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BRASIL

Pior momento da pandemia em São Paulo: são necessárias medidas urgentes para enfrentá-lo

Resistência SP
Paulo Pinto/FotosPublicas

São Paulo 19/12/2020 Movimento na Rua 25 de Março e Ladeira Porto Geral no último fim de semana antes do Natal

No primeiro mês de 2021, o Brasil olhou para o estado de São Paulo com a esperança da vacina. Os aplausos pela existência de vacinas produzidas no Brasil devem ser todos direcionados aos profissionais do Instituto Butantan. Esta instituição pública é vinculada à USP, uma universidade pública estadual, que há muitos anos é atacada pelos sucessivos governos do PSDB, inclusive o de João Dória, que se aproveitou do feito para suas ambições políticas e eleitorais.

Apesar desta conquista, a marca do mês de janeiro no estado não é de avanço da vacina e de recuo da pandemia. Muito pelo contrário. Segundo dados do próprio portal de notícias do governo do estado, “o mês de janeiro bateu recorde de novos casos de COVID-19, chegando a 268.997 infecções confirmadas até o dia de hoje” (27/01/21). São quase 7 mil novos casos a mais que os do mês de agosto, que era até então o mês com recorde de casos, com 262.038. O estado registra 1 óbito a cada 6 minutos. Em 8 de janeiro, as taxas de ocupação de leitos de UTI em todo o estado era de 62% e no dia 20, já superou os 70%. Soma-se a esses números, o fato de já haver em São Paulo pessoas infectadas com a nova variante do vírus, que surgiu em Manaus. Os pesquisadores e cientistas ainda não sabem se essa variante é mais letal e se a vacina tem condições de combatê-la, mas já alegam que se trata uma variante com maior transmissibilidade.

Com mais de 50 mil novos casos registrados por dia, já é possível dizer que estamos no pior momento da pandemia no Brasil e no estado de São Paulo. Sem a existência comprovada de nenhum remédio ou tratamento eficaz, esses dados reforçam a necessidade de investimento na produção de vacinas e de ampliação das medidas sanitárias, como o isolamento social e a utilização das máscaras.

Evidentemente, essa situação é resultado de uma condução desastrosa, negacionista e genocida por parte do governo Bolsonaro. Não se trata de simples incompetência. Bolsonaro, Guedes e seus generais querem que o vírus se espalhe e sempre apostaram na irresponsável tese da imunidade de rebanho levando o país para a atual situação de catástrofe, como vimos em Manaus. Agora, Guedes hipocritamente fala que a vacina é decisiva para a economia. Lutar pelo “Fora Bolsonaro” é parte das medidas sanitárias e de defesa da vida do povo brasileiro.

Desde que a pandemia começou, o estado de São Paulo já registrou mais de 1,7 milhão de casos e 51.838 óbitos. O governador João Dória investiu na luta contra o negacionismo de Bolsonaro e apresentou algumas iniciativas de enfrentamento à pandemia, materializado no Plano São Paulo. Entretanto, seu compromisso com os grandes empresários, não permitiu uma quarentena efetiva. Apesar de seu embate com o governo federal, que o transformou em um grande vilão para a base bolsonarista, a verdade é que suas medidas foram extremamente insuficientes para evitar a tragédia que mais de 50 mil mortes em São Paulo representam.

Nos primeiros meses da pandemia, o próprio governador admitiu que 74% da economia não parou de funcionar. Dentre esses setores, muitas áreas não essenciais. O Plano São Paulo possui 5 fases, caracterizadas por mais ou menos restrições de abertura de comércio, shoppings, parques, locais que podem promover aglomerações. Nem na fase mais restrita, a chamada fase vermelha, houve, por exemplo, um plano direcionado aos transportes públicos, que são o segundo local com maior risco de contaminação pela Covid19. Tampouco houve a testagem em massa, para identificar os casos da doença e sequer alguma medida que garantisse uma versão estadual do auxílio emergencial, para viabilizar as medidas de isolamento social sem que isso significasse o aumento da crise social e econômica.

O resultado dessa insuficiência foi a concentração das contaminações e mortes entre o povo pobre e preto da periferia, que não pôde parar de trabalhar, que enfrentou superlotação nos transportes públicos e quando ficou doente, enfrentou as filas e saturação dos leitos. Os pequenos empresários, donos de pequenos negócios, viram nas medidas de restrição um grande inimigo do seu “ganha pão” e isso criou um ambiente totalmente inóspito para aprofundar as medidas de restrição.

Auxílio Emergencial e medidas sociais para ampliar o isolamento

Defendemos que sejam tomadas medidas que contribuam para a ampliação do isolamento social. Sabemos que a população está cansada dessa situação, mas é fato que a situação da pandemia está muito grave. Uma das formas de evitar que mais pessoas circulem é a garantia de um auxílio que possa amparar as pessoas que não conseguem trabalhar diante do isolamento social. Apesar de o país ter assistido a uma grande queda de seu Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, a verdade é que essa queda foi menor do que em 176 países e o motivo disso foi a existência do auxílio emergencial. Agora com seu corte, a tendência é haver mais um trimestre de queda e o país se enquadrar tecnicamente em um quadro de recessão econômica. O governo do estado deveria ter desenvolvido um plano de assistência social também em sua versão estadual, para atingir mais famílias e evitar a combinação dramática da crise sanitária com a crise econômica e social.

A Bancada Feminista do PSOL, mandato coletivo, elaborou seu primeiro projeto de lei que defende uma renda básica emergencial para a população paulistana e que possa vigorar até o final do plano de imunização. As covereadoras da Bancada Feminista batalham pelo fim do recesso parlamentar para que esse projeto e outras medidas de emergência possam ser votadas e o poder público enfrente o pior momento da pandemia na cidade.

Combinado ao auxílio emergencial, para ampliar o isolamento social, é necessário ter mais medidas sociais como a proteção ao emprego e a garantia de linhas de crédito para os pequenos proprietários poderem manter seus negócios e não demitir funcionários. Muitos trabalhadores e donos de comércio, restaurante, academias se consolidaram como base social anti medidas de isolamento porque elas se configuram um obstáculo concreto para seu sustento e de suas famílias. Os bancos devem ser estimulados pelo governo para que as linhas de crédito sejam ampliadas. No dia 27/01, muitos desses trabalhadores e pequenos proprietários se reuniram na Avenida Paulista pedindo o fim das restrições, justamente no período em que as contaminações mais cresceram. Reproduziram a equivocada campanha que esta mesma base social fez em Manaus e teve a consequência dramática da saturação dos leitos e do oxigênio na cidade.

Os serviços que podem ser realizados em home office devem ser assim mantidos ou amplia-los, sem que isso signifique ataque aos direitos trabalhistas e sociais desses trabalhadores.

Para que um “Plano São Paulo” seja uma efetiva garantia de proteção da vida e ampliação do isolamento social, o governo do estado deve deixar de bancar seus compromissos com os grandes empresários e bancos do estado, para que o povo pare de ficar doente e de morrer.

Ampliar a rede de hospitais e leitos

Quando a pandemia começou, os governos do estado e do município construíram hospitais de campanha em detrimento de abrir novos hospitais e de garantir o funcionamento pleno de alguns hospitais já abertos, como o Hospital Sorocabana e o Hospital da Brasilândia. Além disso, nem Dória, nem Covas construíram hospital de campanha na zona leste, região mais atingida pelos casos e mortes por Covid19. É fundamental a abertura integral dos hospitais da rede pública, com mais leitos de UTI, mais profissionais concursados e todos os recursos para que São Paulo não veja reproduzir o que ocorreu em Manaus, com falta de insumos básicos, como oxigênio.

Volta às aulas só com vacina!

Apesar do discurso do governo estadual e municipal de enfrentamento à pandemia, os profissionais da educação, mães e pais de alunos tiveram que enfrentar várias tentativas irresponsáveis de retornos às aulas. As aulas não voltaram no segundo semestre de 2020 por conta da resistência dos professores e das comunidades de pais e mães de alunos que estavam amplamente contrários ao retorno das aulas diante de um cenário de alta contaminação. Mesmo diante do atual cenário, que está mais grave, Dória e Bruno Covas impõe o retorno dos professores às escolas, sem nenhuma garantia de reformas estruturais que permitam um ambiente seguro para o retorno às aulas.

É verdade que os jovens precisam retomar sua vida e ensino escolar, assim como é verdade que as mulheres mães estão acumulando tarefas com a presença de seus filhos em casa. É exatamente por isso que é necessário ter um plano efetivo de vacinação para todos, com prioridade para os profissionais da educação. Enquanto isso não ocorre, é necessária a garantia de internet livre para que professores e alunos possam ter condições dignas de trabalho e estudo em casa, assim como a garantia de condições materiais para que as famílias trabalhadoras possam ficar com seus filhos em casa e a garantia do auxílio merenda e da cesta básica.

Plano de Emergência no transporte público!

 O segundo local com maior risco de contaminação são os transportes públicos. No início da pandemia, houve redução significativa de passageiros, mas neste momento, que se enquadra como um dos momentos mais dramáticos da pandemia, a superlotação voltou a tomar conta dos transportes públicos. Já foram centenas de profissionais do transporte que faleceram por Covid19 e milhares que se contaminaram. Para que os transportes não sejam um vetor de contaminação, é necessário que seus profissionais sejam enquadrados entre as prioridades da vacina, que haja mais trem, metrô e ônibus disponível para que não fiquem superlotados e que haja medidas que garantam que circulem muito menos pessoas do que estão circulando hoje. Não cabe também neste momento dramático o ataque a direitos sociais, como corte da gratuidade dos idosos de 60 a 64 anos. É claro que defendemos que a maior parte dos idosos fique em casa, mas isso não é viabilizado através de um ataque a um direito social fundamental, até porque muitos maiores de 60 anos precisam trabalhar porque não conseguem se aposentar e não tem acesso a nenhum tipo de auxílio emergencial.

Vacina para todos!

Foi importante o ponto de partida dado pelo Instituto Butantan e pela FioCruz. No entanto, o Brasil amarga as consequências das péssimas relações diplomáticas do governo Bolsonaro e das ações protecionistas dos países produtores de vacina. Soma-se a isso o fato de que a produção de vacinas está sob responsabilidade das companhias farmacêuticas privadas, que recebem grande financiamento estatal e depois lucram com o patenteamento do conhecimento e dos procedimentos para produzi-las.

O Brasil sempre foi um modelo de campanhas de imunização, por consequência da existência de um sistema público de saúde. Precisamos de um plano de vacinação que abarque a compra dos insumos necessários, que os orçamentos públicos priorizem essas compras e que este processo comece pelos grupos de risco e profissionais ligados a serviços essenciais, como saúde, transporte e educação. Defendemos a prioridade estabelecida também sobre as populações indígenas e quilombolas e achamos que ela deve se estender para a população de rua e para a população carcerária.

Segundo levantamento da Articulação de Povos Indígenas (APIB), no dia 13/01, a população tradicional já estava com 45.000 infectados no país e 920 mortes. Até agosto de 2020, a Secretaria de Estado da Saúde (SES-SP) indicava 688 casos positivos em Terras Indígenas em São Paulo, o que representa 9,88% de uma população total de 6.963 pessoas. A grande maioria dos casos estava concentrada na capital. Segundo a Fiocruz, povos indígenas são altamente vulneráveis às infecções respiratórias agudas, o que resulta em altas taxas de ataque, internações e óbitos. Dentre as comunidades quilombolas, a última apuração de casos, em 11/01, demonstrou que 4.700 quilombolas foram contaminados e houve 179 óbitos.

O último censo da população de rua na capital paulista, em janeiro de 2020, demonstrou que quase 25 mil pessoas vivem nessa situação, um crescimento de mais de 50% em relação ao ultimo censo de 2015. Por essa situação de vulnerabilidade, não existem dados precisos de casos de vítimas pela COVID-19, entretanto, exatamente por essa vulnerabilidade, pela falta de acesso aos serviços públicos e pela ausência total de condições dessa população ter medidas de isolamento social e de higienização é que também devem ser parte dos grupos prioritários da campanha de imunização.

A população carcerária também deve estar entre as prioridades. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), há 759,5 mil presos no sistema penitenciário brasileiro, sendo 216 mil no estado de São Paulo. As condições de concentração e aglomeração de pessoas no sistema prisional, assim como as péssimas condições estruturais de higiene e acomodações promoveu um crescimento exponencial da contaminação entre a população carcerária em todo o pais, chegando a crescer quase 300% em apenas 90 dias, entre julho e outubro de 2020.

Acreditamos que esses dados dão motivos suficientes para que indígenas, quilombolas, população de rua e população carcerária estejam entre os grupos prioritários, junto com os profissionais da área da saúde, do transporte e da educação, assim como a população idosa. É evidente que para esse plano de efetivar, é necessário a garantia de vacinas, porque a situação atual é que não há vacinas suficientes nem para os profissionais da saúde e população idosa.