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BRASIL

Notas sobre as eleições 2020 em Sergipe: a hegemonia da direita, os erros e acertos da esquerda e o crescimento do PSOL

Coordenação Regional da Resistência/PSOL Sergipe
Divulgação / PSOL Aracaju

Professora Sonia Meire, 1ª suplente, e Linda Brasil, vereadora eleita em Aracaju

Encerradas as eleições, é importante avaliar e pensar os próximos passos. Desta vez, uma eleição atípica por conta da pandemia de coronavírus, do desgoverno genocida de Bolsonaro e dos altos índices de abstenção. Esse breve texto é uma contribuição da Resistência Sergipe para refletir o processo eleitoral e o crescimento do PSOL no estado.

Diante do quadro geral da política brasileira tínhamos de dar conta de uma dupla tarefa no processo eleitoral: Enfrentar o ‘bolsonarismo’ e disputar as cidades para a maioria trabalhadora. Aproveitar as eleições para intensificar a resistência ao governo Bolsonaro e seu projeto de autoritarismo, retirada de direitos, extermínio e destruição ambiental, pois não é possível isolar o rumo das cidades do debate nacional. Ao mesmo tempo, essa denúncia precisava se combinar com a apresentação de propostas concretas, dentro de um modelo de cidade democrático, inclusivo, garantidor dos direitos sociais, do respeito ao meio ambiente e comprometido com o fim de toda opressão. Um projeto de cidade verdadeiramente construído com a maioria para a maioria.

Sergipe: PSD e Governo Belivaldo saem fortalecidos

Seguindo a tendência nacional, o quadro em Sergipe mostra um índice alto de reeleição. Foram 30 prefeitos reeleitos em todo o Estado. Politicamente, a vitória ficou sob o comando do PSD – o partido do governador Belivaldo, liderado pela família Mitidieri. O PSD venceu 20 prefeituras e 22 vice-prefeituras. Em segundo lugar vem o MDB com 9 prefeituras. Em terceiro, empatados, o PSC de André Moura e o PP de Laércio com 8 prefeituras cada. Esses quatro partidos juntos formam o bloco que venceu Aracaju, Barra dos Coqueiros, Nossa Senhora do Socorro e São Cristóvão, cidades que concentram praticamente metade do eleitorado sergipano.

A vitória desse bloco representa o agronegócio, destruição ambiental e das comunidades no litoral norte com a implantação da termoelétrica. Representa o desmonte e a desvalorização dos direitos sociais e dos servidores públicos. Um governo que defende a privatização e submisso aos grandes empresários do setor de serviços. De acordo com dados do Anuário Socioeconômico de Sergipe, o estaddo está com altos índices de desemprego, miserabilidade, crescimento de mortes de homens e mulheres jovens e estagnação do IDH – índice de desenvolvimento humano. Infelizmente a vitória do bloco de Belivaldo/Mitidieri/Laércio representa a continuidade da falta de uma política estratégica de desenvolvimento para o estado.

Uma das causas que podem explicar essa hegemonia, além do forte poder econômico, é a ampla composição do bloco, que vai desde setores bolsonaristas como Láercio Oliveira, passando por quadros da velha direita sergipana do DEM e PSC, por exemplo, até setores de esquerda, movimentos e partidos como PT e PCdoB.

Reeleição de Edvaldo, dificuldades da esquerda e a importância da campanha “Alexis e Carol”

Por se tratar da capital, a eleição em Aracaju tem uma maior visibilidade. É uma vitrine importante da disputa política no estado. Mesmo com as candidaturas diretamente identificadas com Bolsonaro como a delegada Danielle e Rodrigo Valadares alcançando um desempenho razoável, a reeleição de Edvaldo ocorreu com certa folga. Por que foi dessa forma? Ele afirma que a cidade tem avançado e está em boas mãos, que foi um bom prefeito durante a pandemia e vai fazer “muito mais”. Mas essa é apenas uma aparência. Uma capa que esconde os verdadeiros motivos. Em nossa opinião alguns fatores ajudam a explicar essa reeleição.

Primeiro, garantiu obras de asfaltamento em alguns bairros que garantem ao mesmo tempo empregos e melhorias pontuais. Isso foi pouco, mas no conjunto da média dos políticos em uma situação de pandemia, o sentimento que prevaleceu foi o “melhor pouco que nada”. Segundo, Edvaldo buscou não entrar no debate do governo Bolsonaro, tentando passar uma ideia de gestão técnica, sem ideologia. Isso é enganoso e deseducativo, mas pragmaticamente fisga eleitores independente do espectro político se mostrando como “gestor” e não como “político”. Terceiro, pelos limites impostos com a pandemia, cresceu a visibilidade do prefeito, pois a população teve dificuldade para se mobilizar. Em quarto lugar, foi uma campanha milionária, totalizando gastos de mais de 4 milhões. Por último, a divisão da esquerda impediu uma chapa forte de oposição.

Faria diferença sim uma chapa unitária da esquerda na escolha dos rumos de Aracaju. Uma chapa conjunta entre PSOL, PT e PSTU, por exemplo, disputaria com chances reais o segundo turno na capital. Mas, diferente de outras cidades do país não foi possível avançar na composição. Apesar dos diversos apelos, o PT optou por permanecer como parte estratégica de sustentação do governo Belivaldo. Avaliamos que é um erro político o PT se manter aliado a esse governo de direita, pois na prática, essa tática coloca uma barreira permanente para fortalecer a unidade da esquerda sergipana.

Mesmo com essas dificuldades, o PSOL teve uma campanha militante, equilibrada e propositiva.  Apesar do pequeno espaço na imprensa, foi possível afirmar a defesa de um projeto de Aracaju para a maioria, com foco na participação popular. Alexis e Carol representaram uma candidatura negra e feminista que posicionou um perfil político conectado com as lutas e simbolizou a renovação de quadros políticos da esquerda sergipana. Foi, sem dúvidas, a principal campanha “Fora Bolsonaro” na cidade. A campanha majoritária do PSOL contribuiu ainda para o fortalecimento da chapa de vereadoras e vereadores, que culminou com uma grande vitória.

As votações históricas de Linda Brasil, Sonia Meire e o salto do PSOL

Para a câmara de vereadores o PSOL entrou para a história. Não apenas elegeu a primeira vereadora trans de Aracaju como também Linda Brasil foi a mais votada da cidade. Uma vitória que é resultado não apenas da trajetória militante de Linda, mas também expressa a força do movimento LGBT+ e do PSOL como um partido da diversidade. A professora Sonia Meire que também fez uma belíssima campanha foi a oitava mais votada da cidade, mas infelizmente não entrou devido a legenda, ficando como primeira suplente.

Nesse sentido, o PSOL que antes falava apenas para a militância de esquerda, hoje ocupa um espaço de visibilidade que fala para toda a sociedade. É importante registrar que não aceitaremos ataques, como já estão ocorrendo desde o fim das eleições, com mensagens transfóbicas e discriminatórias. Da mesma forma, defenderemos uma atuação exemplar no parlamento, contribuindo para que a “mandata” seja uma ferramenta coletiva da militância e um ponto de apoio para as lutas populares. Com a ocupação dos primeiros espaços na institucionalidade, o partido deve dar um salto político e organizativo no próximo período.

Uma crítica à política de alianças do PSOL em Estância e a necessidade de reconstruir o partido

Em Estância, o PSOL disputou a eleição para a prefeitura pela quarta vez com o companheiro Márcio Souza que vinha em crescimento a cada ano, com chances reais de vitória. Caso fosse eleito, teríamos a primeira prefeitura do PSOL em Sergipe. Contudo, diferentemente das outras eleições, Márcio ampliou as alianças para partidos conservadores como o PSB da família Valadares, indicando o candidato a vice, e alianças com grupos de direita como Valdevan 90 e até mesmo ‘bolsonaristas’ como Ivan Leite. Essas alianças desmoralizaram o PSOL, afastaram quadros importantes que se desfiliaram e, finalmente, o partido foi derrotado nas eleições.

Por outro lado, o PSOL elegeu dois vereadores, os companheiros Evandro da Praia e Isaias Nego Bia. Há uma grande expectativa em torno dos primeiros mandatos do partido na cidade. Por isso, devemos tirar as lições de todo o processo eleitoral e ocupar a câmara de vereadores com uma política independente das oligarquias e grupos políticos de direita. É urgente a reconstrução do partido no município sob as bases políticas estratégicas de compromisso com o socialismo.

Lutar pelo Fora Bolsonaro, unificar a esquerda e fortalecer o trabalho de base

Boa parte da imprensa e dos comentários políticos já falam em 2022. De forma ideológica, querem nos passar uma ideia que a única forma de mudança é por meio do voto e, portanto, devemos esperar até as próximas eleições. Contudo, nosso povo tem urgência! A fome, a falta de um teto, crianças sem escola, genocídio da juventude negra, redução e incerteza do auxílio emergencial, ausência de um plano nacional de vacinação, entre tantos problemas precisam ser resolvidos.

Por isso, precisamos nos organizar para a luta imediata em 2021. As eleições estão longe e cada dia que Bolsonaro passa na presidência é mais um dia de exploração e morte para o nosso povo. É momento de intensificar a campanha pelo “Fora Bolsonaro”, por meio do seu impeachment. A necessidade da luta unitária contra a extrema direita continua na ordem do dia. O movimento ‘bolsonarista’ não será derrotado apenas pela via eleitoral e precisamos da máxima unidade da esquerda e todas as forças populares numa frente única.

A luta pela derrubada de Bolsonaro se complementa com a luta contra o governo Belivaldo Chagas que também não atende os anseios do povo sergipano. Temos que intensificar o trabalho de base. Organizar o povo sergipano em cada cidade, em cada povoado, quilombo e assentamento. Com o maior protagonismo que o PSOL assume a partir dessas eleições, um dos desafios para o próximo período é enraizar o partido, construir uma alternativa política de esquerda do litoral ao sertão.