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BRASIL

Precisamos falar sobre a destituição de Augusto Aras

Henrique Canary, de São Paulo (SP)
Antonio Cruz/Agência Brasil

Não bastassem as inúmeras vezes em que Augusto Aras fez corpo mole na investigação e punição dos crimes de Bolsonaro, agora o Procurador-geral da República é novamente alvo de críticas em função de sua atuação na apuração dos atos antidemocráticos que vem ocorrendo no país desde a divulgação do resultado eleitoral em 30 de novembro de 2022 e que culminaram na vandalização de Brasília no último domingo.

Aras é acusado de desmontar uma série de mecanismos investigativos, além de perseguir procuradores que buscavam de maneira independente informações a respeito de atos antidemocráticos.

Segundo apuração realizada pelo Estadão, no dia 08 de novembro de 2022, Aras extinguiu os chamados “grupos especiais de atuação em crise” do Ministério Público Federal, que visavam investigar crimes dos golpistas. No texto da portaria lê-se: “Destaco que o art. 5º da referida portaria revoga as disposições em contrário, inclusive eventuais portarias dos Procuradores-Chefes que tenham criado grupos especiais de atuação em crise, tendo em vista, ainda, que, conforme a Lei Complementar nº 75/93, o Regimento Interno Diretivo do MPF e o Ato /conjunto PGR/CASMPU nº 1/2014, a criação de tais grupos não consta do rol de atribuições dos procuradores-chefes”.

Outra prática denunciada é a devolução sistemática a procuradores dos pedidos de informação feitos à PGR sobre investigados bolsonaristas e acampamentos em quarteis. Em diversos momentos, Aras chegou a acionar a corregedoria da PGR (órgão que zela pela disciplina interna e ética dos funcionários) contra procuradores que buscaram informações diretamente no Supremo Tribunal Federal (STF) para alimentar seus inquéritos.

Segundo fontes do próprio MPF, a relação entre a PGR e os procuradores é marcada por conflitos constantes, cerceamento de atividades, pressão política e demora em agir. Alguns procuradores do RJ se manifestaram publicamente sobre o caso, alegando que foram processados pela corregedoria da PGR porque decidiram abrir investigação sobre os primeiros atos antidemocráticos, que tiveram lugar ainda logo depois da divulgação do resultado das eleições.

No lugar dos “grupos especiais de atuação em crise”, Aras criou, por meio da Portaria 912, uma comissão permanente, formada pelo próprio Procurador-geral, pelo vice-Procurador geral e outras altas autoridas da PGR. Segundo relatos, essa comissão só se reuniu uma vez e não deu encaminhamento a nenhuma das investigações que lhe cabia.

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), insuspeito de qualquer simpatia por Lula ou pela esquerda, chegou a levantar o assunto abertamente no twitter: “Uma parte relevante da tragédia que vivemos é consequência da sensação de impunidade que deriva de uma PGR omissa, claramente capturada por um projeto político antidemocrático”.

Após a selvageria do último domingo em Brasília, Aras, aparentemente, resolveu se relocalizar e determinou abertura de investigação sobre os atos de terrorismo e sobre o governador do DF Ibaneis Rocha. Ainda assim, sua atuação não deixa de fomentar críticas das mais variadas, oriundas de agente dos mais diversos espectros políticos.

Escolhido por Bolsonaro em 2019 sem ser parte da lista tríplice votada por membros da instituição, Aras sempre foi um agente direto do governo, mais um “Engavetador-Geral da República” do que qualquer outra coisa. Foi assim com a crise da pandemia e com todos os outros escândalos que marcaram o governo Bolsonaro. Agora suas digitais estão impressas nos prédios invadidos, obras de arte destruídas e equipamentos vandalizados. É preciso discutir seriamente sua destituição, que pode ser feita pelo presidente da República com a autorização do Senado. Lula tem prerrogativa legal e autoridade política para fazê-lo. É preciso aproveitar o momento em que os setores democráticos dos três poderes estão unidos em torno da defesa da governabilidade. Não dá para esperar até o final do mandato de Aras. Não é possível que um agente evidente do Bolsonarismo siga em uma função tão importante para o funcionamento do Estado e a preservação da democracia.