Em 2002 entrando no mes de novembro, Racionais Mcs lançou o tão atual “Negro drama”, o hino das periferias do Brasil. Cantado com todas as forças pela juventude preta e periférica de norte a sul do país que conhece “O trauma que carrega pra não ser mais um preto fudido” no Brasil. A luta para fugir do cotidiano de violência, desemprego, miséria e racismo que está nas raízes do Brasil, na formação do capitalismo, “desde o início por ouro e prata”.
No período colonial, 24 milhões de indivíduos foram arrancados do continente africano com destino ao chamado Novo Mundo, onde o capitalismo se forma pela exploração da mão de obra escravizada. Para o Brasil, um dos últimos a “abolir” a escravidão foram trazidos
muitos, que fazem do nosso país a maior população negra fora da África e a segunda maior do planeta.
O Brown não mentiu quando disse em sua musica que ver o negro pobre, preso ou morto já é cultural.No nosso país o racismo é estrutural e estruturante na sociedade, está nas lógica dos poderes, das instituições, no judiciário, no executivo, no legislativo assim como está nas relações pessoais e de território.Apesar disso, ainda reina a lógica da democracia racial no Brasil, da negação do racismo, da ideologia do branqueamento que continua a afetar as mentalidades de uma porção significativa da sociedade. Neste ideário de “paraíso das raças” em que vivemos, o racismo mesmo com sua negação vai sendo o responsável por fazer a manutenção do abismo social entre negros e brancos,a naturalização da desigualdade justificada pela cor, que cria uma branquitude ostentadora de privilégios.
Essa tragédia humanitária que estamos vivendo no Brasil de Bolsonaro tem afetado principalmente as mulheres pretas chefes de família, muitas delas por conta da guerra às drogas que mata seus parceiros e familiares se tornam as principais responsáveis pela manutenção de suas famílias. Como diz negro drama constituem a Família brasileira, de dois contra o mundo. A Mãe solteira de um promissor “vagabundo”.
O racismo então sempre estará presente e se mostrará ainda mais nos momentos de crises.Na pandemia de covid-19 nos vimos esse abismo se aprofundar.Com a evolução da epidemia no país, morreram em sua maioria pessoas pretas e pobres, sem saneamento básico e condição de isolamento, com acesso desigual ao sistema de saúde e pela ausência proposital de políticas públicas por Bolsonaro. A justificativa de maior morte e contaminação do vírus por pessoas pretas não se explica por predisposições biológicas, mas sim pela realidade de desigualdade social e de precarização da vida que o racismo estrutural estabelece para essas
pessoas.
Hoje além do vírus da covid, a fome é o que tem entrado nas casas da classe trabalhadora.19 milhões de brasileiros, em sua maioria negros, estão em situação grave em relação ao acesso à alimentação. A realidade é que nem ovo, nem frango, o prato de algumas famílias se tornou sopa de ossos. Essa tragédia humanitária que estamos vivendo no Brasil de Bolsonaro tem afetado principalmente as mulheres pretas chefes de família, muitas delas por conta da guerra às drogas que mata seus parceiros e familiares se tornam as principais responsáveis pela manutenção de suas famílias. Como diz negro drama constituem a Família brasileira, de dois contra o mundo. A Mãe solteira de um promissor “vagabundo”.
De acordo com a ONU e a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2012, o Brasil era o responsável por 10 por cento de todos os homicídios do mundo e possuía 21 das 50 cidades com mais assassinatos em todo o planeta. A vítima preferencial: o jovem negro que reside em favelas e periferias. O assassinato desses jovens demonstra que a segurança pública do Brasil é a da bala, impera uma lógica de guerra, um genocídio da população negra.Em 2019, segundo o atlas da violencia os negros representaram 77% das vítimas de homicídios,o risco de um negro ser assassinado é 2,6 vezes superior ao de uma pessoa não negra. Em sua maioria são mortos na guerra às drogas, que ano após ano, justifica o encarceramento em massa, as chacinas das operações policiais. Afetam a vida dos moradores das periferias já que “Pra quem vive na guerra, a paz nunca existiu”.
É por isso que afirmo junto com Conceição Evaristo que eles, os racistas, a estrutura racista, combinaram de nos matar, pois a violência racial encontra diversas dimensões para promover o extermínio do povo preto.Mas nos combinamos de não morrer.Ainda que com muito sangue derramado, nenhum dessas diversas formas de violência contra o povo negro no Brasil. existe ou existiu sem uma resistência ativa.
Estamos constantemente ligados à ancestralidade afrodiaspórica que nos manteve vivos ao longo de toda nossa trajetória. Nossos quilombos, comunidades, saberes e potências intelectuais, culturais, políticas, econômicas e religiosas nos demonstram que não existe Brasil sem as contribuições e presenças afro,sem a nossa resistência, sem o nosso pretuguês. O povo preto não se rende a morte que nos é imputada desde antes de nascermos, mas se apega na radicalidade da luta para buscar viver a vida em sua plenitude.A nossa história, nossa ancestralidade é viva e revolucionária, pois contra todas as perspectivas é chama que não se apaga, que nos agrega, que nos fortalece e nos impulsiona a não se curvar.
O novembro negro é a expressão dessa insistência de que a sociedade brasileira reconheça a nossa importância, a importância do protagonismo negro. Que o mês seja de tamanha influência que faça parte desse processo de redescoberta, de autovalorização, de nos reeducarmos, de dialogarmos mutuamente em sociedade sobre a urgência do fim do racismo. É um chamado ao reconhecimento de uma dívida histórica para com esta população negra, que no nosso país é negado até mesmo a condição de humanidade, optando por vê-la exterminada em meio as políticas de genocídio do negro brasileiro.
No Brasil de Bolsonaro o novembro negro é a afirmação de que temos um presidente sim genocida,racista, que promoveu propositalmente a morte de diversas pessoas negras na pandemia, por isso, as pessoas pretas são as mais interessadas na derrubada desse governo. O novembro negro é também o chamado a esquerda brasileira a ver com centralidade o antirracismo, inclusive na construção de um novo projeto de poder de esquerda para o Brasil. Por isso nesse novembro negro não podemos deixar
de dizer que não vamos aceitar de Lula e PT nenhum programa politico de país que incluíam leis como a lei antidrogas, que hoje é responsável pelo encarceramento em massa no Brasil. E para nós todo e qualquer debatepolítico sobre futuro para o Brasil em 2022, deverá partir centralmente pela defesa da vida da população negra.
Neste mês do cinquentenário do 20 de novembro, as potências são muitas. Devemos nos colocar em luta contra o genocidio, sem esquecermos que somos maiores que a morte.Amparados pela história e vida de nossos antepassados, que façamos deste mês a expressão do “eu sou porque nós somos”. Firmes de que hemos de vencer e venceremos, pois a pedra de
Exu nunca erra o seu alvo!
“Eu vivo o negro drama, eu sou o negro drama
Eu sou o fruto do negro drama”
*Brenda Marques é militante do Afronte, da rede de mulheres negras do Piauí
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