Há 198 anos o sol nascia brilhando mais forte, era 02 de julho de 1823, e a cidade de Salvador amanhecia livre. Quando as tropas brasileiras chegaram em marcha, o derrotado exército de ocupação português já havia fugido pelo Atlântico, rumo ao velho continente para lamber suas feridas em terras lusitanas. Quase 10 meses após o grito do Ipiranga proclamado por D. Pedro, enfim Portugal abandonava suas pretensões de manter o controle metropolitano sobre o Brasil.
É conveniente para uma visão tradicionalista e conservadora reproduzir o processo da independência do Brasil com uma rica trama palaciana, um jogo de xadrez no qual somente os “bem-nascidos” e ilustrados tomaram parte. Nada mais falso, não haveria independência do país que viria a se constituir como Brasil, sem que uma verdadeira guerra de independência ocorresse na Bahia, em Pernambuco e outras regiões do nordeste.
A Independência do Brasil na Bahia, com suas diversas batalhas, teve como protagonista uma geração de heróis e heroínas que vieram de baixo, que não tinham nomes pomposos, nem linhagem, brasões e sangue azul. Ao invés de Leopoldinas, tivemos Maria Filipa e Maria Quitéria.
A Independência do Brasil na Bahia, com suas diversas batalhas, teve como protagonista uma geração de heróis e heroínas que vieram de baixo, que não tinham nomes pomposos, nem linhagem, brasões e sangue azul. Ao invés de Leopoldinas, tivemos Maria Filipa e Maria Quitéria. A primeira, negra escravizada, organizou outras mulheres iguais a ela para evitar que os portugueses tomassem a Ilha de Itaparica. A segunda, rebelou-se contra os paradigmas que impediam o ingresso de mulheres nas tropas. Disfarçada de homem, ingressou no Exército dos Periquitos. Aliás, este batalhão de voluntários foi criado e comandado pelo avô do poeta Castro Alves, Coronel José Antônio da Silva Castro, e recebeu o curioso nome de “periquitos” por causa do tom verde das suas fardas.
Sob o julgo do general português Madeira de Mello, o povo de Salvador resistia como podia. A Abadessa Joana Angélica sacrificou a própria vida, para evitar que as tropas portuguesas invadissem o Convento da Lapa e prendessem rebeldes que lá buscaram abrigo. Grupos de capoeiras, formados por negros libertos ou não, enfrentavam os soldados portugueses nas ruas e vielas da cidade. Enquanto os ricos fugiam ou faziam acordos, era o povo “desclassificado” quem resistia como podia.
Às margens da capital, o exército libertador avançava em sua marcha vinda das cidades do Recôncavo em direção a Salvador. Nessa marcha contra a tirania, a batalha decisiva da Independência do Brasil foi travada bem longe do riacho do Ipiranga, e ocorreu na madrugada do 8 de novembro de 1822, em Pirajá. O embate em Pirajá envolveu milhares de soldados e é considerado um dos mais importantes ocorridos no continente americano durante o século XIX. O triunfo na batalha de Pirajá foi decisivo, com a vitória brasileira o cerco a Madeira de Mello estava consolidado, e o assalto para libertar Salvador tornou-se possível.
Canalha genocida, fora daqui!
Hoje, pelo segundo ano seguido, não teremos a festa da Independência com o popular cortejo do 02 de julho. Da Lapinha ao Campo Grande, não desfilarão os carros alegóricos da Cabocla e do Caboclo, não desfilarão os Encourados de Pedrão, nem as bandas de fanfarra das escolas, ou os blocos dos movimentos sociais. Lá não estaremos porque continua a existir uma pandemia, porque o presidente aliou-se ao vírus, e ao invés de vacina o seu governo preferiu correr atrás de propina.
Bolsonaro cogitou vir a Bahia desfilar com sua “motociata” da morte. Intruso, Bolsonaro viria sem ser convidado, pois na Bahia e em Salvador a reprovação do genocida está entre as maiores do país.
Não satisfeito por ser o maior culpado pelo atual estado de coisas, e pelas evitáveis mortes de mais de meio milhão de pessoas, Bolsonaro cogitou vir a Bahia desfilar com sua “motociata” da morte. Intruso, Bolsonaro viria sem ser convidado, pois na Bahia e em Salvador a reprovação do genocida está entre as maiores do país.
A presença de Bolsonaro e sua corja seria uma afronta a memória histórica do 02 de julho, pois eles representam atualmente tudo aquilo que a geração de 1823 lutou para extirpar do Brasil: A tirania, a opressão, a violência política, o ódio e a corrupção. Nada disso tem identidade com a nossa data magna.
Aos milhares, no dia 03/07, iremos às ruas em sintonia com a memória de resistência do 02 de julho. Nos corpos e rostos dos que irão às ruas no próximo sábado, veremos a identidade com o verdadeiro legado do 02 de julho. Lá, no Campo Grande às 14 horas, estariam à vontade Maria Filipa, Joana Angélica e Maria Quitéria. Elas, junto conosco, exigiriam vacina no braço e comida no prato, denunciariam o genocida e somariam esforços na luta para derrubá-lo.
Salve ao 02 de julho!
Salve as heroínas e heróis da nossa resistência!
Fora Bolsonaro genocida!
*Jean Montezuma é historiador e militante da Resistência/PSOL
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