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BRASIL

Contra quem, cara pálida?

Parando um minutinho para ver o Estúdio i da Globo News, eis que me deparo com esta pérola em destaque: “Para empresários, Haddad precisa convencer Lula a não jogar contra”. A pergunta é: contra quem, cara pálida? É preciso entender e completar a frase.

Fábio José de Queiroz, de Fortaleza (CE)
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, e Lula
Fotos: Agência Brasil/Montagem: Eol

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, e Lula

Essa frase estampa a visão hegemônica dos meios midiáticos que não cessam de tentar confiscar a vitória popular obtida nas últimas eleições. A repetição incessante dessa retórica pró-empresarial demonstra que a burguesia opera com a lógica de captura do governo.

Colocada no tempo, esse discurso da mídia, refletindo os interesses do empresariado e do tal “mercado”, reforçou-se diante das justas críticas de Lula à política criminosa adotada pelo Banco Central (comandado por Roberto Campos Neto), autônomo do governo e do povo e cooptado pela burguesia

Para avaliar o significado da frase como um todo, é necessário retomar a indagação inicial: se o Haddad precisa convencer Lula a não jogar contra, a questão de fundo é esta: contra quem, cara pálida?

O braço jornalístico das classes dominantes não ousa ir adiante na frase, pois um passo a mais implicaria dizer: Haddad precisa convencer Lula a não jogar contra os interesses do capital. Eis a chave do problema.

Surge consequentemente a questão: o que deveria fazer Lula? Recuar diante do fato de que a autonomia do BC é uma ferramenta dos capitalistas e dos especuladores da bolsa? Se a resposta é sim, haveria de se admitir que Lula ganhou, mas quem governará é  o “mercado” por meio do Banco Central.

Se a frase global fosse tomada a sério, deveríamos colocar a questão pelo avesso, uma vez que os ideólogos dos capitalistas tentam alavancar o professor Haddad como representante do capital no interior do governo. Nesse caso, do ponto de vista do povo, seria imprescindível afirmar: Lula precisa convencer o ministro a não jogar contra os interesses da maioria do povo.

Obviamente, hoje por hoje, do ponto de vista do ativista que lutou para eleger Lula, neste caso em específico, ele entende que não cabe mergulhar nesse rio de águas turvas, uma vez que a intenção dos endinheirados é colocar uma cunha entre integrantes do próprio governo, pois, aqui, dividindo a administração Lula da Silva, as forças do capital têm como alvo derrotar o programa vencedor nas eleições presidenciais de 2022, enquanto fala de paz.

Mas não pode passar batido de que, do ponto de vista dos capitalistas, o apelo à paz com o governo contém uma estratégia: preservar o programa iniciado por Temer e aprofundado por Jair Bolsonaro. Um programa que destruiu conquistas históricas da classe trabalhadora e pavimentou o caminho para a farra empresarial.

Compreender a natureza do capital e de seus ideólogos é decisivo para trabalhadores e trabalhadoras que, certamente, viram na eleição de Lula o começo do fim de um pesadelo que se estende por anos.

O ritmo da esperança acompanha o ritmo da experiência com o governo que, em grandes linhas, a classe trabalhadora toma como seu governo. É indispensável se apoiar nessa esperança, e na capacidade de mobilização que ela sugere, para realizar as mudanças necessárias; mudanças contra as quais o capital e os seus asseclas militam 24 horas por dia.

Afigura-se fora de dúvida que isso é luta de classes. Nela, a vitória depende de nitidez estratégica e de táticas justas. Nesse devir, se os apressados comem cru, os conformistas chegarão atrasados para o almoço.

Uma conclusão fundamental

A conclusão fundamental para o trabalhador e a trabalhadora é que a condição para que o programa vitorioso nas urnas não pereça, Lula deve jogar contra as manobras do capital, e isso passa por liquidar a tal “autonomia” do Banco Central.

Os capitalistas e seus porta-vozes na mídia corporativa falam de democracia, mas querem que a vontade popular se submeta aos poderes absolutistas do capital. O povo não precisa de poder moderador, seja das forças armadas, seja do “deus mercado”. Em certo sentido, essa mensagem foi dada no ano passado, quando as massas elegeram Lula e não o “mercado” para governar.

Mas tudo indica que, no próximo período, o êxito dessa mensagem dependerá da mobilização popular contra os desejos impiedosos do capital e as ameaças das forças do atraso.