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BRASIL

O que esperar da Educação municipal de Florianópolis se aprovada a Nova Reforma Administrativa do governo Topázio? Ainda há espaço para gestão democrática nas Unidades Educativas?

Núcleo Resistência Sindical Florianópolis-SC*

O final do ano letivo de 2022 começa a aparecer no horizonte dos profissionais da educação municipal de Florianópolis, porém vem acompanhado de mais um ataque a gestão democrática nas unidades educativas. Trata-se do Projeto de Lei Complementar 1915/2022 entregue recentemente na Câmara de Vereadores e que dispõe sobre uma nova estrutura de governo.

Aumento nos gastos, retirada de direitos, são apenas algumas das intenções da nova Reforma Administrativa do Governo Topázio, já denunciadas pela direção de nosso sindicato1.

O conjunto de ataques é grande, mas trataremos nesse texto o que diz respeito ao ataque a educação municipal, desde a velha roupa nova da estrutura da secretaria e seus comissionados, até a nova forma de dividir os trabalhadores e trabalhadoras que hoje ocupam a função gratificada (FG) de direção de unidade educativa, pra já alertar os próximos que estão em processo “eleitoral” nas unidades.

Para contextualizar

Em ano de eleição constitucional, a rede municipal de Florianópolis também deveria passar por eleições diretas para direção das unidades educativas, porém quem é da rede sabe que as coisas deixaram de ser como eram.
Primeiro pelo fato da perda de autonomia e autoridade das direções até então eleitas, considerando que a atual legislação do município transformou a eleição direta de diretor/a em escolha do plano de gestão.

Se antes a unidade educativa construía coletivamente o plano de gestão e em cima do mesmo os candidatos elaboravam os seus planos de ação, hoje isso acabou. Agora a nova regra é que cada candidato (proponente nos termos novos) construa seu plano de gestão. Na prática, as unidades que conseguiram se organizar até elaboraram coletivamente o plano de gestão em razão de haver candidatura única. No entanto, em duas escolas e onze núcleos de educação infantil que possuem mais de um candidato, o plano de gestão é o plano do candidato, pois esse é o regramento atual, uma vez que não existe mais a etapa do plano de ação como ocorria até 2019.

Para além do fim do plano de ação, com a mudança na lei2 abriu-se a possibilidade de direções atuais, serem reeleitas sem limite. Com isso chegou ao fim o princípio de alternância do cargo, mais um ataque que compromete a gestão democrática nas escolas e neims da rede.

Por tantos motivos a direção do Sintrasem se retirou da comissão eleitoral, pois a mesma perdeu seu objetivo enquanto garantidora dos processos de democracia participativa nas unidades educativas.

A diretora e o diretor eleitos outrora têm ficado pelo caminho durante o último período, como já divulgados pelo sindicato3. Até agosto de 2022 restavam pouco mais de 60 diretores eleitos num universo de 120 unidades educativas da rede. Destas direções, muitos e muitas já acumulam adoecimentos e afastamentos superiores a 15 dias, como verificamos no diário oficial do município.

Mas parece que essa sobrecarga de trabalho não basta para o apetite arbitrário da secretaria municipal de educação. Foi preciso alterar a regra do processo eleitoral para ampliar o poderio do governo sobre as direções, limitando ainda mais a já frágil gestão democrática nas unidades.

É evidente, o número elevado de diretores e diretoras que já acumulam duas gestões consecutivas – ou mais, no caso de indicados para outras unidades após acumularem duas gestões em 2019, mas que seguirão como candidatos/as para dirigir as unidades até 2025.

Enquanto vai se perdendo a força coletiva desse setor, vai se estabelecendo a ideologia de que quem “aguenta” ficar no cargo “merece” permanecer. Jogando o jogo meritocrático da secretaria, quem perde é a população que vê na escola, no Neim, um espaço de produção do conhecimento e de garantia da cidadania, com respeito a democracia e o voto popular.

O brinde da Reforma Administrativa do Topázio

No último dia 16 de novembro, o governo encaminhou o PL 1915/2022, que apresenta uma nova estrutura para o secretariado municipal, além de aumentar os gastos com comissionados. Pra educação não faltaram ataques!

Atualmente a Secretaria Municipal de Educação (SME) possui 1052 cargos que recebem comissão ou função gratificada (FG) por serem consideradas funções de confiança do governo. Destes cargos, 139 são de “diretor de unidade educativa”, conforme a última lei aprovada em 20214.

Considerando que a direção de unidade educativa é a única FG de confiança não definida somente pelo governo, mas sim legitimada em processo eleitoral nas respectivas comunidades educativas, o governo sempre tem trabalho em manter este segmento alinhado aos seus interesses.

Portanto, ao retirar a direção de unidade educativa da conta, temos hoje 913 cargos de confiança exclusiva do governo, os quais custam aos cofres públicos R$ 223.656,87 por mês. Para 2023, com a reforma do governo aprovada, teremos 911 cargos de confiança exclusiva, porém o gasto mensal será de R$ 426.247,67, ou seja, um aumento de 90,58% com comissionados! Isso somente na Educação!

Vale o destaque em relação a uma mudança de paradigma no cálculo das FGs que atualmente possuem um valor fixo em lei, mas com a reforma aprovada terão valores calculados com base na fixação do valor do salário-mínimo. Ou seja, quando o governo Lula definir o novo salário-mínimo para classe trabalhadora brasileira, o governo Topázio beneficiará automaticamente os seus cargos de confiança, em vez de todo o serviço municipal.

Fato é que, não bastasse esse aumento no gasto com comissionados, a nova roupa da SME cria novos cargos de “Subsecretário”, claramente, como nas demais secretarias, para lotear cargos e negociar sua política para avançar na câmara municipal.

O aumento de poder para comissionados que serão responsáveis pela manutenção do acordo de empréstimo da SME com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) é mais uma demonstração da política de alinhamento do governo com interesses externos a nossa cidade.

Outra questão é o fim de setores da prefeitura como o departamento de bibliotecas escolares e de tecnologia, sem deixar claro como ficará a garantia de manutenção, controle e renovação dos acervos das bibliotecas, por exemplo.

A educação de jovens e adultos (EJA) que hoje possui coordenadores de núcleos que recebem uma gratificação chefia também serão prejudicados, pois a proposta da reforma acaba com a “gratificação de trabalho relevante” hoje usada para valorizar a função desempenhada. Nossa organização defende que os coordenadores de EJA sejam eleitos em conjunto com as direções das unidades educativas, ou ainda que seja formulada uma política de fortalecimento da EJA no sentido de garantir a gestão democrática também neste segmento.

Mas ao contrário, além do ataque previsto para coordenação da EJA, a função gratificada para diretor de unidade educativa também é alterada, sendo apresentada na reforma de forma dividida, criando três categorias de direção, uma para unidades de “pequeno porte”, outra para “médio porte” e outra para “grande porte”.

O detalhe é que não há na reforma sequer uma estratificação ou explicação de qual critério define uma unidade educativa como de pequeno, médio ou grande porte.

O que existe é um apontamento na quantidade de cargos, sendo 35 diretores que receberão como unidade de pequeno porte, 65 médio porte e 25 grande porte, totalizando 125 unidades educativas.

Cada uma dessas categorias terá um valor diferenciado. Pela lei em vigor, a função gratificada da direção de unidade educativa é R$ 1.708,045. Pela proposta do governo, os novos valores serão R$1.696,80 para pequeno porte, R$1.939,20 para médio porte e R$2.181,60 para grande porte, considerando o valor do Salário Mínimo vigente.

Se o total atual de gastos com as direções soma R$203.256,76, o novo gasto do governo será R$239.976,00, o que representa um aumento de 18,07%. Esse aumento pode ser considerado interessante, dada a desvalorização da função e o aumento constante da sobrecarga de trabalho, além das perdas inflacionárias de 2021/2022 somarem 20%, porém não pode ser considerado dando mais para uns do que para outros como explicaremos a seguir.

Mas qual é o problema em relação à divisão da gratificação para os diretores e diretoras?

A resposta a pergunta acima está no próprio enunciado: A divisão. A história nos mostra a eficiência em governar dividindo setores que unidos podem representar oposição organizada. A lição de Maquiavel é a máxima do governo Topázio, que na reforma administrativa também dividirá, no mesmo formato, a direção dos Centros de Saúde.

Mas para dialogar com toda a educação municipal e explicar porque não podemos legitimar essa divisão, a começar pelos próprios diretores e diretoras em exercício, bem como os futuros a partir de janeiro do próximo ano, basta entendermos o que é melhor para cada escola, para cada neim.

A portaria 657/20226, por exemplo, ao definir critérios para organização do quadro de vagas na educação municipal, aumenta a quantidade de servidoras e servidores, conforme o número de turmas por turno ou mesmo por número de estudantes. Ou seja, nenhum professor/a ganhará mais salário para atender mais que a quantidade de alunos por turma. Se tem mais alunos, então se abre nova turma e contrata mais professores/as. Nenhum/a supervisor/a ganhará mais se tiver que atuar numa escola com mais de 700 estudantes. Se esse for o caso, será contratado mais um/a supervisor/a, simples assim! Então porque a escola/Neim que tem mais estudantes não pode ter mais de um/a diretor/as ou cargos correlatos que dêem conta das necessidades de gestão de acordo com o número de estudantes ou de turmas?

É sabido que algumas unidades da rede municipal já possuem, na prática, uma pessoa a mais como se fosse um “vice-diretor”, para amenizar a carga do/a diretor/a. Então por que o governo, que entrega uma proposta de reforma administrativa não legaliza e qualifica esse processo? Até quando vai prevalecer a política da SME de fazer “gambiarras” na gestão das escolas?

É preciso sim valorizar a função da direção, inclusive economicamente. Mas isso não pode significar aceitar, ganhando mais, a precarização da função e a consequente diminuição da qualidade da educação pública municipal.

E, pra fechar com chave de ouro, ainda que não apareça na reforma administrativa, o governo Topázio quando questionado pela imprensa sobre o aumento de gastos com os comissionados, respondeu que não terá aumento porque encerrará a “ampliação de jornada para servidores em função gratificada”7.

Isso significa dizer que a maioria das direções dos NEIMs e algumas direções de escolas, hoje ocupadas por Auxiliares de Sala, cargo erroneamente considerado fora do magistério e que portanto, é de 30 horas, deixará de receber a ampliação de jornada para se dedicar 40 horas semanais como diretora/diretor.

Ainda que nossa defesa seja pela jornada de 30 horas semanais para todo o serviço público, com salário digno e boas condições de trabalho, é preciso reconhecer que na educação a jornada é de 40 horas. Sendo 40 horas, não há como uma diretora ou diretor trabalharem apenas 30 horas.

O fato é que 40 horas de jornada de trabalho para cada diretor e diretora da PMF hoje de longe não é suficiente, tamanha é a demanda e sobrecarga de trabalho. Um governo que preza pela educação deveria pensar a educação municipal ouvindo de fato seus servidores, sua base representativa que é o sindicato, ou mesmo as direções atuais das unidades educativas antes de propor políticas que, nesse momento, se aprovadas, apontam ainda mais a precarização do trabalho e o fim da gestão democrática na escola pública!

Basta de hipocrisia!

A educação municipal quer qualidade de verdade, o que significa cumprir o acordo coletivo e reunir a comissão para avançar no pagamento da dívida com o magistério e descompactar nossa tabela hoje achatada! É pagar mais uma parcela da implementação do plano de carreira do quadro civil, o que beneficia diretamente os/as auxiliares de sala, obrigação firmada em lei e no acordo coletivo, considerando estarmos com as contas muito abaixo da lei de responsabilidade fiscal.

O prefeito Topázio é mais um inimigo da educação ao manter a política de sucateamento deixada por seu antecessor Gean, avançando ainda mais nos ataques ao serviço público e na desvalorização das servidoras e servidores que efetivamente lutam dia a dia para prestar um bom serviço à população.

Mas, enquanto houver servidoras e servidores públicos, concursados, lutando em defesa da educação, haverá sim espaço de resistência para fomentar a gestão democrática nas unidades de nossa rede municipal.

Quem tem compromisso com educação pública, laica, socialmente referenciada e de qualidade, não aceitará mais esse ataque!

2 O novo decreto tem caráter permanente e ataca diretamente a história de eleição direta para direção das escolas e núcleos de educação infantil de Florianópolis que existia a mais de trinta anos. https://www.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/17_08_2022_12.29.39.11dae3192ebd50f7eb1230911b6a37be.pdf

3 http://www.sintrasem.org.br/Default/Noticia/27775/prefeitura-ataca-a-eleicao-de-diretores-das-escolas-e-neims

4 https://leismunicipais.com.br/a/sc/f/florianopolis/lei-complementar/2021/70/706/lei-complementar-n-706-2021-estabelece-direitos-iguais-a-todos-os-servidores-e-empregados-da-administracao-publica-municipal-direta-indireta-autarquica-e-fundacional-atualiza-a-estrutura-organizacional-altera-as-leis-complementares-n-5002014-574-2016-606-2017-189-2005-618-2017-310-2007-034-1999-063-2003-e-as-leis-1-494-1977-4-645-1995-8-130-2010-e-da-outras-providencias

5 https://leismunicipais.com.br/a/sc/f/florianopolis/lei-complementar/2021/70/706/lei-complementar-n-706-2021-estabelece-direitos-iguais-a-todos-os-servidores-e-empregados-da-administracao-publica-municipal-direta-indireta-autarquica-e-fundacional-atualiza-a-estrutura-organizacional-altera-as-leis-complementares-n-5002014-574-2016-606-2017-189-2005-618-2017-310-2007-034-1999-063-2003-e-as-leis-1-494-1977-4-645-1995-8-130-2010-e-da-outras-providencias

6 https://www.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/21_10_2022_15.00.59.d3f0055ff1966b7913d3ecbd83163389.pdf

 

*Núcleo Resistência Sindical Florianópolis

Claudia Schiara de Medeiros Santos

Eduarda da Silva

Janaina Enck

Jessica Maria Policarpo

Marcos Cordeiro Bueno (Canguru)

Virgínia Maria Muniz