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Colunas

Sobre a ausência de grandes mobilizações à esquerda

Manifestação 10 de setembro
Elineudo Meira/ Brasil de Fato

Gabriel Casoni

Gabriel Casoni, de São Paulo (SP), é professor de sociologia, mestre em História Econômica pela USP e faz parte da coordenação nacional da Resistência, corrente interna do PSOL.

Há uma interessante discussão entre ativistas sobre o potencial de mobilização de rua da esquerda nesse momento. A ausência de grandes manifestações é resultado da indisposição das pessoas que rejeitam Bolsonaro (a maioria da população) de se mobilizarem ou da falta de convocação e construção por parte das principais direções desse campo político, como Lula e o PT?

No que se refere ao bolsonarismo, observamos, no 07 de setembro, que há disposição à mobilização de seus seguidores e também existem a decisão e o empenho de Bolsonaro de convocar e convencer sua base a ir às ruas — tudo feito como muita prioridade, antecedência e preparação. Mas, e no caso da esquerda?

Existem dois erros fatais que podem levar a um enfoque unilateral na resposta. O primeiro é o de não considerar os fatores objetivos que estão dificultando a existência de grandes mobilizações de massas à esquerda nesse momento.

Nem tudo é culpa das direções e lideranças políticas. Há o cansaço provocado por anos de inúmeras derrotas e retrocessos vividos no Brasil. Além disso, existe a expectativa de uma vitória eleitoral do Lula sem a necessidade de enfrentamento direto nas ruas, uma vez que ele lidera todas as pesquisas. Há também o medo da violência política patrocinada pelo bolsonarismo.

Todos esses fatores objetivos importam, inegavelmente. Mas também pesa a política das direções da esquerda, sobretudo das que têm mais influência. Afinal, nem tudo é culpa das dificuldades da realidade. As lideranças políticas interagem com as condições objetivas reforçando ou sendo um contra-peso a certas tendências (positivas e negativas) da realidade. Por exemplo, até aqui, a direção da campanha de Lula não apostou numa forte campanha de rua. É evidente que se trata de uma linha que reforça a expectativa passiva de vitória eleitoral nas urnas, sem a necessidade de grandes mobilizações.

Para não ser injusto, vale reconhecer que existe a construção dos comícios de Lula, que estão reunindo dezenas de milhares por onde passa (o que demonstra potencial positivo de adesão de público). Mas a iniciativa política do comando da campanha está se restringindo a isso. Não há a decisão de construir um processo mais amplo de mobilização para uma forte campanha-movimento. Se Lula e o conjunto das lideranças políticas que o apoia estivessem engajados com prioridade na construção dessa mobilização ampla, explicando às pessoas a importância da ação nas ruas nesse momento histórico, certamente isso impactaria a consciência dos setores mais avançados da classe trabalhadora e da juventude, se revertendo em maior capacidade de mobilização, ainda que limitada pelas condições objetivas adversas.

Portanto, vemos que o objetivo (as condições gerais da realidade social e política) e o subjetivo (a política das principais lideranças e direções políticas) interagem entre si e se determinam reciprocamente. A desconsideração dos fatores objetivos (correlação de forças e nível médio de consciência) produz uma leitura que superestima o papel das direções políticas. Esse é um erro comum nas organizações de ultra-esquerda, que ficam denunciando, sempre e escandalosamente, as traições das direções.

Faltam vinte dias para a eleição. Se a direção da campanha Lula mudar a linha e apostar numa reta final com forte campanha de rua e intensa denúncia de Bolsonaro, para mobilizar o máximo possível de pessoas na batalha pelo voto, será possível buscar a vitória em primeiro turno, ainda que não seja fácil. A ida de Bolsonaro ao segundo turno deixará tudo mais difícil e perigoso. É hora de máxima atenção e mobilização!

Por outro lado, o apagamento (ou diminuição) da responsabilidade das lideranças políticas, especialmente em momentos de grande intensidade da disputa política pela consciência das massas, como o período eleitoral que vivemos, fabrica uma análise objetivista e fatalista, que comumente serve às teses oportunistas, que vaticinam que a culpa é — sempre e exclusivamente — dos limites da correlação de forças, ou numa versão mais grosseira, que a culpa é do atraso da classe trabalhadora, da mansidão do povo.

Faltam vinte dias para a eleição. Se a direção da campanha Lula mudar a linha e apostar numa reta final com forte campanha de rua e intensa denúncia de Bolsonaro, para mobilizar o máximo possível de pessoas na batalha pelo voto, será possível buscar a vitória em primeiro turno, ainda que não seja fácil. A ida de Bolsonaro ao segundo turno deixará tudo mais difícil e perigoso. É hora de máxima atenção e mobilização!