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CULTURA

Mirador: um filme sobre os construtores do Brasil

Por Lucas Scaldaferri, de Porto Alegre-RS
Foto: Divulgação

Em um país onde o subemprego se transformou em regra para que a superexploração seja uma chaga do nosso modelo capitalista, a história de Maycon, interpretado por Edilson Silva, é apenas mais uma, mas ela é contada em “Mirador”, filme de Bruno Costa.

Jovem pernambucano que vai morar no Paraná, Maycon é um batalhador. Gosto dessa expressão para explicar a saga de quem não tem a proteção de direitos trabalhistas, mas que luta pelo pão de cada dia. Ele é um lutador de boxe, carregador de caminhão e lavador de pratos. Não chega a formar família, mas tem uma filha de quase 2 anos, a Maju.

O mito segundo o qual o trabalho atual dignifica as pessoas só está seguro no evangelho e na cartilha de trabalho decente da Organização Internacional do Trabalho. O trabalho aqui embrutece, aliena e entristece. É uma verdadeira máquina de humilhação e de destruição do que nos faz humanos. Maicon encarna a maioria dos batalhadores brasileiros com altas jornadas e baixa remuneração, que vivem no limite da reprodução para manter a cadeia de exploração.

Quando Maycon passa a cuidar sozinho de Maju as coisas se complicam. Numa incrível inversão da realidade, vemos uma espécie de pai solo praticamente sem rede de apoio e sem a eficiência de políticas públicas. Sua cria precisa acompanhar sua jornada e passa a frequentar a academia e até mesmo o restaurante. Mas é também onde o filme entrega humanidade. O carinho e o cuidado passam também a marcar um homem endurecido pela vida. Tem uma cena belíssima onde Maycon coloca Maju para dormir cantarolando uma cantiga de sua terra natal. Outro momento marcante, e digno de premiação, é a brincadeira na pequena banheira plástica na hora do banho. O diálogo entre o pai e seu bebê foi repleto de vida e amor, parando por um momento a máquina de moer dignidade.

A beleza do filme é mostrar a sobrevida do precariado brasileiro. Tudo é precário. A alimentação, a moradia, o trabalho. Quase tudo está à venda como força de trabalho. Mas a sua marca é a honestidade, é o compromisso ético de um verdadeiro “Zé Batalha” construtor do Brasil. Vejam “Mirador”.