Um golpismo esperado, mas chocante
Assistimos estarrecidos aos acontecimentos do último domingo. Apesar de ser um episódio previsível, foi chocante acompanhar uma multidão de golpistas avançando — literalmente — contra as instituições e a democracia. As cenas de violência e destruição reforçam a caracterização acertada sobre o que é o bolsonarismo: um movimento fascista, violento e que tem como projeto político a derrubada do atual governo e instauração de um regime autoritário. O que ocorreu ontem, mas que na verdade já se prolonga há muito mais tempo, não pode ser visto como “normal” ou “do jogo”. Do mesmo modo, não podemos considerar que existe um “bolsonarismo aceitável” e um “bolsonarismo radical”. O bolsonarismo é um só e não joga dentro das quatro linhas da democracia, é um movimento golpista.
Igualmente escandalosa foi a conivência da PM e do próprio governo do DF. Claramente havia um elemento de apoio por parte das forças policiais, já que não fizeram o mínimo para impedir a invasão dos fascistas e, conforme vídeos gravados pelos próprios bolsonaristas, haviam policiais abertamente demonstrando apoio aos atos de terrorismo. O bolsonarismo está impregnado nas forças policiais, mas não apenas nelas, já que os 4 anos do governo Bolsonaro possibilitaram a infestação das instituições com esse parasita que é o fascismo. A cada segundo em que os bolsonaristas não são varridos para fora do poder público, mais o verme fascista corrompe e corrói a democracia.
Levando essas questões em conta, podemos concluir que:
1. O bolsonarismo é um movimento fascista que não pode ser aceito na sociedade. A derrota eleitoral de Bolsonaro foi importantíssima, mas agora é preciso seguir para a desarticulação desse movimento e punir firmemente todos aqueles que defendem o golpismo;
2. É urgente desbolsonarizar o país, política e ideologicamente, mas também as suas instituições.
A desbolsonarização do Brasil deve ser tomada como uma tarefa central do atual governo no que diz respeito ao âmbito institucional. Livrar-se de todos fascistas que Bolsonaro colocou para dentro das instituições e garantir que não haja mais espaço para que “as cobras se criem”. De todo modo, quem ocupa o Ministério da Defesa é José Múcio Monteiro.
Da ARENA até o Ministério da Defesa
Manifestações contrárias e a favor têm circulado muito desde que Múcio foi anunciado como ministro da Defesa. Algumas das manifestações positivas foram de pessoas como Hamilton Mourão, ex-vice de Bolsonaro e atual senador, afirmando que confiava no nome de Múcio para a pasta. Também é preciso lembrar que em 2020 o próprio Bolsonaro declarou ter “paixão” por Múcio. Apenas isso já deveria ser motivo para levantar todas as suspeitas possíveis, mas não pára por aí. Múcio tem no seu currículo passagem pelo partido de sustentação da ditadura, a ARENA, e de outros partidos de direita como o PFL e PDS. Há 20 anos Múcio é filiado ao PTB, partido de Roberto Jefferson. Como fica evidente, não há nada de positivo no currículo de Múcio.
Múcio, logo que assumiu, já fez questão de declarar que os acampamentos golpistas — localizados em frente aos quartéis e clamando por um golpe militar — eram, na verdade, “expressões da democracia”. O que lhe dava certeza disso? A presença de amigos e familiares entre os acampados. Não se trata de mera conivência, muito menos de ignorância, mas simpatia. Simpatia essa que é mútua, como já demonstrado por Mourão e Bolsonaro.
Depois dos acontecimentos de domingo, Múcio tentou mudar sua narrativa. Agora, os acampamentos serão desmontados e já não é possível “aturar” essas manifestações. O que Múcio finge não perceber é que esses acampamentos jamais deveriam ser “aturados”. Nenhuma manifestação que reivindique um golpe e intervenção militar deve ser tolerada. A mudança de discurso do atual ministro da Defesa é superficial, uma reação defensiva em um contexto no qual sua posição original é ainda mais inaceitável. Não deve nos enganar: uma carreira política derivada dos horrores da ditadura não muda de uma noite para a outra através de uma revelação — principalmente quando essa revelação se dá em meio a fatos previsíveis, mesmo que terríveis.
Desbolsonarizar o Brasil já!
Bolsonaro e o bolsonarismo desfiguraram de tal forma o debate público no Brasil que consideramos corriqueiro pessoas de verde e amarelo desfilarem orgulhosamente faixas com as mais absurdas barbáries. Não podemos mais aceitar. O terror que os fascistas de Bolsonaro instauraram em Brasília deve ser visto com a mais profunda gravidade. Não é uma surpresa, porque há muito tempo eles dizem o que vão fazer. É de conhecimento público e explícito. Isso agrava ainda mais a situação.
Como dito, desbolsonarizar o país é uma tarefa urgente. Os movimentos sociais já estão organizando a resposta para hoje: retomar as ruas, defender a democracia e cobrar que não haja qualquer perdão para os golpistas. É importante deixarmos claro que não haverá mais espaço para o golpismo bolsonarista e que estaremos alertas e nas ruas para impedir qualquer tentativa que venha dos fascistas.
Do mesmo modo, é preciso que o governo seja consequente na desbolsonarização das instituições. Não é possível manter no Ministério da Defesa alguém que já declarou considerar democrático aquilo que existe de mais golpista na atualidade. Múcio não é um aliado na nossa missão e jamais será uma ferramenta útil na correção de rumos do nosso país. Para construir um amanhã para o Brasil, não podemos estar presos àqueles que querem nos arrastar para o passado.
* Matheus Hein é Mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Militante do Afronte e Resistência/PSOL
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