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BRASIL

Hasta siempre, companheiro Gilsão!

Roberto “Che” Mansilla*, do Rio de Janeiro, RJ
Reprodução

Não tenho dúvidas que não sou a pessoa mais referenciada para falar de Gilson Alves de Jesus que nos deixou na tarde dessa sexta-feira, 16 de abril, por complicações decorrentes da Covid-19.  Digo isso por ter convivido com ele, por tão pouco tempo (4 anos), uma pena! Nos conhecemos em 2017, quando fui trabalhar na mesma escola que ele, em Higienópolis, onde lecionávamos para as filhas e filhos da classe trabalhadora de Manguinhos e Jacarezinho, no Rio de Janeiro. Naquele espaço de trabalho em comum, mas também de sociabilidade, conversávamos bastante sobre futebol (era um botafoguense apaixonado) e, em particular sobre política. Aliás, foram nessas conversas, nos corredores – antes de começarmos mais um dia letivo – e também fora da escola, em encontros que fazíamos (sempre regado a algumas cervejas bem geladas) que passei a conhecer e admirar um pouco mais a sua trajetória como militante. 

Gilson em churrasco na Confraternização da Escola Municipal Orosimbo Nonato, em 2017

A morte de Gilson Alves, para os companheiros Gilsão (não pela estatura dos seus 1,60 e poucos, mas pela grandeza do ser humano) é uma perda inestimável para o movimento social, em particular, o movimento popular de favelas. Como diz a nota divulgada pela COMACS Manguinhos (Comissão dos Agentes Comunitários de Manguinhos), ele foi um “lutador aguerrido de Manguinhos, lugar onde morou por muitos anos e sempre esteve presente nas lutas do território”.  Como todo morador desse espaço social, frequentemente lembrava a própria realidade de viver num território constantemente desrespeitado pelo Estado, com violações dos direitos humanos mais elementares. Tornou-se líder comunitário e fazia parte da Velha Guarda da Unidos de Manguinhos, onde sempre fazia questão de desfilar e também atuar politicamente na conscientização das variadas gerações.

Para além de sua militância social, Gilson Alves teve uma trajetória ligada a agrupamentos políticos sendo consequente com a máxima de Lenin de que a “prática revolucionária do proletariado deve ser antes uma questão de organização”. Assim, fez parte, em meados da década de 1980, do Coletivo Gregório Bezerra (CGB). Depois participou, em 1989, do agrupamento político Partido da Libertação Proletária (PLP) e, logo em seguida, conformou o PFS (Partido da Frente Socialista), de 1991 a 1992. Depois, com várias outras correntes que atuavam na Frente Revolucionária, fundaram, em 1994, o PSTU, de onde Gilson também fez parte. Em 2000, integrou o coletivo Movimento de Luta Socialista (MLS) que saiu do PSTU. 

Gilson, na época militante do PSTU, com os colegas Alfredo e Wagner, da UERJ-FFP (São Gonçalo), no final da década de 1990.


Por fim uma triste ironia. Hoje era para ser um dia de alento, pois teve início a vacinação dos profissionais de educação do ensino básico aqui no Rio de Janeiro. E estava feliz em ver amigas e amigos celebrando o SUS, a ciência salvando vidas e a dedicação dos colegas profissionais da saúde! Mas em tempos de pandemia e de um governo genocida de Bolsonaro, o desprezo pela vida, continua a fazer vítimas, como ocorreu ao nosso querido companheiro Gilson Alves. Ele vinha lutando contra a Covid-19 há mais de uma semana. Estava internado e precisou ser intubado nos últimos dias. Mas, infelizmente não resistiu e nos deixou na tarde de 16 de abril, após uma parada cardiorrespiratória. 

Desfilando pela Unidos de Manguinhos

Vivemos o pior momento da Pandemia. O Brasil superou 371 mil óbitos por Covid (com uma média acima de 2,5 mil) e, no Rio de Janeiro houve o recorde de mortes. Mesmo assim os governos estadual e municipal flexibilizam regras e até reabrem escolas, mostrando uma total falta de sensibilidade e de respeito com a vida dos profissionais de educação e alunos das escolas públicas. Tenho certeza que o Gilson denunciaria essa prática irresponsável. Mas, infelizmente, não deu tempo.

Na maior tragédia humana e social de nossa geração, cuja principal responsabilidade é sem dúvida do governo genocida de Bolsonaro (e dos flertes com o negacionismo de muitos governos de plantão) fica a lembrança do companheiro Gilsão, cuja síntese de perseverança pode ser lembrada nas palavras de Catito Luiz Antônio, um de seus mais queridos companheiros de militância quando diz:

“Estamos aqui, Gilson, em guarda, uns com mais energia, outros com menos. Recomeçando e tropeçando em cada derrota, porque não nos resta outra coisa, SENÃO LUTAR! Não existe outra coisa a fazer. Simples assim, como você sempre me dizia”.

Companheiro Gilsão presente!
Agora e sempre!

 

 

* Roberto “Che” Mansilla é professor de História da rede municipal do RJ e militante da Resistência/PSOL