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EDITORIAL

Greve de caminhoneiros questiona privatização da Petrobrás

Editorial
Reprodução

Em reunião no Rio de Janeiro (15), diversas lideranças dos caminhoneiros indicaram o dia 1º de novembro para o início de  uma nova greve nacional da categoria. Depois de várias ameaças de paralisação que não se confirmaram no último período, desconfianças surgiram sobre o real potencial da greve. Porém, declarações de líderes da  categoria, o clima de elevado descontentamento entre os caminhoneiros e as afirmações cínicas do governo Bolsonaro sobre o aumento dos preços têm jogado cada vez mais combustível na mobilização destes trabalhadores fundamentais na circulação de mercadorias no Brasil.

“Chegou uma hora que o governo do presidente Jair Bolsonaro precisa escolher. Ou os acionistas, ou os caminhoneiros e a classe média. Ele tem 15 dias para escolher”, disse o presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim. Que complementou em entrevista ao portal UOL, “Durante a campanha política para presidente ele falava mal do Temer. E hoje ele está lá e não está fazendo nada. É isso que a categoria está observando”.

O impasse se dá em meio a aumentos históricos nos preços dos combustíveis. Segundo dados do Observatório Social da Petrobrás (OSP), Diesel, GNV, GLP (gás de cozinha) e a Gasolina chegaram a um valor real recorde na série histórica, sendo os maiores preços do século XXI. O valor dos combustíveis nas alturas aquece a inflação de quase todos produtos no país, corroendo a renda – sobretudo – dos trabalhadores mais pobres. (HIPERLINK: www.observatoriopetrobras.com)

Bolsonaro ameaça privatizar a petroleira

A resposta do governo federal foi a pior possível. Diante da possibilidade de greve dos caminhoneiros, a Petrobrás respondeu aumentando ainda mais os preços dos combustíveis (+ 9,15%  o Diesel S-10 e + 7,04% a Gasolina). Para evitar o desgaste que o governo vem sofrendo no mercado financeiro, Guedes e Bolsonaro acenaram na última semana com declarações favoráveis à privatização definitiva da Petrobrás.

Sendo essa ameaça cortina de fumaça ou não, a proposta deve ser encarada com seriedade pela classe trabalhadora, pois a entrega definitiva da Petrobrás para o mercado financeiro faria com que os preços se descontrolassem ainda mais nos próximos anos. O caráter estatal que ainda predomina na companhia, mesmo sob uma política privatista, permite, como mínimo, uma fiscalização e pressão da sociedade. Diante disso, os petroleiros começam nas próximas semanas a realizar assembleias para discutir a realização de uma possível greve em resistência à privatização.

Cinco anos da política de preços da Petrobrás do PPI

Por trás dos aumentos nos combustíveis e na inflação descontrolada está a política de preço de paridade de importação (PPI) da atual gestão da Petrobrás, que busca privatizar o mercado de derivados de petróleo no Brasil. Esta determinação da companhia, que completou exatos 5 anos neste outubro de 2021, faz com que, apesar de ter petróleo nacional e uma empresa estatal capaz de planejar o refino e garantir a oferta desses produtos a custos nacionais, a população brasileira fique exposta à variação de preços do mercado internacional de derivados.

O governo culpa o ICMS e diz que não é possível reverter essa situação já que a Petrobrás não se sustentaria financeiramente sem o PPI. Porém, a alíquota do ICMS segue a mesma ao menos desde 2015. E, até 2016, ano da implementação do PPI, a Petrobrás estatal sempre garantiu a oferta de derivados no país com preços mais próximos da realidade da população brasileira. Atuando de maneira integrada, a estatal utilizava parte do excedente dos recursos da produção de petróleo para maximizar sua produção nacional de derivados, planejar a expansão da sua capacidade de refino, investir em energias renováveis e contribuir com a garantia da soberania energética do país. E isso tudo antes mesmo do Pré-Sal se tornar uma realidade.

A partir de 2016, o processo de desmonte da Petrobrás estatal se acelerou. E com a adoção do PPI, toda variação do mercado internacional de petróleo passou a ser repassada imediatamente para a população. A Greve dos Caminhoneiros de 2018 é consequência direta desse processo. A margem de lucro aplicada pela Petrobrás por litro de diesel chegava a 150%. Para encerrar a greve, o governo Temer fez algumas concessões paliativas, mas o processo de desmonte da Petrobrás e a privatização do setor seguiram avançando.

Tampouco o aceno de Bolsonaro para incorporar 750 mil caminhoneiros no Auxílio Brasil pode resolver o problema. Com o crescimento desenfreado da inflação, esse auxílio não terá um efeito tão significativo. Segundo dados da própria Petrobrás, o preço atual ainda está defasado em cerca de 20% em relação ao valor considerado ideal pelo mercado, ou seja, há margem ainda para mais aumentos. Além disso, o custo de um tanque cheio de diesel supera em muito o valor de R$400,00. A categoria dos caminhoneiros respondeu com lucidez, apontando que o que eles precisam é de dignidade e melhorias estruturais nas condições de trabalho. Por isso, a luta contra o PPI e em defesa do parque de refino brasileiro é parte integrante da pauta de reivindicações da categoria.

Enfrentar a ameaça privatista é lutar contra a carestia

É preciso construir uma articulação unitária entre todos setores políticos e sociais preocupados com o combate a fome, a miséria e ao saque da riqueza nacional para resistir à política de preços criminosa e à ameaça de avanço da privatização na maior empresa estatal da América Latina. Apoiar e incentivar a luta dos caminhoneiros é uma necessidade nesse momento, a despeito das contradições políticas envolvidas na relação de parte  dessa categoria segmento com o bolsonarismo.

As diversas organizações da esquerda, os sindicatos e movimentos sindicais precisam apoiar e impulsionar a organização e resistência dos caminhoneiros, trabalhadores precários urbanos, como motoristas de aplicativo, entregadores e motoboys que estão sendo quase impedidos de trabalhar com o aumento dos combustíveis. É necessário avançar na articulação com movimentos populares, associações de bairro, movimentos de luta contra as opressões e famílias que estão sendo diretamente atingidas pelo aumento da inflação e do preço do botijão de gás; assim como combinar este trabalho com o fomento à luta dos trabalhadores petroleiros, que defenderam nossa soberania por tantas décadas.

Mas é preciso ainda construir um programa de reversão das privatizações e controle social dos preços dos combustíveis a ser implementado por um eventual futuro governo de esquerda. Lula deve desde já encabeçar esta resistência junto aos movimentos sociais.

Quem tem fome tem pressa, não basta esperar 2022. Se não houver unidade entre todos os grupos atingidos pela carestia e aumento dos preços, será muito difícil apontar qualquer saída para o país. É papel da esquerda fomentar esta unidade e construir as ações para a derrubada deste governo e para que a Petrobrás não seja privatizada de vez., o que faria os preços dos combustíveis subirem ainda mais.