No início do semestre e ao longo dos próximos meses, boa parte das universidades brasileiras retornarão ao regime majoritariamente presencial, após dois anos de trabalhos remotos ou híbridos.
Em primeiro lugar é importante sempre salientar que – ao contrário do que dizem os veículos de fake news bolsonaristas – as universidades públicas não estiveram fechadas. Durante esses anos, e apesar das dificuldades de aprendizado em regime remoto, vários professores se empenharam em adaptar suas aulas para que esse momento excepcional fosse mais produtivo. Vários pesquisadores – professores e estudantes, boa parte sem muitos auxílios financeiros – desenvolveram importantes pesquisas para a ciência brasileira. Parte delas nos ajudaram, inclusive, a passar pela crise da Covid-19, que enfrentamos coletando dados de propagação do vírus, fazendo estudos sobre as novas variantes, compreendendo o impacto social da doença e produzindo vacinas.
Dessa forma, fica cada vez mais nítido, que – na contramão do que diz o Presidente – as universidades, sobretudo as públicas, produzem um conhecimento fundamental para toda a sociedade. Nossa tarefa é fazer com que elas sejam cada vez mais para o nosso povo!
Dois anos de regime remoto-híbrido – como estão as universidades públicas?
Muito antes da pandemia, já vivíamos um contexto de cortes orçamentários objetivando o sucateamento da educação pública. Desde o golpe de 2016 e a aprovação da EC 95, a ofensiva do capital, vestida de “responsabilidade fiscal”, tem cada vez mais retirado a capacidade de investimento das instituições públicas no país, e consequentemente, tornado a entrada e permanência dos mais pobres ainda mais difícil.
Como aponta uma pesquisa do Inep, desde 2016 o número de pessoas classificadas como de baixa renda nas universidades públicas está estagnado. Desde que Bolsonaro assumiu o poder, o contingenciamento de parte significativa dos repasses para as universidades federais foi muito expressivo, a ponto de reitores virem a público anunciar que as universidades teriam que fechar as portas caso não houvesse novos repasses.
Para falarmos apenas nas verbas destinadas à pesquisa, que são oriundas do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, o corte em 2021 foi de mais de 90% na verba do CNPq. O que vemos em várias universidades hoje, depois de muitos ataques, é o sucateamento, a dificuldade de lidar com um orçamento muito apertado – que mal cabe nas contas regulares – e uma redução brutal nas políticas de auxílio e assistência estudantil.
Soma-se também a isso, a cruzada ideológica que Bolsonaro e seu batalhão de choque fazem contra a educação pública e o pensamento crítico. Não só desprezam e sistematicamente atuam para destruir as universidades, como também passam por cima de conhecimentos científicos e ritos democráticos, anulando completamente a autonomia universitária. Em 2021, já haviam 20 instituições federais administradas por interventores não eleitos.
Nas universidades estaduais, que cumprem o papel de interiorização do ensino superior público nos estados, ainda que o repasse de orçamentos venham dos governos locais, as políticas de ataque a nível federal impactam diretamente. Os exemplos vão desde a falta de repasse de programas como o PNAEST, ou mesmo os cortes de bolsas e ataques diretos a programas da CAPES como PIBID e Residência Pedagógica. Por isso, universidades estaduais e federais devem andar de mãos dadas em defesa da educação pública e pelo Fora Bolsonaro.
Bolsonaro é o maior inimigo da Educação. Nossa tarefa número um é derrotá-lo.
Para estancar a crise que assola hoje a educação pública em nosso país, é central a retirada do poder das mãos de Jair Bolsonaro. Essa é a primeira tarefa – a mais importante – que qualquer pessoa que defenda a educação e o ensino público deve se empenhar. Nesse retorno presencial, acreditamos que o Movimento Estudantil Universitário pode cumprir um papel muito importante nessa tarefa.
Mesmo com muitas dificuldades, fruto da dinâmica remota, vimos a juventude ser vanguarda nos processos de mobilização em todo país, que contribuíram muito para o desgaste da popularidade do presidente. Agora, com o retorno, não iremos assistir de braços cruzados a destruição de nosso futuro que é materializada no sucateamento das universidades e ataques à ciência.
Nossa luta é para que cada DCE, DA, Centro Acadêmico, coletivo de juventude, busque atuar e engajar ao máximo suas bases nos cursos para iniciativas e atividades políticas. Transformar a universidade em um espaço de debate, elaboração e mobilização permanente contra os desmandos do Planalto.
É necessário dar muita centralidade na luta pela permanência estudantil, por mais bolsas de auxílio moradia, alimentação e pelo retorno das residências e restaurantes universitários. A crise social e econômica atinge diretamente o conjunto dos estudantes, sobretudo os negros e negras. Após dois anos de pandemia, os riscos da evasão estudantil são reais. Se queremos uma universidade enegrecida, popular e com a cara de povo, a luta pela permanência deve perpassar todas as nossas iniciativas, ainda mais nesse ano, em que se comemoram dez anos da Lei de Cotas.
Essa é uma grande oportunidade, inclusive, para propormos um debate em nossos locais de atuação sobre a política de cotas, acesso e permanência de estudantes negros, indígenas e pessoas trans, buscando organizar o ME contra a ofensiva ideológica conservadora, que quer excluir esses sujeitos da universidade pública.
Não devemos perder de vista também que no ano de 2022 acontecerão as eleições presidenciais, e ainda que lutemos com todas as forças para que Bolsonaro caia o quanto antes, acreditamos que a correlação de força social que está posta hoje, infelizmente, torna essa tarefa muito difícil antes do pleito eleitoral.
Nós do Afronte defendemos a tática de Frente de Esquerda com Lula presidente e construímos a campanha #LulaSimAlckminNão. Obviamente os espaços do ME, pelo seu alto grau de politização, não passarão ao largo dessa discussão. Respeitamos aquelas organizações que optarem por apresentar candidaturas próprias nesse momento, porém acreditamos ser um erro tático em uma conjuntura decisiva para a história brasileira, cuja unidade da esquerda e dos setores democráticos podem representar uma derrota acachapante à extrema direita.
Nesse momento, a pré-candidatura de Lula movimenta a esperança de milhões por capitalizar os sentimentos da massa e da vanguarda que compreendem a centralidade da tarefa de derrotar o governo Bolsonaro. Isso não significa que não iremos polemizar com a política de alianças da direção petista e seu programa reformista. Ao contrário, fazemos isso desde já com campanhas, iniciativas, e a defesa de um programa que reverta os retrocessos sociais dos últimos anos e aponte uma nova perspectiva de futuro, sem aliança com inimigos de classe.
A luta nas ruas em 2022 será imprescindível
A Frente Nacional Fora Bolsonaro convocou no último sábado, 9 de abril, um ato nacional unitário, aos moldes das mobilizações que protagonizamos no ano passado. Em todo país, a esquerda, os movimentos sociais, os trabalhadores e a juventude, foram novamente às ruas pra dizer que não suportamos mais o desmonte desse país!
Esse primeiro ato foi muito importante, mas eles precisam seguir acontecendo, cada vez com mais povo na rua. Por mais que seja fundamental a derrota do governo Bolsonaro nas eleições, a história nos mostra que só é possível derrotar por completo o fascismo nas ruas. Acreditamos que para derrotar Bolsonaro precisaremos de um grande movimento de massas, que virá também das universidades.
Nessas eleições, queremos realizar comitês de mobilização, atividades programáticas e construir frentes unitárias que planejem ações comuns e disputem a população para fora dos muros da universidade. Precisamos resgatar e ampliar o sentimento de vira voto de 2018, para que desde já, possamos organizar pessoas e transformar esse sentimento de esperança em um plano de ação pra virar o jogo.
Devemos aproveitar essa oportunidade para sacudir as universidades e convocar os estudantes às ruas para participar dos atos. O trabalho de base que é tradição no movimento estudantil precisa ser resgatado agora que estamos retornando presencialmente, com olho no olho. Os CAs, DAs e DCEs podem organizar passagens em aulas, panfletaços e construir iniciativas de blocos estudantis, que também podem ser combinadas com servidores federais, que estão em mobilização rumo a uma greve nacional.
Construir grandes mobilizações, junto com os estudantes, pode ser aquela injeção de ânimo nas entidades para começar o retorno com força total e poder de mobilização. Essa movimentação pode ser a faísca necessária para impulsionar um ano de lutas, onde mais uma vez o movimento estudantil e as universidades cumprirão o papel de vanguarda na defesa da democracia.
*Carol Leal – 3ª vice presidente da UNE;
Marina Amaral – Coord. geral do DCE da UNEB;
Vitor Santos – Mestrando em história na UFSC e militante do Afronte!
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