Bolsonaro está certo. O Enem tem a cara do seu desgoverno e como nas duas últimas edições, deve reproduzir o fracasso, com bagunça e judicialização. É o que se antevê pela demissão de 37 servidores que pediram para sair do Inep a duas semanas da realização das provas. Os servidores do órgão responsável pela aplicação do exame, alegam assédio moral, que teria sido praticado por Danilo Dupas, um dos muitos presidentes que assumiram o Inep desde a posse de Bolsonaro. Também apontam interferência na prova, que teria tido 20 questões censuradas, a maioria delas versando sobre os últimos 50 anos de nossa história.
Os servidores do órgão responsável pela aplicação do exame, alegam assédio moral, que teria sido praticado por Danilo Dupas, um dos muitos presidentes que assumiram o Inep desde a posse de Bolsonaro.
Há 12 meses o ministro falastrão Abraham Weintraub anunciava a realização do “melhor Enem de todos os tempos”. Poucas horas depois do exame, descobriu-se que cerca de seis mil candidatos tinham sido prejudicados por um erro no gabarito. Neste ano, sob a direção de Milton Ribeiro, mais discreto, mas nem por isso menos incompetente, os sinais da crise já tinham sido dados. A começar pela redução do número de inscritos, que caiu de 5,7 milhões em 2020, para 3,1 milhões em 2021, com queda mais acentuada entre os candidatos não-brancos, o que demonstra a elitização do acesso ao ensino superior, desejo manifestado pelo ministro e pelo desgoverno que integra.
Após a demissão dos servidores, algo que ameaça a lisura e a própria realização do exame, Bolsonaro minimizou, dizendo que o problema era financeiro, tese que foi reforçada por Ribeiro, que apareceu de surpresa na Comissão de Educação da Câmara tentando explicar o inexplicável. Justificativas esfarrapadas à parte, o fato é que a habitual tensão pré-Enem, que atinge milhões de famílias e jovens de todo o país, mais uma vez é incrementada com as doses de incerteza e bagunça generalizada que tomaram conta da gestão do Inep.
Em 2018, o general Aléssio Ribeiro Souto, membro do grupo técnico para a Educação da campanha de Bolsonaro, disse que os livros de História que não trouxessem a “verdade” sobre 1964 precisariam ser eliminados. Aparentemente tais livros ainda não foram suprimidos, mas não se ignora o tamanho da pressão exercida sobre professores, autores e editoras para que a versão sobre o golpe e a Ditadura, baseada em fatos e em consenso acadêmico, sejam alteradas. Todos conhecemos bem o apreço de Bolsonaro pelo torturador Brilhante Ustra e seu empenho por emular o regime homicida vigente entre 1964 e 1985, para não falar de outros absurdos.
Na Comissão de Educação, Ribeiro disse que o desgoverno que integra não está tentando destruir o Inep. Ele está certo, pois já destruíram, como fizeram em outras áreas e órgãos. Se há algo que podemos fazer diante de tanto descalabro, além de denunciar e resistir, é começar a contar os dias para a reconstrução. Temos o Inep e um país inteiro para refazer.
Texto publicado originalmente no jornal A Tarde, de Salvador.
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