Com dois milhões de participantes segundo as organizações, 740 mil segundo a polícia, mantendo-se entre as maiores mobilizações desse movimento, e acima das demais grandes mobilizações sociais das últimas décadas. 450.000 em Paris, 80.000 em Bordeaux, 150.000 em Toulouse, 60.000 em Nantes, 8.000 em Bourges, 400 em Lamballe, 15.000 em Perpignan, 15.000 em Toulon, 15.000 em Tarbes, 15.000 em Puy-en-Velay1, estes são números bastante impressionantes. Isso em um contexto muito complicado: a manifestação só foi convocada com um prazo muito curto para muitos setores, especialmente para o setor privado e a Educação Nacional, onde leva tempo para convencer e colocar [as categorias] em movimento; o congresso de crise da CGT mobiliza um grande número de militantes[1]; a repressão atingiu novos patamares, provocando indignação, mas também medo.
O que impressiona, além disso, é o número de ações de bloqueio, como em um depósito de latas de lixo na subprefeitura de Guigamp, bloqueios de estradas, a construção de um muro em frente o escritório do porta-voz local do Renascimento [partido do presidente Macron] em Lille[2], as invasões do aeroporto de Biarritz, manifestações espontâneas antes das grandes manifestações, ou invasões das vias férreas na Gare de Lyon ou Miramas, por exemplo.
E também a lenta, mas determinada entrada da juventude no movimento. As Assembleias Gerais Municipais começam lentamente a se tornar mais massivas, com 250 pessoas em Paris Diderot, por exemplo. Enquanto 500 escolas secundárias foram bloqueadas, esses desfiles de jovens foram formados a partir de escolas, pequenos locais universitários, etc.
O movimento está em uma zona área cinzenta
A direção da CFDT (Confederação Democrática do Trabalho Francesa) está buscando uma saída, um acordo com o governo, simbolizado pela proposta de “mediação” também adotada pelo secretário-geral da CGT, Philippe Martinez, o que parece custar caro à liderança da CGT em seu congresso. No entanto, não devemos deixar de lado o fato de que, na CFDT, ativistas de base e dirigentes intermediários estão envolvidos diretamente na mobilização e não querem abandonar o movimento.
A greve de massas renovável fracassou entreos dias 7, 8 e 9 de março, mas foi além do calendário sindical.[3] Isso não significa que essa perspectiva não seja mais válida, mas que no curto prazo ela pode não mais existir. Os setores em greve renovável também estão lutando para manter sua greve, com os fundos de greve começando a encolher e os grevistas sendo menos numerosos. No entanto, essas greves permitem manter uma agitação cotidiana o que é crucial para o movimento.
A juventude demorou a se tornar uma força motriz. No entanto, sua participação maciça nas manifestações de 28 de março (500 escolas secundárias bloqueadas, uma centena de campi universitários bloqueados ou pelo menos seriamente interrompidos) é um importante ponto de apoio para uma aceleração do movimento na juventude. Veremos nos próximos dias se as assembleias gerais e as ações se massificam e se permitirão dar um novo fôlego ao movimento.
Finalmente, a repressão ultrapassou um nível, com os graves ferimentos infligidos aos manifestantes nos protestes em defesa das pensões, mas também em Sainte-Soline contra os projetos das mega bacias[4]. Se a revolta democrática não estiver a altura das ameaças, a repressão será um freio à mobilização, retarda a participação em manifestações, em ações de bloqueio e piquetes.
Sem mencionar o congresso da CGT, cujo resultado é incerto e cujos elementos de crise prevalecem por enquanto sobre os elementos dinâmicos: nenhum dos setores que se enfrentam no congresso tem uma solução para o movimento, a liderança em torno de Martinez favorece o acordo com a CFDT, que desempenha um papel positivo no movimento, mas do qual também seria necessário se emancipar para construir a greve geral. Enquanto os oposicionistas, mais combativos em muitos pontos, são, por enquanto, influenciados demais por uma linha identitária que poderia romper o vínculo com os outros sindicatos e poderia levar ao fim do movimento em um breve espaço de tempo. Além disso, não possuem necessariamente os meios para uma política mais radical na base, porque as dificuldades objetivas são difíceis de contornar. Um resultado positivo, combinando uma abordagem unitária e a construção ofensiva da greve geral, ainda não está na ordem do dia, mesmo que as coisas possam evoluir no congresso.
Então, como vencer?
Não há uma solução simples. Uma coisa é certa, não basta o mantra da greve geral para denunciar as direções sindicais. Lutar pela greve geral, sim, mostra uma perspectiva correta, mas fazê-lo de forma sectária tem um papel negativo, negando as dificuldades do movimento e criando rupturas dentro dele. Esta é a política seguida por Revolução Permanente, ao tentar isolar a ala mais combativa, rompendo seus laços com as massas.
A batalha pela greve geral é uma luta em que se deve propor o que fazer para avançar o movimento como ele é, levando em conta a consciência de classe como ela é, e não como se sonha que ela seja. Hoje, temos algumas certezas e pontos de apoio, para ser fortalecidos:
– Mantemos sempre a posição de construção da greve, renovável sempre que possível, pelo menos semanalmente, para manter a mais ampla unidade, entre as lideranças das organizações, mas também e acima de tudo entre as diferentes camadas de mobilização, os diferentes níveis de combatividade e possibilidades de ação.
– Mantemos a batalha pela auto-organização, apesar das grandes dificuldades. Todas as AGs, coordenações, se não se considerarem mais representativas do que realmente são, podem desempenhar um papel positivo, discutindo o movimento politicamente e propondo e organizando ações.
– Incentivamos uma visão política do movimento. Amplas massas, especialmente entre os jovens, vêem esta luta como uma luta democrática, além de ser social e reivindicatória. Essa visão fortalece o movimento, levando em conta as demandas setoriais, das mulheres, sobre salários, serviços públicos, seguro-desemprego, [contra o projeto de] lei [contra a imigração dita “irregular”] proposto pelo ministro do Interior Gérald] Darmanin , transição ecológica, contra as bacias. E, no fundo, uma luta contra o poder de Macron, sua polícia, os patrões.
– Esta batalha política também requer instrumentos políticos para aumentar a correlação de forças a favor do mundo do trabalho. A luta é contra Macron, mas não confiamos no Conselho Constitucional (CC)[5] para fornecer soluções e combatemos qualquer tentativa de nos associarmos ao Rassemblement National [de Marine Le Pen]. São falsos amigos, verdadeiros adversários. Tudo vai depender do equilíbrio de poder. Uma possível censura por parte do CC daria uma solução institucional para a crise com base em um equilíbrio de poder a favor do movimento, mas ela não salvaria um movimento em dificuldades. E, além disso, a extrema-direita, que agora ataca as manifestações ou ocupações, ou age por meio da polícia em manifestações e em Sainte-Soline, é um inimigo declarado do movimento, ao qual devemos dotar de meios para responder, através do trabalho unitário e da autodefesa das estruturas auto-organizadas.
– A crise política é aguda, quer o movimento vença ou não. Diante dessa crise, apresentamos como solução o estabelecimento de um governo dos explorados e oprimidos, baseado na mobilização, agrupando todas as organizações do movimento operário. Diante do escândalo [anti]democrático da repressão policial, do artigo 49.3[6], propomos o fim da Quinta República e [a eleição] de uma Assembleia Constituinte.
E agora?
De todos esses pontos de vista, a data de 6 de abril não é ruim em si mesma. Pode ser um funeral do movimento, se não fizer parte de uma dinâmica, ou, pelo contrário, permitir construir uma nova grande mobilização, dando tempo para arrastar os setores menos militantes. Mas, para isso, é preciso ritmo, ir além do calendário intersindical, por ações que não sejam isoladas, mas, ao contrário, ampliem o movimento, como o bloqueio do Louvre. Como poderia ser um dia de bloqueios vias de comunicação (estações, rodovias, portos, etc.). Ou uma manifestação nacional em Paris com a ideia de “Macron, estamos aqui para te mandar para casa!”
Os bloqueios devem ser colocados na perspectiva da construção da greve, que continua a ser a melhor maneira de bloquear. Os bloqueios podem ser utilizados para demonstrar que estamos em todos os lados, que nós fazemos funcionar todas as engrenagens da sociedade e que podemos paralisá-las por meio da greve geral, uma greve geral para mudar tudo.
Especialmente porque o processo político deste movimento não terminou: entre a violência policial em Sainte-Soline, o escandaloso processo de proibição das Revoltas da Terra[7], o cancelamento da visita do Rei da Inglaterra, o congresso da CGT, quase todos os dias trazem um novo choque. Isso mostra a instabilidade da situação, as múltiplas possibilidades de reviravoltas. A decisão do Conselho Constitucional de 14 de abril pode ser um desses momentos, ou uma nova provocação de Macron, Darmanin ou [da primeira-ministra] Borne. É também um dos papéis dos ativistas políticos fazer a ligação entre todos os eventos para acelerar o amadurecimento e a conscientização. Sem esquerdismo, sem gritar “somos determinados e revolucionários” em todos os lados, mas com a preocupação de atrair as massas para a ação política.
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