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MUNDO

Presidente do Equador decreta Estado de exceção

David Cavalcante*, de Recife (PE)

O banqueiro e Presidente do Equador, Guillermo Lasso, decretou nesta segunda-feira, 18 de outubro o Estado de exceção no Equador. A medida autoritária, que militariza as ruas de 9 províncias do país, passa a valer por 60 dias e sem precisar de autorização da Assembleia Nacional do país. Ante o decreto proclamou: “Las FF.AA. y policiales se sentirán con fuerza en las calles”.

Na semana em que recebe o Secretário de Estado norte-americano para novos acordos de segurança, e em menos de 24 horas do Decreto, o Exército e a Polícia Nacional passaram a atuar juntas nas ruas das Províncias de El Oro, Guayas, Santa Elena, Manabí, Los Ríos, Esmeraldas, Santo Domingo de los Tsáchilas, Pichincha y Sucumbíos. 

O mandato contido no Decreto prevê “mobilização das Forças Armadas e Policiais nas ruas para realizar operações de controle de armas, munições e explosivos, controle do narcotráfico, requisições e patrulhas de drogas 24 horas por dia”, mas o artigo 165 da Constituição do Equador menciona que, durante o estado de exceção, o Chefe de Estado pode suspender ou limitar o exercício do direito à inviolabilidade do domicílio, inviolabilidade do correio, liberdade de trânsito, liberdade de associação e reunião e liberdade de informação. Pode também ordenar a cobrança antecipada de tributos, ordenar o fechamento ou autorização de portos, aeroportos e passagens de fronteira, entre outros.

A justificativa oficial do banqueiro mandatário foi a de “grave comoção interna”, ante o crescimento da criminalidade no país, que aumentou nas últimas semanas, e diante do número de homicídios que cresceu no sistema penitenciário do país. Mas os fatos indicam que as razões reais são outras.

Crise social, volta das mobilizações e envolvimento no Pandora Papers

A lista envolve peixes grandes, como se diz no dito popular. Aqui no Brasil temos o envolvimento do Ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Entre tantos nomes ilustres, há o destaque para 13 Presidentes e ex-Presidentes, desses tipos neoliberais que tanto falam que é necessário abrir o país para investimentos externos. Aí figuram os nomes de Sebastian Piñera, do Chile, e justamente, nada mais nada menos que o banqueiro Guillermo Lasso. 

Grande parte do jornalismo mundial teve acesso, neste domingo, três de outubro, a um relatório de jornalismo investigativo, denominado Pandora Papers. Um Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, sigla em inglês) revelou 11,9 milhões de documentos confidenciais que foram vazados. 

Pandora Papers é o excelente resultado da maior colaboração jornalística da história (600 jornalistas de 117 países), denunciando que pelo menos 92 políticos ou altos funcionários de governos de países da América Latina, criaram empresas offshores (empresas anônimas existentes geralmente em ilhas denominadas “paraísos fiscais”) para ocultarem seus patrimônios pessoais e de familiares, e as fontes dos recursos aplicados. 

A lista envolve peixes grandes, como se diz no dito popular. Aqui no Brasil temos o envolvimento do Ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Entre tantos nomes ilustres, há o destaque para 13 Presidentes e ex-Presidentes, desses tipos neoliberais que tanto falam que é necessário abrir o país para investimentos externos. Aí figuram os nomes de Sebastian Piñera, do Chile, e justamente, nada mais nada menos que o banqueiro Guillermo Lasso. 

Ante a publicação das denúncias no Equador, vários políticos passaram a pedir a renúncia de Lasso, e a Assembleia Nacional aprovou uma investigação sobre o caso. O presidente, além de sua esposa e um de seus filhos, será chamado a comparecer perante a denominada Comissão de Garantias Constitucionais da Assembleia, como parte da investigação. O plano de trabalho da Comissão foi aprovado por unanimidade, no dia 13 de outubro de 2021. A Comissão é composta pelos quatro deputados do partido Pachakutik, três da UNES (oposição correísta) e dois aliados do governo, tamanha foi a repercussão. O prazo para aprovar o relatório é 6 de novembro. 

Desesperado, Guillermo Lasso foi à impressa alegando que estaria em curso um Golpe de Estado orquestrado por Rafael Correa, Jaime Nebot (líder do PSC e ex-prefeito de Guayaquil) e Leonidas Iza (Presidente da CONAIE). Mas a verdade é que Lasso tem uma longa e obscura trajetória como banqueiro e terá muito a falar na Comissão Especial. Ele por exemplo, esteve à frente do Ministério da Economia de Jamil Mahuad, em 1999, quando da tragédia da dolarização da economia do Equador, que gerou uma das maiores crises sociais e econômicas do país, inflação, confiscos, perdas de património e resultou numa gigantesca insurreição popular contra o pacote econômico.  

Por outro lado, há um quadro de agravamento da crise social no Equador, resultante da pandemia e dos retrocessos gerados ainda pelo governo de Lênin Moreno, que reposicionou o país para aprofundar o projeto neoliberal, causando a mais recente Rebelião de outubro de 2019. Neste quadro, há a internacionalização dos preços dos combustíveis, que foi uma das causas dessa rebelião e continua impactando a vida dos trabalhadores e pequenos produtores e comerciantes, visto que se trata de um país produtor de petróleo que tem aumentos mensais dos combustíveis, gerando uma espiral inflacionária indefinida.  

CONAIE prepara mobilizações

O Presidente da CONAIE, Leonidas Iza, declarou que o Estado de exceção tem a função de combater as resistências locais que já estavam em curso, mas reforçou o chamado para aumentar a mobilização social nas próximas semanas.

A maior organização indígena, popular e camponesa do país, a Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador, CONAIE, que foi responsável por dirigir a Rebelião de outubro/19, ante o quadro de agravamento social do país, já vinha realizando protestos locais por direitos econômicos, sociais e étnicos, a exemplo dos pequenos e médios produtores agropecuários da região costeira, por congelamento dos preços dos combustíveis, créditos subsidiados, moratória das dívidas para cerca de 4 milhões de famílias. Agora convoca uma mobilização nacional para o dia 23 de outubro.

O Presidente da CONAIE, Leonidas Iza, declarou que o Estado de exceção tem a função de combater as resistências locais que já estavam em curso, mas reforçou o chamado para aumentar a mobilização social nas próximas semanas. Haverá também um Conselho Nacional Ampliado da CONAIE que está sendo convocado amplamente por suas regionais CONAICE, CONFENIAE e ECUARUNARI, além das diversas comunidades e organizações de base para o dia 22 de outubro. 

O objetivo estratégico de Guillermo Lasso é consolidar um regime bonapartista e repressor para que o país rebelde se consolide numa relação neocolonial com os Estados Unidos, além é claro de tentar impedir as investigações sobre as offshores reveladas no Pandora Papers. Dado o histórico de lutas populares e indígenas recentes no Equador, não será fácil.

*Cientista político