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BRASIL

Possível falência da Light demonstra o fracasso da privatização

Henrique Canary, de São Paulo
Foto: Divulgação

A Companhia Light do Rio de Janeiro acaba de entrar com pedido de recuperação judicial na 3ª Vara Empresarial do Estado do Rio de Janeiro. O pedido tem caráter de urgência e cita como motivo fundamental uma dívida de cerca de R$ 11 bilhões com diversos credores. A companhia vem enfrentando dificuldades financeiras já há algum tempo e as agências de avaliação rebaixaram a nota da Light para patamares que indicam insolvência, mesmo após a empresa contratar uma assessoria para a reorganização da companhia. Segundo a empresa de rating Fitch, o Grupo Light necessitaria de cerca de R$ 2 bilhões de financiamentos em 2023 e pelo menos R$ 1,5 bilhão em 2024 para poder se recuperar.

O pedido de recuperação, no entanto, possui complicações jurídicas. Acontece que a lei veda às concessionárias de serviços públicos de energia elétrica de recorrer aos regimes de recuperação judicial ou extrajudicial. Por isso, o pedido foi feito em nome da holding, e não da distribuidora de energia.

O fato é que a possível falência da Light é mais uma demonstração da tragédia das privatizações. A Light foi privatizada em 1996, sendo uma das primeiras empresas estaduais de distribuição de energia a entrar na onda privatista promovida pelo então governo de Fernando Henrique Cardoso. Na época, o discurso centrava, como hoje, na suposta ineficiência do Estado em gerir as empresas públicas e afirmava que a privatização era a solução para se obter melhores e mais baratos serviços. O que se viu, no entanto, foi um histórico de ineficiência e preços altos desde que a privatização foi concretizada.

Interessante observar que a Light não é a única empresa privatizada a enfrentar dificuldades. A Supervia, concessionária de vários serviços de transporte urbano no Rio de Janeiro também já teve um pedido de falência protocolado na Câmara de Comércio do Estado pela própria Light em função de uma dívida não paga. A Supervia, além disso, é famosa pelo péssimo serviço prestado em trens urbanos no Rio de Janeiro. O mesmo acontece com a CCR, concessionárias do serviço de barcas entre o Rio de Janeiro e Niterói.

Além dos péssimos serviços prestados, tem ganhado importância cada vez mais o problema dos acidentes em empresas privatizadas. É o caso do Metrô de São Paulo, cujas linhas privatizadas apresentam péssimos indicadores de segurança e qualidade de serviço, com inúmeros acidentes tendo ocorrido nos últimos tempos. As linhas que permanecem sob o controle do Estado e operam com mão de obra concursada, ao contrário, apresentam excelentes índices de segurança, eficiência e aprovação popular.

Não é preciso lembrar as várias tragédias que envolveram a Vale, estatal privatizada em 1997, também na onda privatista promovida por FHC. Como todos lembram, a Vale privatizada foi a empresa responsável pela destruição da cidade de Brumadinho, num dos maiores acidentes socioambientais da história do país.

Hoje, estamos diante de uma nova onda privatista, iniciada pelos governos Temer e Bolsonaro e que o Congresso Nacional não parece disposto a frear, vide a recente derrubada do decreto de Lula que suspendia a privatização do saneamento.

Em vários países que privatizaram suas empresas estatais, a sociedade começa a fazer o balanço dessa experiência e em muitos casos está revertendo as privatizações. É o que ocorreu em Berlim, Paris, Budapeste, Bamako (Mali), Buenos Aires, Maputo (Moçambique) e La Paz, que remunicipalizaram ou reestatizaram seus serviços de água e esgoto recentemente. De acordo com um levantamento feito pelo Instituto Transnacional (TNI), centro de pesquisas com sede na Holanda, desde o início do século até agora, já ocorreram 267 casos de remunicipalização ou reestatização dos serviços de água e esgoto somente na Europa.

É importante lembrar também que Lula se elegeu com a promessa de rever a privatização da Eletrobrás, promovida pelo governo Bolsonaro. É preciso tirar essa proposta do papel e começar imediatamente os estudos para a reestatização dessa empresa estratégica. Este seria um importante primeiro passo rumo a um amplo processo de fortalecimento do caráter social do Estado, uma das principais promessas de Lula durante a campanha.