O youtube é sem dúvida a plataforma mais usada para assistir vídeos. É gratuito, fácil de usar e tem uma infinidade de conteúdos que atravessa todos os públicos. Crianças, jovens, homens e mulheres, grupos sociais, estilos de vida, etc, todos estão contemplados. Podemos divagar até a eternidade. No entanto, não é isso que buscamos.
Buscamos melhor compreender essa plataforma apenas como elemento necessário para se compreender o funcionamento da internet, seus impedimentos e problemas e suas possibilidades. Sabemos que a lógica de funcionamento mercantil sem dúvidas rege as atrações dessa plataforma. Muitos youtubers, por exemplo, desempenham o papel de meros animadores, caricatos e apelativos. Isso na maioria das vezes é o fator de impedimento do crescimento de produtores comprometidos não com o mero entretenimento alienante, mas com a formação crítica dos espectadores, que também tornam-se nesse processo participantes ajudando os produtores a melhor desenvolver seus conteúdos.
O que vemos como saída para essa invisibilidade é muitas vezes ceder à lógica do espetáculo. No meio político isso é conhecido como “tretas”. O sujeito que tem pouca visibilidade ataca ou critica o que tem mais acessos como forma de capturar parte desse público para o seu canal. Nessa lógica o público é também uma mercadoria. A necessidade então não é mais o avanço das produções, mas sim estratégias que gerem cada vez mais visibilidade e engajamento.
O resultado são canais corporativos que têm, portanto, interesses muito bem definidos. As relações também são regidas por essa lógica de funcionamento: a relação com o outro é a partir do que ele pode me oferecer e vice versa. A moeda de troca é a influência que funciona como uma espécie de capital simbólico. Os muros então são erguidos delimitando os limites e alienando o público de debates mais amplos oferecendo a este apenas aquilo que já está prescrito. Dessa forma ainda que o sujeito tenha acúmulo ou certa expertise ele passa a ser apenas uma mercadoria corroborando toda uma forma de funcionamento já pré-estabelecida.
É claro que isso não define todas as relações no youtube havendo um sem número de canais que contradizem essa norma, mas que estão anos luz em desvantagem com relação ao alcance. Isso quer dizer que a plataforma apesar de ter uma infinidade de conteúdos é pouco ou nada democrática o que faz com que ou se forjem novas possibilidades no seu interior limitadas ao funcionamento geral ou se produzam novas plataformas com outro direcionamento de fato horizontal e que possibilite um equilíbrio maior no acesso às informações como é o caso da plataforma Bombozila, por exemplo.
Os canais de direita crescem numa velocidade vertiginosa desde as que já se estabeleceram como os canais mais novos. Em fevereiro de 2019 fiz um levantamento dos principais canais da direita e vejamos o seu crescimento, até maio deste ano:
• Jovem Pan: fev 2019 – 1.374.314 / maio 2021 – 3.420.000 inscritos
• Nando Moura: fev 2019 – 3.076.240 / maio 2021 – 3.180.000 inscritos
• Mamãefalei: fev 2019 – 2.447.890 / maio 2021 – 2.740.000 inscritos
• Folha do Brasil: fev 2019 – 784.913 / maio 2021 – 2.560.000 inscritos
• Brasil Paralelo: fev 2019 – 747.342 / maio 2021 – 1.770.000 inscritos
• Diego Rox: fev 2019 – 1.055.070 / maio 2021 – 1.570.000 inscritos
• MBL: fev 2019 – 1.425.000 / maio 2021 – 1.250.000 inscritos
• Terça Livre: fev 2019 – 580.586 / maio 2021 – 1.210.000 inscritos
• O Jacaré de Tanga: fev 2019 – 544.137 / maio 2021 – 1.210.000 inscritos
• Padre Paulo Ricardo: fev 2019 – 521.935 / maio 2021 – 1.170.000 inscritos
• Olavo de Carvalho: fev 2019 – 610.910 / maio 2021 – 1.030.000 inscritos
• Bernardo Kuster fev 2019 – 587.983 / maio 2021 – 924.000 inscritos
• Luiz Felipe Pondé: fev 2019 – 532.540 / maio 2021 – 877.000 inscritos
• Joice Hasselmann: fev 2019 – 1.149.000 / maio 2021 – 875.000 inscritos
• Rodrigo Constantino: fev 2019 – 55.066 / maio 2021 – 646.000 inscritos
• Ideias Radicais: fev 2019 – 536.530 / maio 2021 – 640.000 inscritos
• Paula Marisa: fev 2019 – 195.864 / maio 2021 – 601.000 inscritos
• Marcelo Brigadeiro: fev 2019 – 282.057 / maio 2021 – 427.000 inscritos
• Leandro Ruschel: fev 2019 – 73.978 / maio 2021 – 222.000 inscritos
• Fernando Holliday: fev 2019 – 93.146 / maio 2021 – 113.000 inscritos
Em dois anos e quatro meses, por exemplo, o Brasil Paralelo ganhou 1.022.658 inscritos. A Jovem Pan cresceu em mais de 2 milhões de inscritos. Alguns poucos canais como podemos observar encolheu como Joice Hasselmann e MBL, mas perderam pouco tendo em vista o total de antes.
No geral, a direita acelerou e expandiu o seu alcance, produzindo cada vez mais, de forma ainda mais articulada e alcançando cada vez mais pessoas aumentando também o espectro do público que não se resume somente a jovens. Há desde intelectuais orgânicos da burguesia como Luiz Felipe Pondé e Olavo de Carvalho, religiosos, políticos, artistas, formadores de opinião, jornalistas e agora temos o fenômeno dos policiais que também estão ocupando importante papel nas disputas pela interpretação da realidade.
Recentemente diversos policiais manifestaram-se sobre o caso do massacre do Jacarezinho tendo como função primordial legitimar tal ação isentando a polícia civil e o estado de responsabilidade. É importante notar que a legitimação neste caso obedece a toda uma cadeia de informações. Se por um lado os intelectuais justificam tais atrocidades sofisticando de certa forma suas assertivas, temos por outro lado os próprios agentes da repressão confirmando as teses apresentadas corroborando todo um círculo de informações consolidando e arregimentando apoio para este projeto de sociedade altamente conservador e reacionário.
* Arthur Moura é cineasta (202 filmes), graduado em História (UFF) e mestre em Educação (FFP-UERJ).
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