Pular para o conteúdo
Especiais
array(1) { [0]=> object(WP_Term)#20993 (10) { ["term_id"]=> int(4919) ["name"]=> string(24) "É urgente um mundo novo" ["slug"]=> string(23) "e-urgente-um-mundo-novo" ["term_group"]=> int(0) ["term_taxonomy_id"]=> int(4919) ["taxonomy"]=> string(9) "especiais" ["description"]=> string(0) "" ["parent"]=> int(0) ["count"]=> int(10) ["filter"]=> string(3) "raw" } }

Racismo estrutural

Brenda Marques, Afronte (PI) e Gustavo Mascarenhas, Afronte (BA)

O que é racismo estrutural (2018) é uma obra elaborada pelo Prof. Dr. Silvio Luiz de Almeida, de suma importância para compreender as concepções de raça e racismo por meio dos conhecimentos produzidos pela Teoria Social. Aqui daremos relevância, principalmente, à dimensão do racismo no Brasil nas três décadas que sucederam a “abolição” da escravidão.

Nesse período, é possível observar o que ocorreu com a população ex-escrava da área urbana e rural. A falta de política pública para integrar essa população à sociedade foi determinante na história de marginalização que se segue. O incentivo às imigrações europeias, os projetos de branqueamento da população, a promoção do racismo como ideologia, a exclusão das populações negras do acesso à terra e o baixo nível de investimento em educação para essas pessoas são fatores que continuaram produzindo e reproduzindo a marginalidade das populações negras no Brasil.

Desse modo, Silvio nos traz uma importante afirmação: o racismo não é só um resquício da escravidão, mas também um instrumento que se constitui na modernidade e no capitalismo. O racismo é uma expressão das estruturas do capitalismo forjadas pela escravidão que, dependendo das tensões e contradições, necessita ser renovado. Não é apenas um problema ético, uma categoria jurídica ou um dado psicológico, ele é uma relação social que se estrutura política e economicamente.

Esse é o entendimento da efetivação do racismo também através da discriminação estruturada, constituindo-se como um processo pelo qual as circunstâncias de privilégios se difundem entre os grupos raciais e se manifestam pelos espaços econômicos, políticos e institucionais. O racismo não se trata, portanto, de uma patologia. É uma forma de normalização das relações sociais, constituindo não só o consciente, mas também o inconsciente, normalizando estruturas racistas, como por exemplo o mercado, que mantém o salário de homens e mulheres negras abaixo das pessoas brancas, ainda que ocupando as mesmas funções e cargos.

No livro, Silvio também dialoga sobre outro conceito importante já conhecido, o de Racismo Institucional, que é a materialização das determinações formais da vida social. É o que, no Brasil, produz o caso de uma juíza de São Paulo, afirmar que o réu não possuía “estereótipo de bandido”, por ter “pele, olhos e cabelos claros”. Note a gravidade da declaração: é a opinião de uma representante do sistema que aplica as leis no país. É por essas noções, inclusive, que se dá o encarceramento em massa e casos como de Rafael Braga. O autor não exclui esse conceito, mas tenta dialogar com ele quando diz que o racismo estrutural é uma definição mais ampla, pois ela dialoga com a ideia de que isso acontece em decorrência da estrutura da sociedade, que normaliza e concebe como verdade padrões e regras baseadas em princípios discriminatórios de raça. Em outras palavras, “as instituições são racistas, porque a sociedade é racista”.

Mesmo que partindo de noções mais amplas, pensar o conceito de racismo como estrutural não tira a responsabilidade individual de sua reprodução. As mudanças estruturais exigem a tomada de postura e adoção de práticas antirracistas. Afinal o racismo estrutural tem outro sintoma em relação as pessoas brancas, que é o de naturalizar a sua posição enquanto pessoa branca que goza de sistemáticos privilégios: a branquitude.

Outro debate importante trazido pelo livro é sobre a tão falada representatividade, pois a representatividade institucional de pessoas negras, sobretudo de mulheres negras, é importante. Destaca-se, daí, dois pontos centrais: propiciar abertura de um espaço político para que as reivindicações sejam repercutidas; e desmistificar as narrativas de subalternidade que o racismo impõe. No entanto, as representatividades não significam que o racismo está sendo diminuído ou que possa mudar as relações estruturais, políticas e econômicas, que se servem do racismo e sexismo para reproduzir desigualdade. Representatividade não significa poder.

Uma importante noção que conseguimos tirar de todos esses debates é que é inegável o peso político e histórico do racismo. Sendo assim, o combate ao racismo segue atrelado aos rumos políticos e econômicos da sociedade. Isso significa que a eclosão do capitalismo em nosso país marca a história da formação social brasileira em que os corpos dos sujeitos negros representam a grande parte da classe trabalhadora, naturalizados em distintos modos desiguais de vida. Raça e Classe se interseccionam.

De maneira geral, debater sobre o racismo não significa debater uma parte, mais sim um todo. Uma análise marxista, sem a perspectiva de raça, ou está errada ou está incompleta. Os conceitos de classe, Estado, imperialismo, ideologia e acumulação primitiva, superexploração, crise e tantos outros, ganham concretude histórica e inteligibilidade quando informados pelas determinações raciais. Portanto, não devemos acreditar nem em liberais que dizem que é possível superar o racismo mesmo no capitalismo e nem em marxista que não veem o combate ao racismo como central. A superação do racismo perpassa pela superação de uma sociabilidade pautada nos conflitos e antagonismo sociais. O antirracismo e o anticapitalismo caminham juntos para a construção de um novo mundo.