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BRASIL

Não é verdade que o apoio a Lira é a única forma de aprovar a PEC

Nericilda Rocha, de Fortaleza (CE)
Pedro França/Agência Senado

Todos felizes com a classificação do Brasil para as oitavas de final da Copa do Mundo. Também estão felizes e esperançosos com a aproximação da posse do novo presidente, os milhões de brasileiros e brasileiras que elegeram Lula. Mas as pedras do caminho precisam ser retiradas sob risco de amargarmos derrotas.

Bolsonaro e os bolsonaristas seguem atuando e tumultuando para impedir a transição, a posse, e o futuro governo. Ele e seu partido, o PL, atuam incentivando as ações golpistas de bloqueios, atos em frente aos quartéis, ataques e ações terroristas contra brasileiros. Além de ter deixado um rombo no orçamento do país para o próximo governo, Bolsonaro retirou nesta segunda-feira, 1,68 bilhão do já minguado orçamento do MEC e 224 milhões dos recursos das universidades.

No legislativo, aqueles parlamentares que não são propriamente “bolsonarista raíz” e nem do PL, mas que garantiram a governabilidade de Bolsonaro apesar das atrocidades cometidas por ele, estão atuantes na Câmara e no Senado, buscando barganhar com o governo que será empossado 1 de janeiro.

O rei da barganha é Arthur Lira (PP) que busca condicionar o apoio de Lula e da federação PT, PV, PCdoB à sua reeleição como presidente da Câmara dos deputados em troca da aprovação da PEC do Bolsa Família.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição para garantir o Bolsa Família a partir de 2023 no valor de 600 reais é uma medida necessária porque o governo Bolsonaro não deixou dinheiro para isso. A PEC foi apresentada pela equipe de Lula logo após o resultado do segundo turno, mas somente após o presidente eleito ir pessoalmente à Brasília, apesar de estar se recuperando de uma cirurgia, ela começou a ser analisada.

Na manhã da terça-feira, 29, depois da articulação de Lula e apoiadores, foi possível conseguir 29 assinaturas de senadores (era necessário pelo menos 27) e foi dado início à análise da PEC no Senado. O texto protocolado retira o Bolsa Família do teto de gastos por quatro anos e prevê, ao todo R$ 198 bilhões fora do teto em 2023. Com isso estará assegurado o pagamento do bolsa família com parcela de R$ 600 a partir de janeiro, mais um adicional de R$ 150 por criança de até seis anos, o que chegaria a R$ 175 bilhões por ano, e mais R$ 23 bilhões para garantir o programa farmácia popular cortado por Bolsonaro, compra de vacinas, merenda escolar, habitação popular e reajuste do salário mínimo.

A análise da proposta começa pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Depois, tem de passar pelo plenário principal da Casa e requer o voto favorável de pelo menos 49 senadores (dos 81 da casa) em dois turnos de votação. Em seguida segue para a Câmara comandada por Arthur Lira. Só depois de concluída a análise pelas duas Casas do Congresso Nacional, o texto será promulgado e entrará em vigor. E o prazo limite é até 16 de dezembro, prazo limite para inclusão nos ajustes do orçamento de 2023.

Lula corre contra o tempo para garantir comida aos 33 milhões de brasileiros que passam fome, conforme promessa de campanha. O mercado e os apoiadores neoliberais que estiveram na frente ampla que elegeu Lula, pressionam até o último momento para que a PEC seja desidratada. No máximo tenha duração de dois anos e não quatro como está no texto. Lira por exemplo, apesar de já ter recebido a declaração de apoio do PT à sua reeleição, é portador desta opinião.

A esperança não pode ficar refém do centrão

A PEC é extremamente progressiva. Precisa ser aprovada e evidentemente as negociações são parte da realpolitik. Mas não é verdade que o apoio a Lira é condição para aprovar a PEC e mais, que seja a única condição para a governabilidade de Lula. É tudo ao contrário!

A PEC pode ser aprovada sem necessariamente se render ao centrão! Mesmo para o atual congresso é difícil explicar voto contrário ao Bolsa Família de 600 reais! Não se pode aceitar o sequestro do futuro governo e do programa vencedor nas urnas. É rendição sem luta! A ampla maioria da população brasileira está a favor do bolsa família a 600 reais e de desfazer os retrocessos do último governo, assim como a favor de que Lula governe! Mobilizar essa maioria deve ser a condição permanente da governabilidade. Pacto nas alturas com o centrão, um velho bloco que tem como ideologia seus próprios interesses, ou seja, encher seus bolsos, é um caminho que pavimenta a derrota.

As ameaças que rondam o governo recém-eleito são as ações golpistas da extrema-direita liderada por Bolsonaro com a conivência de setores do exército, mas também a ameaça de desfigurar a vitória das urnas, de transformá-la em estelionato eleitoral, de desesperançar a esperança. E os setores da burguesia liberal que estiverem na composição do governo trabalharão para isso. O centrão liderado por Lira não é neutro nesta situação. A decisão de Lula e da federação PT, PCdoB, PV em apoiar Arthur Lira para reeleição da Câmara é um grave erro que fortalece o orçamento secreto que agigantou Lira.