demarcação de terras indígenas sai do Ministério comandado por Sônia Guajajara e vai para o Ministério da Justiça e o Ministério do Meio Ambiente perde o controle sobre a Agência Nacional de Águas e sobre o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é um instrumento para controlar conflitos em terras privadas e em áreas de preservação.

Para piorar ainda mais o cenário, na quarta-feira foi votada uma outra Medida Provisória que afrouxa a proteção da Mata Atlântica[5] e também foi aprovado o regime de urgência para a tramitação do PL 490, que é um atentado gravíssimo aos direitos dos povos originários. Também conhecido como PL do Marco Temporal, essa proposta sustenta uma tese jurídica reacionária, que chegou a ser apreciada pelo STF, e defende que uma terra indígena só pode ser demarcada se for comprovado que estes povos a ocupavam na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. Ou seja, todo o contexto histórico de etnocídio e expulsão dos povos indígenas das suas terras passa a ser desconsiderado e novas remoções e apropriações por parte de ruralistas serão facilitadas.

CPI do MST e CPMI do ato golpista de 08 de janeiro

Outros dois fatos relevantes foram a CPI do MST, construída pela oposição de extrema-direita para criminalizar um dos movimentos sociais mais importantes do país, e a CPMI dos atos golpistas, que foi instalada para apurar as responsabilidades dos bolsonaristas que invadiram a sede dos três poderes em Brasília em janeiro.

A CPI do MST é presidida por um investigado pelo STF pela participação em atos golpistas e o relator é Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro. Além da criminalização, a oposição quer usar a CPI para inflamar a sua base mais radicalizada e seguir em evidência no cenário nacional, projetando algumas das suas figuras para as eleições municipais no ano que vem.

No caso da CPMI, onde a correlação de forças é mais favorável ao governo, é necessário subir o tom contra os golpistas e colocar a extrema-direita contra a parede. Até o momento a linha do PT tem sido mediada, evitando grandes confrontos, mas é preciso ir a fundo nas investigações e punir os golpistas, seus financiadores e também os militares que participaram da tentativa fracassada de golpe.

É necessário ocupar as ruas em unidade para enfrentar os retrocessos e abrir caminhos à esquerda

Diante da ofensiva organizada pela direita, atuando por dentro e por fora do governo, a esquerda e os movimentos sociais precisam retomar a agenda de mobilizações, a começar pelo dia 30 de maio, próxima terça-feira, quando a APIB (Articulação Nacional dos Povos Indígenas) convocou um dia nacional de lutas contra o PL 490 e o esvaziamento do Ministério dos Povos Originários.

A tarefa da esquerda revolucionária que quer derrotar o fascismo e também construir uma alternativa política de massas no Brasil é fortalecer essa resistência nas ruas e no parlamento, como faz o PSOL, apostando com prioridade na mobilização a partir da unidade da classe trabalhadora e dos movimentos sociais.

É preciso reconhecer também que estamos em um contexto mais difícil para o desenvolvimento das lutas, apesar de importantes processos que ocorreram este ano, como a mobilização pela revogação do Novo Ensino Médio e outras greves em algumas categorias. Mas ainda não foi possível avançar desse patamar e importa considerar que ainda pesa sobre a vanguarda os efeitos de quatro anos de retrocessos do governo Bolsonaro e também os impactos da pandemia. O nosso maior desafio, portanto, é trabalhar pela massificação dos processos, combinado a uma ação paciente e dedicada de trabalho de base.

Nós do Afronte estaremos nas ruas no próximo dia 30 de maio, na mobilização convocada pela APIB e também queremos contribuir junto à Frente Povo Sem Medo e o PSOL com os próximos passos de todas essas lutas. As eleições para o Congresso da UNE que hoje acontecem em todo o Brasil também devem expressar esse debate na base das universidades e envolver todo o movimento estudantil.

  • Não ao Arcabouço Fiscal e a retirada dos mínimos constitucionais da saúde e educação

  • Derrotar o PL 490! Chega de genocídio contra os povos originários. Demarcação já!

  • Não à criminalização do MST e dos movimentos sociais! Lutar não é crime!

  • Sem anistia! Punição aos crimes do bolsonarismo