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BRASIL

Por uma frente de esquerda para governar o Ceará

Por Bruno Rodrigues* e Rebeca Veloso**, de Fortaleza-CE

Inevitavelmente, o ano de 2022 está sendo visto por muitas pessoas como o último ano do governo Bolsonaro. Depois de toda a tragédia que temos vivido, a possibilidade de virar a página deste governo e reconstruir o Brasil de fato representa um sopro de alívio para milhões de pessoas. No Ceará, em particular, temos razões de sobra para odiar o governo Bolsonaro e lutar pelo seu fim.

Afinal, os efeitos da sua política econômica em nosso estado não são pequenos. O Ceará, que é o 17° no ranking de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país, é o 7° Estado com mais famílias em situação de insegurança alimentar no Brasil. Em nosso estado a fome já é uma realidade concreta vivenciada em mais de 1 milhão de domicílios em todo território cearense. Não por acaso foram feitas justamente em nossa capital as imagens de pessoas em busca de comida em um caminhão de lixo. Na outra ponta, segundo a mais recente lista da revista Forbes, somos o 6° estado do país em número de bilionários, sendo 17 ao todo. Um retrato de que a profunda crise social vem inevitavelmente acompanhada de um vertiginoso crescimento na concentração de renda.

Qualquer trabalhadora ou trabalhador, qualquer jovem da periferia ou qualquer pequeno agricultor sabe: a vida piorou em nosso estado. Estamos pagando a fatura das ações do desgoverno genocida de Bolsonaro, principal responsável por esse caos. Mas o governo do Estado, e também as prefeituras, têm sua parcela de responsabilidade, pois se não adotaram a agenda do negacionismo, tomaram medidas que foram insuficientes para evitar que a combinação de crise sanitária e econômica não desaguasse numa crise social de proporções dramáticas.

Ainda segundo os dados do IBGE, iniciamos esse semestre com uma taxa de desemprego chegando a 15%, assim, ao todo mais de 560 mil cearenses estão sem nenhum tipo de trabalho. A renda real dos trabalhadores também caiu 14,1% em comparação com o mesmo período do ano passado. Soma-se a essa situação uma inflação galopante que atinge em cheio os mais pobres. A cesta básica em Fortaleza, que já era a mais cara do nordeste, voltou a subir, chegando a R$580,36 no mês de novembro de 2021.

No tema da política de segurança pública do governo estadual, são alarmantes os dados recentemente divulgados pelo Observatório da Segurança, que atestam que 87% de todas as pessoas mortas em operações policiais em território estadual são de pessoas negras. Na capital, esse número chega a 100%. Ao mesmo tempo, em nosso estado, pessoas negras têm 87% mais chances de morrer pela polícia do que não-negros [1].

Esmagar o bolsonarismo no Ceará

Foto: Reprodução/Facebook
Bolsonaro segura imagem de Wagner, em pedido de apoio à sua candidatura à prefeitura de Fortaleza.

Ademais, a esquerda cearense tem em suas mãos um imenso e nada fácil desafio ao longo deste ano: impedir a chegada de capitão Wagner, principal representante de Bolsonaro no Ceará, ao palácio da Abolição. 

É perfeitamente cabível debater se a figura de Wagner é ou não a personificação do fascismo em terras cearenses. Contudo, o que de fato importa é que, para todos os efeitos, Wagner é a figura que personifica as ideias do bolsonarismo em nosso estado e a que tem melhores condições de coesionar a extrema direita em torno de si, como já demonstrou inúmeras outras vezes.

Wagner fez carreira na polícia militar do Ceará, tendo liderado os motins policiais de 2012 e articulado o motim policial de 2020. No segundo turno das eleições de 2020, alcançou 426.803 votos, apenas 30.000 votos a menos que o atual prefeito eleito, José Sarto-PDT, no qual o PSOL chamou voto crítico.

Hoje, como deputado federal, é parte da tropa de choque de Bolsonaro no Congresso Nacional. Não por acaso Wagner votou a favor do pacote anti-crime do ex-ministro Sérgio Moro, a favor da PEC do voto impresso, felizmente rejeitada, e contra a manutenção da prisão do deputado golpista, Daniel Silveira. Como defensor do militarismo, do punitivismo penal e da liberação do porte de armas, Wagner também votou favorável ao PL 3715 de 2019, que permite a posse de armas em toda a extensão de propriedades rurais.

Seguramente, vencer a candidatura do Capitão Wagner será um de nossos máximos desafios. Wagner arrastará atrás de si os votos da extrema direita sobretudo em razão dos temas que envolvem a segurança pública e combate à corrupção. Em que pese a divisão entre Bolsonaro e Moro, Wagner é ainda o candidato com melhores condições nesse sentido. Em que pese também a expulsão do quadro da PMCE de muitas lideranças que atuavam ao seu redor, com o cabo Sabino, seria incorrer em ingenuidade acreditar que esse segmento ficará politicamente irrelevante. Para ficar em um exemplo nesse sentido, Wagner recentemente venceu a disputa interna contra o empresário de ônibus, Chiquinho Feitosa, pela liderança da União Brasil, partido fundado a partir do DEM e do PSL, que terá “o maior tempo da propaganda de rádio e televisão e o maior fundo eleitoral entre todas as siglas registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”[2].

PDT e os Ferreira Gomes não são alternativa

Cid Gomes, Salmito Filho, Ciro Gomes e Sarto

O PDT hoje comanda 67 prefeituras, incluindo a capital, e influencia diretamente o governo do estado, através da família Ferreira Gomes. É neste marco que o atual governador, Camilo Santana, constrói sua candidatura ao senado.

Ainda que tenha adotado medidas importantes no contexto da pandemia, o PDT no Ceará ainda aposta em um modelo falido de segurança pública, com mais encarceramento da juventude pobre e negra e mais investimento em aparato de repressão; é contraditório com a luta mundial do séc XXI de enfrentamento às mudanças climáticas ao primar pela manutenção de investimentos robustos no complexo do Pecém, transformando o Ceará em um quintal da mineração extrativista (o setor quer explorar 30% do nosso território) e comprometendo a saúde da população; na educação, falta investimento, mesmo após uma pandemia que alerta para a necessidade da mudança das estruturas das escolas e universidades, e sobra precarização aos trabalhadores e trabalhadoras.

Na capital, o prefeito José Sarto governa reprimindo os ambulantes da rua José Avelino, enquanto cede sem muita cerimônia às pressões dos setores conservadores e anti-vax, contrários à adoção do passaporte da vacina na cidade. No começo desse ano, também cedeu à pressão dos magnatas do transporte local para aumentar a passagem de ônibus e ainda implementou uma tarifa sobre o recolhimento do lixo urbano, justamente em um momento de carestia e endividamento pelo qual passa o nosso povo.

Por uma frente de esquerda, popular e combativa para governar o Ceará

Está na hora de mudar radicalmente a atual política de segurança pública, punitivista e assassina, que faz eco à política de bolsonaro; está na hora de um grande plano de proteção ao meio ambiente em nosso estado; está na hora de uma política de valorização dos professores, em particular aqueles que trabalham de forma precarizada, em contratos por tempo determinado; está na hora de uma política de combate às opressões, para que nosso estado saia da lamentável estatística de segundo lugar no ranking nacional de assassinatos de pessoas trans; está na hora de um grande plano de valorização das universidades estaduais.

E para essa tarefa, reconhecemos humildemente que o PSOL sozinho não será capaz de conquistar todas as mentes e corações que desejam mudança. Todas essas razões aqui descritas devem colocar o conjunto dos ativistas e militantes sociais cearenses, e particularmente as lideranças dos partidos de esquerda, com ou sem representação parlamentar (ou seja, PT, PSOL, PCdoB, UP, PCB e PSTU), a refletir sobre a indispensável e urgente construção de uma alternativa para governar o Ceará que, para ser consequente, tem que ser de esquerda, popular e socialista.

Assim, somos solidários com aqueles e aquelas militantes do PT-CE que lutam por um programa de esquerda e que disputam no interior do partido por uma candidatura estadual independente e de oposição aos Ferreira Gomes, pois de fato será preciso garantir em nosso estado um palanque forte e militante para a candidatura de Lula à presidência da república. Apesar de todas as críticas que temos aos governos petistas em nível local e de sermos oposição ao governo Camilo Santana na Assembleia Legislativa, defendemos a necessidade da esquerda cearense lutar unida para enfraquecer o coronelismo político-eleitoral dos Ferreira Gomes, barrar a candidatura do Capitão Wagner, derrotar a extrema-direita e governar para o povo pobre e trabalhador. Assim como é preciso lutar para influenciar com política real e consequente as vanguardas das lutas, que se organizam nos movimentos sociais, bem como as camadas populares mais pobres da sociedade cearense.

NOTAS</a

[1] RELATORIO PELE-ALVO: A COR DA VIOLÊNCIA POLICIAL: https://bit.ly/33vwaOq 

[2] Encontro de Bivar com Chiquinho Feitosa e Capitão Wagner decide, nesta segunda-feira, comando do ‘União Brasil’ no Ceará: https://bit.ly/3dq9tg3

 

* Bruno Rodrigues é membro do Diretório Estadual do PSOL-CE e militante da Resistência-PSOL.

Instagram: @brn_rdgs Twitter: brnrdgs_psol50;

** Rebeca Veloso é membro da Executiva Estadual do PSOL e militante da Resistência-PSOL.