Na última terça-feira, o interventor militar no Ministério da Saúde, General Pazuello, explicitou mais uma vez sua subserviência à política negacionista do governo Bolsonaro e deixou claro não ter nenhuma pressa para resolver o problema da pandemia no país. Uma semana antes, havia anunciado um cronograma de vacinação que se estenderia por todo ano de 2021 e segundo a qual no final deste pelo menos metade da população ainda não estaria imunizada.
ENGLISH Vaccines for all now! A national vaccination policy is urgently needed
O objetivo desta lentidão é evidente: enquanto a vacinação não for universalizada, seguiremos com transmissão comunitária, e com isto o governo seguirá “passando a boiada” das contrarreformas e ataques aos serviços públicos e aos direitos trabalhistas. É uma política criminosa. Prolongar e agravar a pandemia é o eixo da política do governo Bolsonaro desde março e continua sendo agora. Neste momento, esta perspectiva implica excluir a maior parte das vacinas, de eficácia já comprovada ou com pesquisas em fase final de desenvolvimento, e restringir as negociações de compra a apenas uma vacina.
A construção da tragédia
O governo Bolsonaro é diretamente responsável pela dimensão da tragédia no Brasil. Desde março, e especialmente desde o trágico pronunciamento de Bolsonaro em 24 de março, todas as iniciativas do governo Bolsonaro buscaram acelerar a contaminação, seja minimizando a pandemia, propagando fake news, participando de aglomerações ou promovendo medicamentos ineficazes. Em tese, sua política se justificaria pela intenção de superar a pandemia atingindo a “imunidade coletiva”, e não é por acaso que Bolsonaro afirmou dezenas de vezes que o problema só seria “resolvido” quando 70% da população tiver sido contaminada.
Hoje temos oficialmente 3% da população contaminada. Mesmo que o número real de casos seja sete vezes o número de confirmados (como apontam a maioria das pesquisas de subnotificação de COVID-19 no Brasil), ainda assim seguimos muito distantes de qualquer estabilização decorrente do alto número de contaminações. Estamos chegando oficialmente a 180.000 óbitos confirmados para Covid, sem considerar outros 68.923 óbitos registrados como Síndrome Respiratória Aguda Grave não especificada (números de 1º/12, data do último dado disponível). Estes óbitos, em sua quase totalidade, são também decorrentes de Covid, e portanto, estamos com aproximadamente 250.000 óbitos, e ainda muito longe da imunização via contágio.
O momento atual da pandemia no Brasil
O Brasil vive um momento dramático. Apesar da testagem insuficiente, estamos há quatro semanas com crescimento acelerado do número de casos. Tivemos 118.101 casos registrados na Semana Epidemiológica 45 (1º a 7/11) e passamos a 286.905 casos na semana 49 (29/11 a 5/12), um crescimento de 143%. Este crescimento ocorre simultaneamente em quase todos os estados do país. Para piorar, estamos na iminência do colapso do sistema de saúde em diversas regiões do país. Neste momento, ao menos 10 capitais já tem mais de 80% dos leitos ocupados, e, no Rio de Janeiro, quase 500 pacientes com Covid aguardam leito para internação.
Antes mesmo do início do verão, nos aproximamos de 50.000 novos casos diários, e o discurso negacionista mantém sua força, defendendo a manutenção de uma “normalidade” que implica em compras de Natal, festas de final de ano e férias de verão. Ou seja, manter e ampliar deslocamentos e aglomerações. Uma combinação terrivelmente explosiva no estágio em que nos encontramos.
A urgência da vacinação
Neste momento, a maior parte dos países está negociando simultaneamente com as várias empresas que produzem vacinas, em uma acirrada disputa. Logicamente, todos pretendem ter o maior número de doses o mais rápido possível. A pressa é justificada para todos, mas deveria ser ainda maior no Brasil, país que registra o segundo maior número de novos casos no mundo nos últimos dias.
No entanto, esta claramente não é a prioridade do governo. Enquanto Bolsonaro inaugura uma patética exposição de trajes, Pazuello reafirma uma proposta de vacinação imprecisa, inconsistente e insuficiente. Além de falhas inaceitáveis (como a ausência de planejamento para aquisição de insumos básicos como agulhas), sua maior deficiência é a aposta exclusiva em uma única vacina, a Astrazenca (Oxford). Ainda que tudo corresse perfeitamente bem, seria insuficiente, pois só será possível obter o número necessário de doses combinando vacinas de diferentes empresas, à medida em que concluam suas pesquisas e comprovem sua segurança e eficiência – e é por isto que praticamente todos os governos realizam negociação simultânea com várias empresas.
No entanto, a vacina “eleita” por Bolsonaro e Pazuello é justamente a que teve mais problemas, com inconsistências e equívocos no processo de pesquisa, como a administração de “meia dose” decorrente de erro de dosagem. Nesta situação, o procedimento correto seria refazer todo o processo de pesquisa, o que inevitavelmente atrasaria em vários meses sua liberação. No entanto, Pazuello anuncia o início da vacinação com esta vacina para março, o que escancara a falsidade das alegadas preocupações com segurança e comprovação e mostra que a opção é estritamente política e ideológica.
A política de vacinação tem que ser nacional
Na ausência de políticas nacionais concretas, é compreensível que sejam propostas alternativas regionalizadas. Esta não é, no entanto, a melhor alternativa. Precisamos interromper a transmissão comunitária do vírus o mais rápido possível, e só uma política nacional de vacinação, de caráter universal, pode produzir este resultado.
É claro que há limitação de doses (e por isto é imprescindível negociar simultaneamente com todas as empresas) e por isto a vacinação deve se dar por fases priorizando os mais vulneráveis, mas é inaceitável prever encerrar o ano de 2021 sem imunização de toda a população. Esta posição explicita a intenção de prolongar indefinidamente a pandemia e seus desastrosos efeitos sociais, políticos e econômicos, e sobretudo a expropriação de direitos sociais e trabalhistas que este contexto enseja. Mesmo o discurso de Bolsonaro de “preservação da economia” não se sustenta, pois por maior que seja a tentativa de impor uma “normalidade” artificial, os custos decorrentes do prolongamento da pandemia são enormes, muito superiores inclusive ao que se investiria para imunizar a população.
Talvez a única afirmação correta de Pazuello em seu recente pronunciamento seja a de que a política de vacinação tem que ser nacional. No entanto, é inegável que em seu discurso esta afirmação esconde (muito mal) a intenção de simplesmente sabotar as medidas de redução de danos adotadas pelos estados, como se comprova pela afirmação absurda de que depois de publicados os resultados seriam necessários 60 dias para que a Anvisa autorize o registro – um critério que parece que só vale para as vacinas “inimigas”, já que no mesmo discurso promete vacinação com a Astrazeneca para março.
O governador de São Paulo João Dória claramente tenta tirar proveito político da situação e se apresentar como “racional” e “preocupado com a situação sanitária”. Depois de ser alvo dos bolsonaristas por defender algumas medidas de contenção, Dória passou a defender a aceleração da reabertura, sem qualquer critério técnico razoável, e mais recentemente omitiu dados de contaminação durante o período eleitoral, produzindo uma falsa sensação de estabilização da pandemia. Também é irresponsável ao marcar a data de início da vacinação com uma vacina que, embora promissora, ainda não concluiu os testes. O que o move, claramente, é intenção de promoção política e não uma oposição efetiva à política bolsonarista – o que, aliás, se comprova pela sua identificação com a pauta de ataques aos direitos sociais e trabalhistas.
O Sistema Único de Saúde é um patrimônio de todos os brasileiros. Sua experiência no desenvolvimento de planos nacional de vacinação é impressionante. Poucos países do mundo contam com os recursos e a experiência que temos com vacinação no Brasil. Basta a intenção política e um planejamento eficiente, que as condições técnicas e profissionais existem. A omissão do governo Bolsonaro constitui crime de responsabilidade e crime contra a vida dos brasileiros e não pode ser tolerada. É imprescindível, urgente e necessário impor a concretização de uma política nacional de vacinação. É fundamental que o conjunto dos trabalhadores e oprimidos, por meio das suas várias formas de organização, tenha como eixo central esta reivindicação. A luta por um plano nacional de vacinação, assim como pela manutenção e aumento do auxílio emergencial, é urgente. Trata-se de uma luta pela vida e, em nome desta, faremos, se preciso for, uma verdadeira “revolta pela vacina” contra Bolsonaro.
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