Para analisar a realidade sergipana e propor iniciativas políticas que possam transformar a atual situação de desigualdade econômica, social, racial e de gênero é fundamental situar a conjuntura nacional. Isso parece óbvio, mas muita gente desconsidera que há uma hierarquia no debate político. Como pensar no desenvolvimento de Sergipe, enquanto temos como presidente da república Jair Bolsonaro? Por essa razão, muitos argumentos se perdem na relação entre a parte e o todo. Discursos “que todos os gestores devem ser responsabilizados na pandemia”. Com toda certeza! Quem aprontou com o dinheiro público, que pague! Mas comparar a omissão proposital e a ação genocida de Bolsonaro com os erros dos gestores municipais e estaduais é desproporcional. Nesse sentido, é essencial abordar a situação política nacional e como ela incide sobre nosso estado.
Unidade pelo Fora Bolsonaro nas ruas e Frente de Esquerda para as eleições 2022
Vivemos tempos difíceis. São mais de 500 mil mortes de brasileiros e brasileiras, muitas vidas que poderiam ter sido salvas se não estivéssemos diante de um governo genocida e corrupto. A CPI da Covid-19 no senado está comprovando a cada dia o que as ruas já vem denunciando há bastante tempo. Felizmente, com a pressão popular, as vacinas começaram a chegar, ainda que num ritmo lento, as manifestações contra o presidente estão crescendo, a cada dia mais pessoas se arrependem do voto em Bolsonaro e temos a chance de fazer avançar o pedido de impeachment na câmara.
Mas não será nada fácil, pois temos um congresso conservador, como vimos agora com a entrega da Eletrobrás, um patrimônio do povo brasileiro. As dificuldades objetivas pesam. A fome, desemprego, violência policial contra a população negra e periférica, na cidade e no campo, especialmente contra quilombolas e indígenas. Por isso, para derrubar bolsonaro é fundamental a unidade de amplos setores como nos atos de rua em 29 de maio e 19 de junho. A recuperação dos direitos políticos de Lula também é uma vitória democrática importante que ajuda a fortalecer essa luta. Por outro lado, antecipa bastante o debate eleitoral.
É importante separar as coisas. Uma tarefa imediata é a mais ampla unidade para derrotar o governo miliciano e genocida. Outra, bem diferente, é a apresentação de uma alternativa, de um projeto de país em 2022, a partir das demandas da classe trabalhadora. Mas é preciso considerar que estamos em um governo diferente de todos os outros. É um contexto de ameaças golpistas por parte do bolsonarismo. Nesse sentido, defendemos para as eleições uma frente de esquerda, o que obviamente inclui discutir um programa que, no mínimo, revogue a agenda de destruição dos direitos sociais desde o golpe, em diálogo com o PT e Lula. Não temos acordo em uma aliança com Sarney, por exemplo. Mas também não ignoramos o peso do PT, quando Lula hoje lidera todas as pesquisas eleitorais e se mostra como alternativa mais forte contra Bolsonaro.
Assim, queremos construir e disputar um programa de esquerda, a partir das reais necessidades do povo trabalhador, em toda sua diversidade das mulheres, negros e negras, LGBTQIA+ e indígenas. Isso, considerando a situação atual, pois o cenário pode se modificar rapidamente. A imprevisibilidade é um traço do período. Se o congresso encaminhar o impeachment a partir da pressão popular e Bolsonaro não chegar às eleições será uma grande vitória e abre-se um novo momento de debate na esquerda. Mas pode ser que o quadro permanente de desgaste prossiga até 2022. Temos que apostar nas ruas e nos guiarmos pela ampla unidade contra o governo.
Belivaldo, mais um governo dos grandes empresários e do agronegócio. É preciso construir uma nova história para Sergipe!
Em Sergipe, temos enfrentado o governo de Belivaldo, aliado de bolsonaristas como Laércio Oliveira, Gustinho Ribeiro e subserviente ao governo federal. Equivale hoje na política nacional a um governo do “centrão”. Não é um bolsonarismo raiz, mas mantém o diálogo com os grupos conservadores. Sergipe tem um dos piores índices de desemprego do país. Há um forte processo de desindustrialização e o governo segue paralisado. Refém do agronegócio e da especulação imobiliária, o governo Belivaldo não apresenta planos de reforma agrária e construção de casas populares. Pelo contrário, tem atuado para operar despejos violentos. Tem crescido assustadoramente o número de casos de violência policial e mortes contra a população negra. O projeto de desenvolvimento do governo prejudica o meio ambiente e passa por cima dos interesses das comunidades tradicionais (pescadores, catadoras, marisqueiras), como é o caso da termoelétrica no litoral norte. Uma gestão privatista, que retira direitos dos servidores e avança na terceirização.
Em plena pandemia, Belivaldo cortou parcialmente a renda básica no final do ano, reduzindo o número de famílias beneficiadas e organizou um comitê científico somente com representação do grande empresariado, sem diálogo com a sociedade. Com as UTI’s praticamente lotadas e índices altíssimos de contaminação, o governo segue cedendo à reabertura geral, porque prefere não investir em um plano de medidas sociais. Enquanto não se vacina toda a população, o isolamento é fundamental, mas só podemos exigir que as pessoas fiquem em casa se o governo garantir a renda.
Diante desse quadro é preciso apresentar uma alternativa de projeto para Sergipe. Construir uma nova história para o nosso povo. Isto passa por mudanças estruturais na economia, educação, segurança, enfim, pela garantia dos direitos sociais e da defesa do meio ambiente. Precisamos inverter a lógica de governabilidade com os grandes empresários e financiadores de campanha para governar a partir das prioridades da população sergipana. Isso significa mais investimentos públicos e maior participação popular. Mudanças orçamentárias e de prioridade de políticas públicas, mas também na forma de governar, descentralizando e envolvendo os municípios. Um projeto de poder que reflita o perfil e as demandas do povo sergipano, que passa pela efetiva participação das mulheres, negros e negras, LGBTQIA+, indígenas, em espaços políticos de liderança e visibilidade.
Por uma Frente de Esquerda liderada pelo PSOL, PT, PCB, sindicatos e movimentos sociais! É tempo de fortalecer as alianças no campo da classe trabalhadora!
Nenhum partido tem condições de construir esse projeto de transformação para Sergipe de forma isolada. Concordamos que é fundamental construir alianças. E que essas alianças sejam no campo da classe trabalhadora, em defesa da maioria. Portanto, queremos que o PSOL lute pela construção de uma Frente de Esquerda, que envolva partidos, movimentos sociais, de juventude, de combate ao racismo, machismo e LGBTfobia. Uma ampla frente de esquerda. Nesse sentido, o PT precisa romper com o governo de Belivaldo Chagas, pois não há nenhuma identidade entre o projeto do governo Belivaldo e a melhoria de vida do povo sergipano. Esse é um desafio importante.
Assim, podemos avançar para uma mesa de diálogo envolvendo PSOL, PT, PCB, CUT, MST, MTST, Sindicatos, Movimento Negro, etc. que depois pode evoluir para a construção de seminários de formação e sistematização do programa político, envolvendo lideranças populares, intelectuais, com bastante mobilização por todas as regiões do estado. É nisso que apostamos nossas forças. Na máxima unidade da esquerda sergipana. Mas não depende apenas de nós.
Aqui fazemos outro destaque. Partidos como o PDT, PSB, Rede e PMN, para citar alguns exemplos, não fazem parte de uma frente de esquerda. O PDT lidera uma coalizão com a direita sergipana em Aracaju. O PSB é controlado pela família Valadares, uma família que representa um dos setores políticos mais atrasados de Sergipe, que é reconhecida por bater nos professores na década de 90, além de ter apoiado o golpe e sustentado parte do projeto bolsonarista em Sergipe nos últimos anos. A Rede e o PMN são partidos de aluguel que mudam de orientação como muda o vento. A Rede se construiu com um discurso “nem direita, nem esquerda”. Partidos burgueses que existem apenas como legenda eleitoral. Reconhecemos que há bons quadros e parlamentares de esquerda nesses partidos, mas a política desenvolvida por esses setores é refém dos velhos acordos com os representantes do grande capital. Acreditamos no exemplo de Boulos em São Paulo, que chegou ao segundo turno da maior cidade da América Latina numa aliança de esquerda. Foi também numa frente de esquerda que Marcelo Déda ganhou a prefeitura de Aracaju pela primeira vez em 2000.
As eleições de 2022 não começam, nem encerram a luta. Ainda temos tempo para o debate. Mas é preciso começar a se preparar para esse importante momento de disputa política na sociedade. O resultado do processo eleitoral pode contribuir ou não para nos colocar numa situação de mais força no terreno da luta social. Vai depender de nossa política, de nossas escolhas. É tempo de fortalecermos as alianças no campo da classe trabalhadora! Lutemos pela unidade e por um programa de mudanças estruturais para Sergipe!
*Sonia Meire é professora aposentada, suplente de vereadora em Aracaju e Resistência/PSOL
*Igor Baima é administrador de redes, presidente do Sindiscose e Resistência/PSOL
*Mel Cerqueira é bacharel em serviço social, militante do Afronte Sergipe e Resistência/PSOL
*Felipe Santos é estudante de economia, presidente do DCE-UFS e Resistência/PSOL
*Alexis Pedrão é professor, coordena a Ocupação Centro Administrativo e Resistência/PSOL
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