Este escritor busca refletir, de forma limitada, é verdade, acerca de algumas possibilidades futuras, da história recente e de caminhos para esquerda brasileira com base na atual conjuntura marcada pelo governo genocida na Presidência, a elegibilidade de Lula e as discussões acerca do futuro político no país e das estratégias diante do mesmo.
A conciliação de classes foi a estratégia de governança petista tanto no período Lula (2002-2010) quanto no período Dilma Rousseff (2010-2016) começando com a famosa “carta aos brasileiros” e José de Alencar (PL) na vice da chapa culminando no golpe institucional de 2016 que levou lamentavelmente Michel Temer à presidência. Tal cenário de anos não pode e nem deve se repetir a partir de 2022 confirmada a candidatura de Lula nas eleições e sua possível vitória diante de Jair Bolsonaro em um provável segundo turno. Não pode porque no atual estágio de desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo brasileiro e somadas as múltiplas crises e instabilidades que o assolam (ao nível sanitário, econômico, político, ambiental etc.) a burguesia necessita, mais do que nunca na história recente, de contrarreformas em diferentes âmbitos que permitam manter e até aumentar suas taxas de lucro em detrimento da retirada de inúmeros direitos (sociais, previdenciários, trabalhistas etc.) da classe trabalhadora. Não está a excluída a possibilidade de que o Estado atue em algum grau para mitigar a pauperização e a queda do nível de vida da população, mas a burguesia brasileira não e qualitativamente semelhante à burguesia inglesa ou à norte-americana, para citar apenas dois exemplos. Ela necessita de extrair mais-valia dos trabalhadores tanto para si quanto exportar para as burguesia externas que aqui detêm seus investimentos, cada vez mais – esta é a dinâmica de um capitalismo dependente e periférico, certo? E tornar o país atraente ao capital externo, lembremos, ela precisa que acelerem as contrarreformas, chamadas eufemisticamente de modernizantes pela grande mídia empresarial. Não pode, também, porque o ciclo de alta das commodities, sustentáculo da política de distribuição de renda e inclusão social PT durante anos não está mais presente. Não pode porque a instabilidade pela qual passa o capitalismo internacional desde 2008 trouxe um turbilhão catastrófico de efeitos ao Brasil, agravada com a pandemia – a marolinha converteu-se em um problema de graves proporções. Não pode porque a classe dominante tem de forma clara um conjunto de reinvindicações para o futuro presidente que dificilmente se encaixariam nos marcos de um novo pacto nacional entre o capital e o trabalho à moda do ciclo 2002-2016. A mesma classe dominante que conspirou para a subida do protofascista Jair Bolsonaro ao poder com uma política econômica reacionária iniciada já no ajuste fiscal supostamente tímido do governo Dilma Rousseff e aprofundada na presidência de Michel Temer tem em seu íntimo o desejo de reedição da administração “humanitária” do capitalismo tupiniquim?
Em uns casos como em outros, o que não pode é, dialeticamente, também, o que não deve acontecer após 2022. Seriam necessários um conjunto de mudanças conjunturais e mesmo estruturais qualitativamente quase impossíveis, não? A história não caminha para trás.
Ora, há um aspecto do que não deve se repetir que é, inclusive de vital importância para os revolucionários diante do atual cenário político. Deve se repetir uma administração que guarda em si mesma a preparação para um futuro golpe reacionário da direita? Deve se repetir uma futura preparação para um governo da extrema-direita golpista? Deve se repetir a ilusão de que com minirreformas e medidas mitigatórias é possível a longo prazo subverter a ordem política ou (quando não se tem por intento sequer qualquer subversão) ser permanentes a longo prazo? Se a resposta para essas e outras perguntas semelhantes nos é óbvia, parece não certa parte da esquerda. Devemos governar pela esquerda e tão somente com as massas proletárias nos marcos de um governo pró-trabalhadores? Esse parece ser um horizonte segundo o qual formular estratégia e elaborar táticas em múltiplos aspectos, seja em batalhas no seio da vanguarda para definir o que fazer como na aglutinação nas massas visando a construção de uma revolução brasileira e, o que é mais imediato, possível necessário, a revogação das contrarreformas dos últimos anos e o avanço na organização política da classe trabalhadora com saltos significativos em sua consciência de classe. É o caminho? Uma vez mais, lembremos do que não pode e não deve se repetir, tanto a nós mesmos como para os de aparente memória curta que habitam os quatro cantos do país.
*Militante da Resistência-PSOL.
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