Por que a culpa do preço da gasolina é do Bolsonaro?
Publicado em: 31 de agosto de 2021
Por Eric Gil Dantas*
Na semana passada os jornais noticiaram a última publicação da ANP sobre os preços de revenda e distribuição de combustíveis, alertando como os preços máximos cobrados pela gasolina comum nos estados do Acre, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Tocantins já chegavam aos sete reais o litro. Na última pesquisa, publicada nesta segunda-feira, os dados mostram que, na média, o brasileiro está pagando R$ 5,982 na gasolina, 2,6% a mais do que há um mês, e 40% a mais do que os R$ 4,268 de um ano atrás.
Isto também está acontecendo com todos os derivados de petróleo e gás, além do etanol. O gás de cozinha, diesel e GNV já chegaram aos maiores valores reais do século XXI, e o etanol e gasolina estão próximos ao recorde.
Como sempre, Bolsonaro coloca a culpa em todo mundo, menos nele mesmo. Governadores, distribuidores, postos… todo mundo tem culpa, menos a direção da Petrobras, empresa que ainda é estatal e é presidida pelo seu indicado, o General Silva e Luna.
Mas de quem que é a culpa por a gasolina estar chegando à média de seis reais, e em alguns lugares ultrapassando os sete?
A composição do preço da gasolina é a seguinte. A Petrobras, que extrai o petróleo e refina a gasolina, cobra o equivalente a 33,6% do total do seu preço. Mas os distribuidores devem adicionar à gasolina o etanol anidro (que é o etanol puro), compondo 27% da gasolina comum. Atualmente, esta adição é responsável por 16,9% do custo da gasolina. Também temos os custos com distribuição e revenda, que são as empresas que são responsáveis pelo combustível após a saída da refinaria até a bomba do posto (como a BR Distribuidora, privatizada e renomeada de Vibra Energia na semana passada). Este custo equivale a 16,9% do total. Por fim, temos a tributação. A maior delas é o ICMS, que na média equivale a 27,6% do preço final. Depois temos a tributação federal, com a CIDE, PIS/PASEP e COFINS, custando 11,5% do total.
Apesar de Bolsonaro tentar convencer que a tributação é a causa dos elevadíssimos valores atuais para a gasolina, duas coisas desmentem facilmente o argumento do presidente. A primeira é que, no mundo, se tributa bastante combustíveis fósseis, em percentuais muito superiores ao Brasil. Por exemplo, entre os países da OCDE a média de tributação da gasolina é de 53,2% (“The OECD Tax Database”). No Brasil é de 39,1%. Já o diesel tem uma tributação média de 46,4%, enquanto que no Brasil este percentual é de 22,8%. Além disto, o custo fiscal de retirar estes impostos seria um golpe mortal para os cofres estaduais, o que agravaria a prestação de serviços públicos na ponta.
A segunda questão é que a maior parte da tributação é em forma de alíquota (um percentual), e estão constantes ao longo dos últimos anos. Como o imposto é estadual, a decisão de quanto se cobra é do estado. Hoje, este ICMS varia entre 25% (SP, MT, SC, AC, RR, RO, AP) e 34% (RJ). Mas não houve mudança ao longo dos últimos anos, o que mudou foi o preço da gasolina. Quanto maior o preço, maior o imposto. Por exemplo, se a gasolina custa 4 reais em SP, a cada litro pagaremos 1 real de ICMS, mas se o preço for de 6 reais, pagaremos R$ 1,50 deste tributo.
Bem, mas se a culpa não é do governador ou do imposto, por que seria do Bolsonaro?
Porque a culpa é da atual política de preços da Petrobras, nomeada de Preço de Paridade de Importação (PPI). Instaurada em 2016 por Michel Temer e Pedro Parente, esta política de preços define que produtos derivados de petróleo e gás têm como base o preço de paridade de importação, formado pelas cotações internacionais destes produtos mais os custos que importadores teriam, como por exemplo transporte e taxas portuárias. Isto é, mesmo a Petrobras produzindo em território brasileiro cerca de 80% dos combustíveis consumidos no país nós pagamos como se eles fossem importados.
Porque a culpa é da atual política de preços da Petrobras, nomeada de Preço de Paridade de Importação (PPI). Instaurada em 2016 por Michel Temer e Pedro Parente, esta política de preços define que produtos derivados de petróleo e gás têm como base o preço de paridade de importação, formado pelas cotações internacionais destes produtos mais os custos que importadores teriam, como por exemplo transporte e taxas portuárias. Isto é, mesmo a Petrobras produzindo em território brasileiro cerca de 80% dos combustíveis consumidos no país nós pagamos como se eles fossem importados. Não só em termos de dólar, mas pagamos até uma tarifa portuária e de transporte inexistentes.
Esta política de preços não se baseia nos custos reais da empresa. Atualmente, o custo da Petrobras para extrair um barril de petróleo (cerca de 159 litros) no Brasil é R$ 97,92. Este valor só é 10% mais elevado do que a média real do custo de extração dos últimos 16 anos. E só está acima da média porque o barril, se cotado em Real, está no seu maior patamar em todo este período – o que faz com que as participações governamentais (principalmente royalties) se elevem, pois quanto maior o preço do barril mais as petrolíferas devem pagar a estados e União, aumentando o custo de extração. Já o custo de refino da Petrobras está muito inferior à média dos últimos 16 anos. Atualmente o custo de refinar um barril é de R$ 8,70, 14% a menos do que a média deste período.
Além deste preço fictício, o câmbio se deteriorou rapidamente com Bolsonaro e Guedes. Quando o Faria Loser assumiu a Economia, um dólar equivalia a R$ 3,81, hoje um dólar equivale a R$ 5,195, ou seja, uma desvalorização cambial de 27%. Como a cotação está em “preços internacionais”, isto agrava ainda mais o catastrófico PPI.
O último resultado financeiro da Petrobras deixou claro a quem serve o PPI. A empresa chegou a um lucro trimestral de R$ 42,86 bilhões (muito superior a qualquer banco do país), principalmente por conta dos preços do barril de petróleo e dos derivados no mercado nacional. Com a animação e atingindo a meta de endividamento (às custas de suas privatizações), a empresa já antecipou o pagamento de dividendos para seus acionistas em R$ 21 bilhões, e ainda deverá pagar mais R$ 10,6 bilhões ainda neste ano. Este total será quase o triplo da média dos últimos três anos, e fará com que a Petrobras seja a terceira maior pagadora de dividendos dentre todas as petrolíferas do mundo em 2021. Em 2022 ela se tornará a maior pagadora do mundo no setor.
A política de privatizações em pedaços da Petrobrás, que já ultrapassa a venda de mais de R$ 200 bilhões de ativos da estatal, irá destruir o poder de o Estado estabelecer preços, diluindo no mercado – mercado este que se transforma dia após dia em monopólios e oligopólios privados. Na verdade, a Petrobras utiliza o que o governo Bolsonaro imagina ser os seus últimos esforços como empresa estatal forte, para estabelecer o mais alto preço possível de derivados a fim de também garantir a entrada destes agentes privados (produtores e importadores), e preparar a venda dos seus ativos, já garantindo uma estrutura de mercado que lhes proporcionem o mais alto lucro possível, lucro este sustentado com a miséria do povo que financiou a Petrobrás e a descoberta do Pré-sal.
Por tudo isto, só teremos gasolina, gás de cozinha, etanol e todos estes produtos a preços justos quando derrubarmos Bolsonaro e Guedes, colocando a Petrobras a serviço dos seus verdadeiros donos, os brasileiros.
*Eric Gil Dantas é Economista do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais – IBEPS, Doutor em Ciência Política (UFPR) e pesquisador de pós-doutorado (FGV-SP)
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