Pular para o conteúdo
EDITORIAL

Um segundo turno decisivo para a esquerda brasileira

Editorial de 19 de novembro de 2020

LEA EN ESPAÑOL  Brasil – Una segunda ronda decisiva para la izquierda

READ THE ENGLISH VERSION A decisive second round for the Brazilian left

Nas atípicas eleições de 2020, mal se encerrou a apuração das urnas do primeiro turno, o tempo político do país voltou a se acelerar em função do curto intervalo até o segundo turno em 55 cidades. Considerando se tratarem de alguns dos principais municípios brasileiros, qualquer balanço do resultado eleitoral nesse momento é necessariamente incompleto e provisório. Em função disso, o presente editorial se propõe a apenas indicar alguns elementos gerais para a avaliação do primeiro turno, centrando-se na defesa de uma política para o segundo turno. Nesse sentido, cabe destacar que, ainda nos marcos da situação reacionária caracterizada por uma ofensiva burguesa, há elementos que indicam mudanças em relação aos resultados eleitorais de 2016 e 2018.

Reordenação de forças à direita

Em um contraste marcante com o pleito de 2018, é evidente o fato de que a avalanche bolsonarista não se manteve. Dos 55 candidatos, entre prefeitos e vereadores, apoiados declaradamente por Bolsonaro, apenas 13 venceram, o que permite falar em uma derrota eleitoral do presidente, cujas consequências políticas ficarão mais claras no próximo período. Sem dúvida, pesaram elementos recentes da conjuntura internacional (EUA, Bolívia, Chile), sua abordagem genocida da pandemia de Covid-19, a crescente perda de popularidade nas grandes cidades e a ausência de um partido orgânico do bolsonarismo, que resultou em dispersão de seus candidatos.

Parte significativa do espaço perdido pela extrema-direita foi ocupada pelos partidos mais tradicionais da direita brasileira (PSDB, MDB e DEM), que recuperaram parcelas do que haviam perdido em 2016 e 2018, podendo ainda ampliar suas forças uma vez que disputam o segundo turno em nove capitais (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Teresina, Porto Velho, Cuiabá, Boa Vista, Goiânia e Maceió). Outra parte foi abocanhada pelo centrão governista (Republicanos, PP, PSD, PTB e Cidadania), que fincou suas bandeiras em pequenas e médias prefeituras, principalmente.

Note-se, entretanto, que essa nova composição do campo da direita está longe de ser definitiva, uma vez que Bolsonaro ainda mantém um significativo eleitorado fiel e deve redobrar os esforços para a criação de seu partido neofascista puro-sangue, a Aliança Para o Brasil. Além disso, uma avaliação mais acurada do significado desses resultados depende de uma avaliação da medida em que os partidos que avançaram o fizeram a partir de um deslocamento ainda mais à direita.

PSOL avança na esquerda

Nas eleições de 2016, realizadas no embalo do golpe que derrubou a presidenta Dilma Rousseff, a esquerda amargou uma dura derrota, vencendo uma única capital, com o PT em Rio Branco. Neste ano, observa-se uma recuperação relativa da esquerda nos grandes centros urbanos. A profundidade dessa recuperação ainda depende dos resultados do segundo turno, no qual as forças de esquerda disputam em cinco capitais e mais 13 cidades de grande e médio porte no país, com maior presença do PT. Com isso, foi detida a investida do bloco de centro-esquerda (PDT-PSB), que se apresentou como uma alternativa direta ao PT e teve significativa queda em relação aos resultados de 2016.

Cabe destacar que o PSOL ampliou seu espaço no âmbito da esquerda, sendo a mais destacada alternativa ao predomínio do PT, e na cena política nacional como um todo. O partido elegeu 88 vereadores (crescimento de 50%) concentrados nas capitais e grandes cidades. Nesse contingente, se destaca a participação dos setores oprimidos da classe trabalhadora: quase 40% são mulheres, quase a metade é de negros e negras, além de 4 mandatos encabeçados por mulheres trans e outros 9 mandatos coletivos. Assim, enquanto apenas 8% do total de eleitos é composto por mulheres negras, no PSOL esse percentual chega a 36%. O partido também teve Érika Hilton, uma mulher negra e trans, como a parlamentar mais votada da cidade de São Paulo, onde o PSOL também elegeu a primeira parlamentar intersexo do país (Carolina Iara, da Bancada Feminista) 53 desses mandatos foram eleitos em capitais ou cidades acima de 200 mil habitantes.

A capital que mais elegeu mandatos de vereador do PSOL foi o Rio de Janeiro, com 7 parlamentares. Em Porto Alegre, o partido foi o mais votado para a Câmara Municipal, tendo dois jovens negros como primeiro (Karen Santos) e quinto (Matheus Gomes) mais votados da cidade. Em Belo Horizonte, a vereadora mais votada do PSOL foi jovem negra e trabalhadora, Iza Lourença. Em Juiz de Fora, importante cidade mineira, o partido pela primeira vez elegeu uma vereadora, com a eleição da professora da rede pública Tallia Sobral, que, como militante bissexual, também colocou a questão LGBT em primeiro plano na campanha.

Um segundo turno que pode alterar qualitativamente o quadro eleitoral

55 grandes e médias cidades terão segundo turno. A principal batalha se dará em São Paulo, onde Guilherme Boulos (PSOL) enfrenta o tucano Bruno Covas. A chegada ao segundo turno do líder dos sem-teto, protagonista de importantes mobilizações de rua e lutas sociais nos últimos 10 anos na cidade e no país, é, sem dúvida alguma, a grande surpresa e o principal fenômeno progressivo dessas eleições.

A esquerda também está na disputa em Belém, onde Edmilson Rodrigues (PSOL) travará uma luta contra um candidato bolsonarista. Em Porto Alegre, Manuela D’Ávila (PCdoB) duela com o candidato do MDB. Em Recife, Marília Arraes (PT) enfrentará o candidato do PSB, João Campos. E em Vitória, João Coser (PT) disputa com um oponente bolsonarista.

É preciso que todos partidos da esquerda (PT, PSOL, PCdoB, PSTU, UP, PCO, PCB), movimentos sociais e sindicatos de luta cerrem fileiras em torno de Boulos, Edmilson, Manuela, Marília e Coser. É preciso também votar nos candidatos do PT que foram no segundo em turno em mais 13 importantes cidades.

Há também a situação de Fortaleza, onde o candidato do PDT (Sarto) disputa contra o Capitão Wagner, apoiado por Bolsonaro. Não há dúvida de que a esquerda deve se unificar chamando voto em Sarto contra o candidato da extrema-direita. No Rio de Janeiro, a situação fica mais complicada, pois o oponente de Crivella é Eduardo Paes, da direita neoliberal. Mas mesmo no Rio o voto deve ser hierarquizado pela luta contra o bolsonarismo. O principal, no momento, é impor uma derrota a Crivella. Nas cidades em que a disputa do segundo turno será entre representantes da direita tradicional, o correto é o chamado ao voto nulo.

Os socialistas sabem que as eleições alteram as posições de força entre os partidos e lideranças políticas e influenciam na disputa da consciência popular. Por isso, não somos indiferentes à disputa eleitoral. Mas sabemos também que a luta principal se dará nas ruas, com a organização da classe trabalhadora e oprimida. A esquerda deve usar as posições conquistadas nessas eleições para preparar as condições da derrubada de Bolsonaro nas ruas, antes das eleições de 2022. É fundamental que os movimentos sociais e partidos conectados à classe trabalhadora atuem decididamente nessa conjuntura, construindo as condições para mobilizações massivas contra o bolsonarismo e a ofensiva burguesa. Vamos à luta nas eleições e além!

 

LEA EN ESPAÑOL
Brasil – Una segunda ronda decisiva para la izquierda