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MUNDO

Estados Unidos: as lutas de hoje por local de trabalho

Adam Shils*

Tradução: Ge Souza

A provável queda de Trump dominou o noticiário nas últimas semanas. Neste artigo, propomos examinar um aspecto muito diferente da situação nos Estados Unidos. Qual é a situação da luta de classes? Onde está o conflito entre empregadores e trabalhadores hoje?

Pequenas greves

O primeiro ponto a observar é que o número de greves é muito baixo. Os últimos dados disponíveis são os de setembro. As greves de setembro foram divididas em duas categorias. Em primeiro lugar, há a greve muito importante no Hospital da Universidade de Illinois, que já foi comentada neste site. Essa greve envolveu aproximadamente 4.500 trabalhadores. Em segundo lugar, houve algumas pequenas greves locais. Isso incluiu ações nos locais de trabalho na Reith Riley Construction, Hood River Distillers, Langeloth Metallurgical, Miller Tool&Die, NLMK Steel, Johnson Controls e no Highland Park Nursing and Rehabilitation Center, em Michigan. No total, essas greves envolveram apenas 5.618 trabalhadores.

O BLS (Bureau of Labor Statistics) coleta apenas estatísticas sobre as greves que tiveram negociação, e em locais de trabalho com mais de 1.000 trabalhadores. Este órgão calculou que os dias perdidos por paralisações ou greves ocorridas em setembro equivalem a menos de 0,005% do tempo total de trabalho. A proporção é a mesma em locais de trabalho maiores.

Por que os trabalhadores relutam em se arriscar emgreves agora não é nenhum mistério. A combinação da crise econômica e o ressurgimento da COVID19 colocaram a classe trabalhadora em uma situação muito difícil. Trabalhadores de restaurantes e hotelarias foram afetados pelo fechamento de suas empresas. Muitos empregos vão desaparecer para sempre. A estabilidade no emprego é muito frágil. Nessa situação, a melhor opção para muitos trabalhadores é a cautela, não o confronto.

A greve na ReConserve

Se examinarmos um desses pequenos conflitos com mais detalhes, entenderemos melhor a situação. ReConserve é uma empresa fabricante de rações para animais com sede fora de Chicago, em Hodgkins. A planta pode ser reconhecida graças a uma torre alta que pertencia a um antigo moinho. O trabalho está insalubre e o material é perigoso. Vinte e seis trabalhadores, principalmente latinos representados pelo sindicato UFCW Local 881, estão em greve exigindo um contrato de trabalho. A paridade salarial com outras fábricas da ReConserve e com outras fábricas no parque industrial de Hodgkins também é uma questão central.

A linha de piquete está um tanto escondida atrás de uma rodovia que marca o limite da zona industrial, fora da estrada principal. Os trabalhadores estão motivados e aceitam o apoio de membros da UFCW, da Arise Chicago (uma organização religiosa que defende os trabalhadores) e de membros de outros sindicatos. “Scabby”, o rato inflável gigante [1], domina a cena. Os caminhoneiros que passam buzinam em apoio a luta. Os trabalhadores sabem que são um pequeno grupo lutando contra uma grande empresa. Mas estão convencidos de que vale a pena lutar pela paridade salarial e pela segurança de um acordo coletivo. Esta greve reflete o caráter atual das pequenas greves nos EUA.

Na saúde

Todas as grandes greves deste ano ficaram para trás: na Asarco, na Bath Iron Works e no Hospital da Universidade de Illinois. No entanto, uma grande luta surge no horizonte. Cerca de 2.500 enfermeiras de quatro hospitais da Filadélfia votaram pela greve. Seu sindicato, a Associação de Enfermeiros e Profissionais Aliados da Pensilvânia, tem uma história militante. O tema central é o mesmo que em todas as outras lutas nos hospitais desde o início da pandemia: a proporção de enfermeiras por pacientes. Na luta pelo ‘índice de segurança’, como diz o lema do sindicato, os enfermeiros lutam tanto pela qualidade da assistência médica prestada aos pacientes quanto pelas próprias condições de trabalho.

Em outros centros do sistema de saúde, a hostilidade da administração com os sindicatos assume um rosto polêmico e estranho. Cinco enfermeiras do enorme Hospital Stroger, de Chicago sofreram uma sanção disciplinar em circunstâncias extraordinárias. De fato, a Stroger Hospital Illinois Nurses Association iniciou recentemente uma nova rodada de negociações sobre os acordos. Em manifestação pública, as enfermeiras decidiram divulgar suas propostas de contratação e aproveitaram o clima da festa de Halloween para se disfarçar e, assim, foram apresentar suas demandas à administração do hospital. Os patrões disseram que era um comportamento ameaçador! A administração apresentou acusações contra as cinco enfermeiras que podem leva-las à suspensão ou demissão. Embora a acusação seja ridícula, devemos levar a sério as ameaças da administração e devemos nos juntar à defesa dessas ativistas sindicais.

Na educação

Cada distrito escolar decide como vai lidar com a pandemia. Existem milhares de combinações diferentes com cursos à distância, híbridos e presenciais. Muitos distritos têm políticas diferentes com base nos níveis de escolaridade. O mesmo distrito pode usar procedimentos muito diferentes em momentos diferentes. Isso significa que os sindicatos de professores enfrentam uma situação complexa, um mosaico de casos. A resposta sindical assumiu, portanto, várias formas. Por exemplo, em Chicago, o distrito escolar adotou o ensino à distância, mas há um debate público sobre a necessidade de professores e alunos voltarem às aulas presenciais. Em resposta, a CTU tem conduzido uma intensa campanha de informação para garantir que o ensino presencial não seja retomado até que as escolas possam reabrir com segurança para todos.

Outro exemplo da ação dos professores ocorreu recentemente no Brookline, Massachusetts, onde 915 professores (em 1.000) participaram de um “sick-out” (licença saúde coletiva), em 3 de novembro. Eles exigem que o distrito escolar garanta uma distância física de 1,80m nas escolas. O resultado desta mobilização ainda não pode ser determinado.

Paradas para evitar Covid

Na primavera passada, houve muitas greves espontâneas nos locais de trabalho, exigindo equipamentos de proteção individual e outras medidas de proteção contra o vírus. Durante o atual ressurgimento do vírus, não houve um número semelhante de greves. Parte da explicação para essa diferença pode ser que as empresas agora estão fornecendo mais equipamentos de proteção. Adaptar os locais de trabalho para garantir um espaço de 1,80m parece mais difícil de obter do que máscaras, luvas e desinfetante para as mãos. Os equipamentos de proteção podem variar em quantidade e qualidade, mas estão mais presentes nos locais de trabalho do que antes.

Oposição nos sindicatos

A oposição militante dentro dos sindicatos assumiu três formas principais. Primeiro, os grupos de oposição nos sindicatos de professores, a AFT e a NEA. Eles são compostos principalmente por jovens professores inspirados no movimento RedEd. Segundo, a rede construída em torno do Labor Notes, que conseguiu sustentar uma série impressionante de atividades durante a pandemia.

Terceiro, o trabalho dos Teamsters for a Democratic Union (TDU) muito bem estabelecido no sindicato dos caminhoneiros (Teamsters Union). O TDU milita em vários pontos, desde a luta por democracia sindical até uma posição mais firme contra os patrões na mesa de negociações. Eles atualmente apoiam a lista de O’Brien-Zuckerman nas eleições de 2021 da IBT (International Brotherhood of Teamsters).

Referendo Uber/Lyft na Califórnia

Uber e Lyft investiram enormes recursos na campanha da Proposição 22 da Califórnia, votada nas últimas eleições. O objetivo da Proposição 22 era revogar a lei que considerava os motoristas como empregados regulares, com salários e benefícios, para classificá-los como autônomos. [Ver: Estados Unidos/ Uberização: empresas gastaram 224 milhões de dólares para ganhar seu referendo na Califórnia, Eve Bate:  https://correspondenciadeprensa.com/?p=14906] Qualificar os trabalhadores como contratados independentes permite que os empregadores reduzam custos. A Proposição 22 foi aprovada por 58% dos votos contra 41%. É uma verdadeira derrota para o movimento dos trabalhadores na Califórnia, e particularmente para os trabalhadores de aplicativos, e pode ter repercussões em outros lugares dos Estados Unidos.

Aprofundar a luta

Concluindo, depois de ter analisado a situação geral, podemos ver quais são os setores em luta hoje: pequenas greves por empresas, hospitais, segurança durante a pandemia nas escolas, e a corrente de oposição dos caminhoneiros (Teamsters). É claro que gostaríamos que houvesse mais conflitos como esses, mas é assim hoje. Nossa tarefa é fazer tudo ao nosso alcance para apoiar e aprofundar esses exemplos de luta da classe trabalhadora.

Publicado em http://insisto-resisto.org/wordpress/?p=571, em 19/11/20

*Adam Shils é membro do Projeto Socialismo Internacional em Chicago.

Notas

1] Os sindicatos têm usado por anos, um rato inflável gigante chamado “Scabby” em suas lutas contra as empresas que empregam mão de obra não sindicalizada.

2] Teamsters for a Democratic Union (TDU) é uma organização de base que busca reformar a Irmandade Internacional de Teamsters (IBT), ou União de Caminhoneiros.

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