Na última semana, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encerrou sua viagem de 12 dias por seis estados do Nordeste (Pernambuco, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Maranhão e Bahia). A região é reconhecida como a que, proporcionalmente, mais ofereceu votos ao PT em todas as eleições. É também o lugar onde Lula tem uma alta popularidade. Durante a sua visita, o ex-presidente afirmou que ainda não está definido se será candidato ou não nas eleições presidenciais de 2022 e, enquanto isso, segue “conversando com muita gente”.
A passagem de Lula pelo Nordeste traz reflexões importantes. A primeira constatação é que, sendo ele ainda uma grande liderança popular e frente ao desgaste da gestão genocida de Bolsonaro, a maioria do povo trabalhador e das vanguardas que resistem o querem como candidato. O ex-presidente tem essa autoridade por ser, como aponta a esmagadora maioria das pesquisas, o único nome da esquerda que ganharia de Bolsonaro nas próximas eleições presidenciais.
A segunda questão é que Lula e PT apostam na estratégia de fragmentar a base política de apoio bolsonarista. Da mesma forma como conversou com diversos setores dos movimentos sociais, ele também costurou alianças regionais com empresários, segmentos evangélicos e líderes locais do centrão. Coronéis da política baiana, como o senador Otto Alencar (PSD) e o vice-governador João Leão (PP), sinalizaram apoio a Lula a nível estadual, mesmo sem as definições nacionais de seus partidos que, a nível nacional, estão hoje mais alinhados a Bolsonaro – a exemplo do próprio filho do vice-governador baiano, Cacá Leão (PP), que é base do governo e vota junto com ele em todas as pautas do Congresso.
Ao mesmo tempo que faz todas essas movimentações, Lula afirma que quer refundar o Brasil. Em várias declarações públicas em sua passagem pelo Nordeste, o ex-presidente reconhece os retrocessos do governo Bolsonaro e afirma que “se for candidato, quer fazer um governo melhor. Ser lembrado como alguém que governou para o povo”.
Houve, ainda, um fatídico encontro infeliz de Lula com o Pastor Sargento Isidório na sua passagem por Salvador. Isidório foi o deputado federal mais votado na última eleição com 323 mil votos. Ele é base aliada do governo Rui Costa (PT), se autodenomina ex-gay e foi um dos autores do projeto de lei para “criação do dia do orgulho hétero”. É também criador da entidade “Fundação Doutor Jesus”, uma organização que atua no tratamento de dependentes químicos e que tem em seu histórico várias denúncias de violação de direitos humanos acolhidas pelo Conselho Estadual de Entorpecentes com repercussões, inclusive, no Ministério Público da Bahia.
Ao mesmo tempo que faz todas essas movimentações, Lula afirma que quer refundar o Brasil. Em várias declarações públicas em sua passagem pelo Nordeste, o ex-presidente reconhece os retrocessos do governo Bolsonaro e afirma que “se for candidato, quer fazer um governo melhor. Ser lembrado como alguém que governou para o povo”.
É preciso uma unidade que aponte para o novo
Na política e na vida existe um caminho entre o que se quer fazer e as condições construídas para fazê-lo. Em meio a essas movimentações, há uma questão a ser respondida: é possível reeditar as alianças que deram em golpe sem que isso dê errado de novo? Nada indica que sim. Em primeiro lugar porque não basta só derrotar Bolsonaro nas ruas ou nas urnas, existe o depois. A repetição de Frente Ampla que cabe, por exemplo, desde movimentos LGBTs até seus inimigos, como pastores fundamentalistas, é uma conta que não fecha. Da mesma forma como as experiências com o governo golpista de Temer e fascista de Bolsonaro mostraram que são inconciliáveis os interesses do grande capital com os interesses do povo.
Lula é um aliado para derrotar Bolsonaro mas a sua tentativa de construir uma “frente ampla” com “todo mundo” é uma equação que não tem como gerar bons resultados. Para 2022, independente se o impeachment for conquistado pela força das ruas ou não, precisamos de uma unidade comprometida em salvar o que vai restar de Brasil.
Lula é um aliado para derrotar Bolsonaro mas a sua tentativa de construir uma “frente ampla” com “todo mundo” é uma equação que não tem como gerar bons resultados. Para 2022, independente se o impeachment for conquistado pela força das ruas ou não, precisamos de uma unidade comprometida em salvar o que vai restar de Brasil. É necessário lutarmos para vencer com um projeto que esteja a serviço da revogação da PEC do Teto dos Gastos, das reformas trabalhistas e da previdência, em reverter as privatizações, em defender a educação pública e crítica, em restaurar os direitos dos povos originários, das mulheres, do povo negro e das LGBTs. Para isso, precisamos de uma unidade que aponte para o novo com uma frente de esquerda.
É por isso que os movimentos sociais e os partidos de esquerda que foram dialogar com Lula estão corretos. Ninguém que está disposto a pôr um fim na tragédia bolsonarista deve vetar o diálogo com o único nome capaz de derrotá-lo nas urnas. Precisamos dizer: Lula, as alianças com aqueles que abriram caminho para o golpe são perigosas. Estamos dispostos a irmos junto com você! Venha conosco construir uma frente de esquerda, sem a direita, com setores combativos dos movimentos populares, da cidade e do campo. Vamos juntos derrotar o fascismo nas ruas e nas ruas!
Não recuar das ruas
Nesse momento perigoso da história brasileira, nada é mais importante do que interromper o projeto bolsonarista de país. O que temos de melhor construído até agora para armar a nossa linha de defesa é a Campanha Fora Bolsonaro, que já realizou quatro grandes atos nacionais contra o governo genocida. No próximo dia 7 de setembro, precisamos voltar às ruas com força para defender a pauta do impeachment já e por fim o quanto antes a esse governo. É preciso mostrar que a maioria do povo é #ForaBolsonaro e não deixar que os atos da extrema-direita tenham o protagonismo. Fará diferença Lula convocar e participar das mobilizações do lado de quem quer o fim do governo da morte e não aceita ameaças golpistas.
Para Lula realmente refundar o Brasil, ele precisa estar comprometido, no discurso e nas alianças, em remover o entulho autoritário de retrocessos deixado por Bolsonaro. Se Lula quer “fazer um governo melhor”, se o PT quer fazer diferente, se quisermos enfrentar as ameaças golpistas, é preciso construir força social a partir das ruas, das lutas, dos movimentos sociais. E se nós realmente queremos que a superação do atual momento passe por uma saída popular, precisamos sermos melhores do que um “eu avisei”. E isso passa pelo compromisso, até as últimas consequências, de empurrar a esquerda para a esquerda.
O Brasil precisa de uma frente de esquerda, construída nas lutas, para as ruas e para as eleições, para derrotar Bolsonaro e reconstruir o país!
*Priscila Costa é feminista antirracista, ativista do Afronte! e fez parte da Comissão do PSOL Bahia que reuniu-se com Lula em Salvador.
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