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BRASIL

Para onde vai Aracaju?

Alexis Pedrão, de Aracaju (SE)
Reprodução

Centro de Aracaju

Tenho escrito pouco. A correria da vida não tem me permitido sistematizar as ideias no tempo que o cotidiano exige. Mas paro esse momento para refletirmos urgentemente sobre os caminhos da nossa querida Aracaju. Tem muitos anos que a população vem se posicionando em favor de uma cidade inclusiva, que respeite as pessoas em toda sua diversidade, que possua desenvolvimento econômico e emprego com respeito aos modos de vida tradicional, nossa cultura, o meio ambiente, os rios, praias e mangues.

Evidente que há um peso da política nacional e estadual, pois Aracaju não é uma ilha e depende de recursos e parcerias externas. Contudo, no que diz respeito às escolhas políticas para o presente e o futuro da cidade, a prefeitura mantém um acelerado processo de privatização que vem impossibilitando uma vida com dignidade para a maioria da população aracajuana.

Percebe-se o poder das construtoras que avançam sobre a praia, zona sul e zona norte, enquanto o plano diretor segue como letra morta. A devastação avança sobre as lagoas que são fundamentais para o controle das chuvas e sobre a vida dos pescadores e catadoras de mangaba. Sobe o preço dos alugueis e dos serviços nas áreas valorizadas, e os mais pobres tem que ir morar mais longe por não conseguir mais pagar aquele custo de vida. A política social de moradia limitada a uma pequena quantidade de alugueis sociais despreza a maioria das favelas e ocupações urbanas.

O sistema de transporte cada dia mais caótico e desrespeitoso com trabalhadores e usuários. Os rodoviários estão tendo direitos retirados, sendo perseguidos e demitidos por lutar por um salário decente, e os usuários prejudicados com a política de cartão que impede muitas pessoas de utilizarem o serviço. As empresas chegaram a fechar os postos de recarga após questionamento do ministério público sobre a taxa da recarga. As empresas desrespeitam todos os limites e a prefeitura ainda defende isenção e subsídio para esse setor, que deveria estar respondendo na justiça pela má prestação do serviço de transporte coletivo.

Nas eleições de 2020, quando disputamos a prefeitura pela Frente de Esquerda com o Psol, levantamos a denúncia da PPP – Parceria Público Privada – da iluminação pública. A privatização desse setor se deu por meio de um contrato no valor de mais de R$ 30 milhões por ano durante mais de uma década. Infelizmente, os recursos públicos todos os dias estão sendo repassados para as grandes empresas privadas, quando deveriam ser investidos nos direitos sociais da população.

Atualmente, o grande projeto político da prefeitura é a PPP da Saúde. Pretende entregar para o setor privado parte da rede municipal de saúde de Aracaju, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) 1ª e 2ª região de saúde que englobam zona de Expansão e Sul, por um período de 25 anos em um contrato no valor de mais de R$2 Bilhões. Vale registrar que todo o movimento de saúde de Aracaju e de Sergipe, sindicatos, trabalhadores e a maioria dos usuários são contra a privatização.

Poderia falar do setor cultural que vem clamando há muito tempo por respeito, espaço e investimento público, mas segue ignorado pelos gestores da cultura e sua política medíocre.

Poderíamos avançar em diversas outras questões, mas paramos aqui pelo limite do texto. Não bastasse os equívocos políticos e a lógica de governar principalmente para os mais ricos, há também um problema de método. Democracia, transparência e debate são palavras desconhecidas pela prefeitura, incluindo sua “tropa de choque” na câmara.

Projetos da prefeitura sempre chegam à câmara de vereadores “em regime de urgência”, para serem votados de um dia para o outro, sem o menor pudor com a ausência de discussão. A maioria dos vereadores aprovam, sem titubear, os projetos do executivo. Outro exemplo foi a audiência pública sobre a PPP da saúde, realizada em formato virtual, quando não foi permitida a fala e o debate. Para atender as grandes empresas se utilizam de atos antidemocráticos. Se voltarmos um pouco, lembramos das audiências do plano diretor, na qual os próprios moradores dos bairros foram impedidos de entrar nas escolas, como foi o caso das famílias da Ocupação Centro Administrativo na audiência ocorrida no Bairro Bugio.

Precisamos mudar o rumo. É escandalosa a lógica de que as grandes empresas mandem e desmandem no orçamento público enquanto a população fica sem o atendimento básico de creche, posto de saúde, transporte público de qualidade, etc. É triste que o PDT liderado por Edvaldo – que tem um passado ligado à esquerda – esteja completamente adaptado à governabilidade burguesa e o prefeito seja, na prática, apenas uma espécie de “menino de recado” das grandes empresas na prefeitura.

Nos anos 2000, Marcelo Deda foi eleito prefeito em uma chapa “puro sangue” da esquerda afirmando que iria “desprivatizar” Aracaju. Com essa plataforma foi acolhido pela população aracajuana. Infelizmente, a promessa não foi cumprida, a gestão não avançou nesse sentido e o PT ficou refém de alianças com setores da direita. Óbvio que os tempos são outros. Mas a questão não é nova e uma frente de esquerda já saiu vitoriosa na história política recente. A experiência demonstra que a unidade da esquerda é elemento central. Podemos discutir diversos nomes para liderar esse projeto. Sou muito inspirado pelas companheiras do PSOL, as parlamentares Linda Brasil e Sonia Meire.

Mas os nomes, por melhores que sejam, sempre precisam estar vinculados a um projeto coletivo. Essa é a nossa proposta. Mudar os rumos da cidade de Aracaju e da política institucional. Por isso seguimos apostando na organização popular. Espero que possamos influenciar e vencer a disputa pública cotidiana – muito mais complexa que a mera participação eleitoral – de que Aracaju deve estar nas mãos da maioria trabalhadora e não de uma minoria detentora do grande poder econômico. Que a vida possa estar acima do lucro.

*Alexis Pedrão é professor de Direito da UFS, da Faculdade de Direito 8 de julho, coordenação da Ocupação Centro Administrativo, dirigente nacional do PSOL e ex-candidato a prefeito de Aracaju