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BRASIL

A ruptura de Marcelo Freixo com o PSOL e os desafios da esquerda fluminense

Deborah Cavalcante*, de São Paulo, SP, e Ivan Martins**, do Rio de Janeiro, RJ
Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Nesta manhã, 11 de junho, o deputado federal Marcelo Freixo anunciou publicamente sua desfiliação do PSOL. É sem dúvida uma grande perda para o partido e para a esquerda socialista.

A ruptura ocorre após 16 anos de atuação comum, em que Freixo se converteu na principal figura da esquerda fluminense e referência nacional na luta por direitos humanos. Nunca faltou ao deputado coragem de enfrentar interesses poderosos. Em função disso, Freixo recebe ameaças a sua vida e de sua família. Independente da decisão de hoje, o PSOL apoiará e defenderá Marcelo Freixo sempre que for atacado pela direita ou pelas milícias.

Nestes anos, também não faltou ao PSOL espaço político e energia militante para as mobilizações sociais e intervenção nas eleições e no parlamento em favor dos interesses da maioria. O legado de Freixo e do PSOL se mistura como parte natural de uma construção coletiva, que foi capaz de aglutinar boa parte do que de melhor o ativismo da esquerda e dos movimentos sociais produziu no Rio de Janeiro.

Sua saída se dá num momento em que as consequências devastadoras de dois anos e meio de governo Bolsonaro evidenciam-se em mais de 480 mil mortos pela pandemia do COVID-19, no ataque generalizado aos direitos sociais dos trabalhadores e pobres, na ameaça golpista, na devastação ambiental e no avanço da milicianização do território urbano e da política, apoiada diretamente no Planalto. A esquerda carioca enfrenta um desafio ainda maior com as sucessivas chacinas, amplos territórios militarizados associados ao legado de governos ultraliberais e, mais recentemente, de natureza neofascista.

Freixo agora tem abrigo num outro partido, em busca de uma coalizão eleitoral amplíssima. Em 2020, Freixo desistiu de se lançar candidato à Prefeitura carioca pela expectativa frustrada de encabeçar uma chapa que reunisse a centro-esquerda. Sua desistência abriu espaço para a fragmentação em diversas candidaturas. Nenhuma delas com o potencial que a chapa do PSOL com Freixo possuía de chegar ao 2º turno e unificar, então, a esquerda.

Agora Freixo buscou uma legenda menos identificada com as ideias de esquerda e do socialismo para ajudar a viabilizar sua eleição. É possível que esta chapa de Freixo com PSB inclua figuras que estão no campo democrático de oposição ao Bolsonaro, mas querem um programa de contrarreformas, retirada de direitos e privatizações. Realmente, o PSOL não seria a ferramenta para governar ao lado da burguesia, ainda que esteja disposto a unidade de ação em todas as questões democráticas.

A aposta de Freixo em uma ponte entre a esquerda e centro-direita se assemelha à construção de uma terceira via. Mas a “fuga da polarização” é inviável em um país assolado por crises, em que a direita tradicional tem dificuldades de superar suas derrotas e a esquerda recupera fôlego com a recuperação dos direitos políticos de Lula e a retomada da mobilização de rua.

Para derrotar a extrema direita no Planalto e no Rio de Janeiro, é preciso uma alternativa de combate ao empobrecimento da população, ao desemprego, à desnacionalização e desindustrialização da economia, à subordinação do Estado ao mercado financeiro. A direita tradicional e o empresariado que a representa não querem abrir mão de uma saída profundamente liberal para a crise brasileira. Para a maioria da população, que a esquerda deve defender, não há outro caminho que construir seu próprio projeto.

Este projeto é o coração de uma frente de esquerda que seja capaz de mobilizar milhões, tanto na dura resistência à Bolsonaro quanto na construção de uma candidatura que o enfrente nas urnas.

O PSOL é um partido em ascensão e que tem se dedicado a esta construção, em diálogo permanente com os partidos de esquerda e iniciativas comuns com forças de oposição de todos os matizes. 

Em quase duas décadas, o partido tem sido o porta-voz mais destacado na defesa dos direitos humanos, direitos das/os oprimidas/os, direitos dos trabalhadores e da população pobre, contra todas os projetos de retiradas de direitos, mesmo aqueles implementados por partidos de esquerda.

Com independência política, o PSOL é um partido plural, que aos poucos construiu uma combativa bancada parlamentar no Congresso Nacional, em Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais a partir do esforço de muitos milhares de militantes engajados num projeto coletivo. As bases desta construção são sólidas, amparadas na defesa de um programa anticapitalista de ruptura e num modelo de organização partidária democrático, coletivo, colaborativo.

O PSOL terá cada vez mais um papel protagonista na vida política nacional, ao lado de todos que lutam. A derrota aberta com a saída do Freixo tem sabor amargo, mas não estremece aqueles que se dedicam a reconstruir a esquerda brasileira, com paciência, sem atalhos, e apoiando-se nas lutas, nos movimentos sociais e em bancadas combativas no parlamento.

Seguimos com Freixo na luta contra Bolsonaro e em muitas, muitas outras. E seguiremos no PSOL lutando para que a superação da ameaça bolsonarista seja o início da conquista de uma sociedade mais justa. Só a luta muda a vida.

*Deborah Cavalcante, Advogada trabalhista, mestre em Ciência Política e militante da Resistência e do PSOL.
**Ivan Martins, Membro da Executiva Estadual do PSOL e militante da Resistência.