O rei está morto. Morte ao rei!

Felipe Demier

Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e professor da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). É autor, entre outros livros, de “O Longo Bonapartismo Brasileiro: um ensaio de interpretação histórica (1930-1964)” (Mauad, 2013) e “Depois do Golpe: a dialética da democracia blindada no Brasil” (Mauad, 2017).

Por conta da política de Trump em seu conjunto, com destaque para seus traços bonapartistas, as eleições norte-americanas adquiriram o caráter de um plebiscito. Votou-se a favor ou contra Trump. Mesmo vitorioso, o insípido Biden desempenhou não mais do que um papel secundário, de coadjuvante. 
Uma vez encerrada a disputa plebiscitária, felizmente com a derrota do imperialismo sans phrase, começa a nova etapa da luta.
 
Uma vez encerrada a disputa plebiscitária, felizmente com a derrota do imperialismo sans phrase, começa a nova etapa da luta. Os trabalhadores e explorados, nos Estados Unidos e por todo o globo, terão que não só enfrentar as fortes hostes da ala imperial derrotada, que certamente estão enraizadas numa terra fértil para o plantio do fascismo, como também, desde o primeiro dia, a sua ala vencedora, o imperialismo cínico, dissimulado, e que sabe formular suas frases tão bem como bombardear, explorar e oprimir. 
 
Se até hoje os inimigos estiveram, nesses poucos dias, ao nosso lado –  e seu perfume sedutor e seu discreto charme puderam ser percebidos sem muita dificuldade -, a partir de  amanhã uma linha muito clara – ou melhor, negra, feminina e, sobretudo, classista – deverá ser desenhada entre nós. Antes mesmo do fim da festa, o perfume deles já começará a exalar seu odor fétido, e seu discreto charme se revelará como a mais indiscreta cooptação. 
A verdade da derrota de Trump só poderá ser a futura e verdadeira derrota de Biden.
A preocupação ambiental dos democratas não é senão uma outra forma de defender o mesmo “ambiente de negócios”, da mesma forma que sua “representatividade” identitária não passa de uma faceta cool e conectada da representação dos interesses do mercado e dos adoradores da lucratividade. Sua diferença face aos republicanos diz respeito apenas ao modo de gestão da república dos negócios, e sua dita “responsabilidade social”, por sua vez, não passa de outra maneira de, com boas maneiras, preservar essa máquina de matar que é o capital. Se hoje derrotamos uma de suas horrendas formas, amanhã teremos que derrotar, de qualquer forma, o seu conteúdo. Assim, a verdade da derrota de Trump só poderá ser a futura e verdadeira derrota de Biden.