Nesta quarta-feira, 15, os sete vereadores que compõem a Mesa Diretora da Câmara Municipal de São Gonçalo (RJ) protocolaram uma representação contra os vereadores Prof. Josemar (PSOL) e Romário Régis (PCdoB), por quebra de decoro parlamentar. O documento acusa os dois de terem cometido “atos incompatíveis com o exercício do mandato parlamentar”, na sessão do dia anterior, 14, que aprovou, com apenas 4 votos contrários, o projeto de lei 045/2021, sob protestos de dezenas de professoras(es) nas galerias da casa e pelas redes sociais.
Os dois irão responder na Comissão de Ética da Casa, em fevereiro, após o recesso parlamentar. A acusação refere-se ao apoio dado pelos vereadores aos educadores, que estavam sendo impedidos de entrar na Câmara para acompanhar a votação de um projeto de lei que alterou o seu Plano de Cargos e Salários. “Os professores encararam a votação como um golpe e estavam certos. O texto foi colocado para ser votado em Plenário de um dia para o outro, em regime de urgência, sem audiências, sem passar por comissões, sem nada. E a proposta destrói o Plano de Cargos, acaba com progressões e vários direitos que existem. Uma crueldade com uma categoria que já recebe um piso salarial baixíssimo”, conta Josemar.
No dia 14, a presidência da Câmara determinou, sem nenhum comunicado oficial, que apenas 30 pessoas poderiam acompanhar a votação no interior da Casa, número muito inferior à capacidade do local e ao que que se pratica em outros eventos. Do lado de fora, ocorria um ato público promovido pelo SEPE, e Josemar e Romário atuaram para que os educadores pudessem entrar, inclusive se contrapondo a ação de guardas municipais que buscavam impedir a entrada.
A representação afirma que eles usaram suas digitais para permitir o acesso “acima do permitido” e teriam “insuflado” as pessoas. “Esse processo é um absurdo. Estamos lá para apoiar os professores. O problema é que isso antes não existia. A Câmara não estava acostumada a ter esse tipo de oposição, firme”, avalia Josemar. Romário Régis, em nota oficial, também se demonstrou surpreso com a denúncia. “Apesar da surpresa, entendo a possibilidade de sanção como um elogio para o meu mandato. Ser encaminhado para a comissão de ética por apoiar os professores na entrada da Câmara não será sanção, será uma honra.”
Mandatos ameaçados
A representação foi tomada como um ataque por parte dos mandatos e de forças de esquerda e democráticas. Em nota, Márcio Ornelas, presidente do PSOL São Gonçalo, denuncia o risco de cassação e afirma ter a certeza de que “se trata de uma evidente tentativa de nos silenciar enquanto oposição, perseguição política e intimidação que não aceitaremos em hipótese nenhuma.” Ornelas afirma que os vereadores agiram de forma exemplar e destacou que a Câmara não tem tradição democrática de lidar com pensamentos divergentes. Também destacou a contradição de processarem os dois parlamentares por quebra de decoro, em uma Casa onde “é comum parlamentares e assessores andarem armados pelos corredores, ofensas e ameaças serem proferidas nas tribunas, até a violência física já chegou a acontecer”.
A reação foi imediata, com notas e mensagens de apoio aos vereadores nas redes sociais, e manifestações de partidos e entidades. Não é para menos. Trata-se de um ataque a dois parlamentares negros, que atuam em uma cidade governada por um policial, Capitão Nelson, apoiador de Jair Bolsonaro e do governador Claudio Castro, cuja polícia promoveu chacinas como a mais recente, no Salgueiro, com a execução de oito pessoas cujos corpos foram retirados pelos moradores.
A Câmara de Niterói chegou a aprovar moção de solidariedade aos dois, em iniciativa organizada por mandatos da esquerda, como o do vereador Paulo Eduardo Gomes (PSOL). Em São Gonçalo, uma audiência na OAB sobre o tema do genocídio negro transformou-se em um ato de solidariedade aos dois mandatos, com dezenas de declarações de apoio. E, em poucas horas, a petição online sobre o caso já havia reunido quase cinco mil assinaturas. “Vamos seguir denunciando essa tentativa de perseguição durante o recesso parlamentar. Vamos mostrar que não iremos nos deixar intimidar e seguir apoiando os professores”, afirma Josemar.
Nesta segunda, 20, o SEPE São Gonçalo irá realizar nova assembleia. A categoria está em estado de greve e irá discutir a resposta ao texto aprovado na Câmara, que já foi questionado também pelo Ministério Público. O sindicato também condenou a atitude de vereadores que atacaram verbalmente os professores em Plenário e manifestou a solidariedade com Josemar e Romário.
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