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Racha do agronegócio nas eleições de 2022?

Agencia Brasil

Andar de cima

Acompanhamento sistemático da ação organizativa, política, social e ideológica das classes dominantes no Brasil, a partir de uma leitura marxista e gramsciana realizada no GTO, sob coordenação de Virgínia Fontes. Coluna organizada por Rejane Hoeveler.

Por Pedro Cassiano

Lula confirmou seu apoio à candidatura do ruralista Neri Geller (Partido Progressista-PP) para o senado federal pelo Estado do Mato Grosso. Geller não é qualquer político, ele comandou a pasta da agricultura no governo Dilma Rousseff e, atualmente, ocupa a vice-presidência da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Mas o presidente da FPA, Sérgio Souza (MDB-PR), afirmou que a maioria da Frente está apoiando a reeleição de Jair Bolsonaro1. Isso significa um racha do agronegócio?

O agronegócio é um dos principais setores da economia e detém a liderança de diversos produtos na pauta de exportação do Brasil com a soja, o milho e carne bovina. Sua força também é proveniente de sua articulação e organicidade no Congresso Nacional onde tem a bancada ruralista oficialmente organizada na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). A frente realiza um primoroso levantamento, acompanhamento e avaliação de diversas pautas em tramitação no Congresso, cria projetos de lei apresentados pelos seus membros, além de realizar relatórios e encontros sobre os principais temas de seu interesse, como o meio ambiente, questão indígena crédito subsidiado e acordos comerciais com a China – principal país importador de produtos do agronegócio brasileiro.

Nesse cenário de disputa do palanque do agronegócio, o presidente Jair Bolsonaro sai na frente. Seu governo é um dos maiores entreguistas das pautas do agronegócio e ainda um dos maiores governos de repressão e desmonte de órgãos públicos que incomodam o setor como a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e diversos órgãos do Ministério do Meio Ambiente (MMA), sobretudo as instâncias de fiscalização ambiental. O discurso de criminalização de movimentos sociais rurais, principalmente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) também agrada os ruralistas. Além disso, a alta do dólar ajudou no lucro dos exportadores da agropecuária e seus derivados, pois os pagamentos são em moeda americana.

Tereza Cristina, membro e ex-presidente da FPA, se manteve como Ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) durante todo o governo Bolsonaro, deixando o cargo apenas recentemente para concorrer ao senado federal, 2 Sua posição é sintomática da relação entre FPA, o Legislativo e governo de Bolsonaro. No lugar de Cristina, quem assumiu o MAPA foi Marcos Montes Cordeiro do Partido Social Democrático (PSD), que era secretário-executivo da pasta. Cordeiro já foi prefeito da cidade de Uberaba, capital da Associação Brasileira do Gado Zebu (ABCZ)3, do qual é membro. Isso reforça a aliança de Bolsonaro e a permanência do apoio de setores do agronegócio em torno de sua candidatura. João Martins, ruralista baiano e presidente da Confederação Nacional da Agropecuária (CNA), apoiou recentemente a reeleição de Bolsonaro em detrimento de Lula4 e reforçou o pedido do setor para lançar e apoiar candidaturas às cadeiras no legislativo. A fala foi na abertura do Encontro Nacional do Agro promovida pela própria CNA, tendo a presença de Bolsonaro e alguns ministros de seu governo. Claramente esse foi um palanque para sua candidatura5. A CNA é o sindicato patronal oficial dos ruralistas e é uma entidade protagonista na disputa pela liderança do empresariado rural e do agronegócio.

Porém, além do apoio de Neri Geller a Lula, observamos também algumas assinaturas da carta pela democracia podem significar algumas baixas do agronegócio ao apoio de Bolsonaro. São expressivas as adesões da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abioave) e de Blairo Maggi, um dos maiores plantadores de soja do mundo e ex-ministro da Agricultura do governo Michel Temer. Maggi é do Mato Grosso, mesmo estado de Neri Geller. O ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), entidade paulista tradicional, Pedro de Camargo Neto também colocou sua assinatura6. A carta não chega a ser um apoio ao Lula, mas demonstra algumas fissuras estabelecidas no setor.

Uma análise mais aprofundada das dinâmicas do agronegócio pode ajudar nessa análise. Blairo Maggi, por exemplo, exporta soja, mas também óleo de soja, que passa por um processo de industrialização e coloca outros interesses que não estão diretamente ligados à agropecuária, envolvendo o desenvolvimento industrial com importação de maquinaria e captação de crédito. Este setor sofreu impactos de retração no governo Bolsonaro que lançou somente agora em julho um pacote de medidas para tentar beneficiá-lo7.

Entendemos que os desembarques do palanque de Bolsonaro e a aproximação a Lula por parte de importantes personalidades do agronegócio uma aproximação da campanha de Lula são movimentos significativos, mas ainda pequenos se comparados aos gritos do presidente da FPA e da CNA, e da manutenção de importantes figuras do setor no MAPA. Mesmo assim, as campanhas continuarão disputando esse palanque fundamental tanto nas eleições quanto no próprio apoio do futuro governo do vencedor no Congresso Nacional.

Notas:
1 https://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:ti1csMVAqqUJ:https://valor.globo.com/politica/noticia/2022/08/10/frente-ruralista-reforca-apoio-a-bolsonaro.ghtml&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br . Acesso em 10 de agosto de 2022.
2 https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/03/4997274-de-olho-no-senado-tereza-cristina-deixa-ministerio-da-agricultura.html. Acesso em 10 de agosto de 2022.
3 https://www.abcz.org.br/noticias/noticia/28263/abcz-participa-da-cerimonia-de-transmissao-de-cargo-do-novo-ministro-da-agricultura–pecuaria-e-abastecimento–mapa. Acesso em 10 de agosto de 2022.
4 https://www.antena1.com.br/noticias/presidente-da-cna-diz-que-nao-ha-espaco-para-candidato-processado-e-preso. Acesso em 10 de agosto de 2022.
5 https://cnabrasil.org.br/noticias/presidente-da-cna-diz-que-esta-em-nossas-maos-fazer-um-pais-melhor. Acesso em 10 de agosto de 2022.
6 https://www.moneytimes.com.br/carta-pela-democracia-saia-justa-do-agronegocio-dividido-e-clara-entre-assinaturas-e-ausencia/. Acesso em 10 de agosto de 2022.