Pular para o conteúdo
BRASIL

Cenário eleitoral em Belém e a representatividade feminina

Gizelle Freitas*, de Belém, PA
Reprodução capa Diário do Pará

O tabuleiro eleitoral está armado na capital paraense. Estão em jogo, concorrendo à Prefeitura, 11 candidatos, que são: Edmilson Rodrigues (PSOL), Cassio Andrade (PSB), Cleber Rabelo (PSTU), Everaldo Eguchi (Patriota), Guilherme Lessa (PTC), José Priante (MDB), Mário Couto (PRTB), Thiago Araújo (Cidadania), Vavá Martins (Republicanos), Gustavo Sefer (PSD). A píada pronta é que o tal Partido da Mulher Brasileira (PMB) também lançou um homem. O que, de cara, vocês avaliam como, no mínimo, estranho? Sim! Nenhuma mulher concorrendo, uma estranheza à primeira vista. Defendo o feminismo anticapitalista e antirracista, pra os 99%, portanto, a representatividade importa muito, é um termômetro fundamental, mas é necessário estar munida de um programa de defesa radical dos direitos e da classe trabalhadora, não basta ser mulher tal a Damares Alves para comprovar essa máxima. Ainda assim, causa incômodo essa corrida eleitoral exclusivamente masculina e embranquecida.

A outra reflexão é sobre qual lugar as mulheres estão ocupando nesse cenário. Há rumores de que três mulheres estarão como vice, mas com um programa de desmonte dos direitos do povo de Belém, aliadas à elite da cidade. Para ratificar a construção sexista que os partidos da burguesia alimentam, o candidato Priante (MDB), em sua convenção, agradeceu ao PSC por ter “oferecido” sua candidata a vice-prefeita e afirmou que esta “deixará sua foto de posse mais bonita”. Repugnante! Esse é o lugar da mulher na política patriarcal.

Todavia, há, em Belém, entre um setor da vanguarda feminista, uma discussão sobre essa gritante falta de política de paridade entre os partidos (especialmente, relacionado à frente eleitoral que o PSOL encabeça). Isso não é menor, apesar da acusação que já surge, do tipo: “Vocês estão desviando o foco” e também “Bora primeiro ganhar a eleição, depois a gente discute isso”, ou ainda “Aqui não é uma disputa entre homens contra mulheres”, completando com “Todas as mulheres serão representadas na nossa campanha”, e por aí vai. A representatividade e a representação não são cortina de fumaça. É um erro grave não querer enxergar que nós mulheres somos 51% do eleitorado brasileiro e que, portanto, é legítimo e necessário que em todos os espaços estejamos bem representadas, inclusive, numericamente. Ou ainda que somos a linha de frente dos mais importantes enfrentamentos contra o governo Bolsonaro (e será a primeira eleição municipal sob o comando desse genocida); que 46% dos lares brasileiros são chefiados por mulheres, segundo o IPEA, e em Belém não é diferente; que somos as responsáveis por todo o trabalho da reprodução social, não à toa, com a pandemia isto ficou mais evidente, ou ignorar a luta histórica feminista no Brasil e em Belém e continuar nos alijando dos espaços da política institucional. Pontuo, especialmente, aos partidos da esquerda e do campo democrático-popular.

Nosso objetivo central na capital paraense é resgatar o comando da cidade, voltar a sorrir por Belém, acabar com a hegemonia destruidora da direita, que já dura 16 anos seguidos, que assola nosso povo, que afastou muito mais que somente geograficamente a periferia. Eleger Edmilson Rodrigues é tarefa principal de todas e todos ativistas comprometidos com um futuro minimamente digno para os belenenses. Um desafio muito maior que o PSOL, daí a frente eleitoral que se formou em torno disso. Há muita esperança e expectativa em jogo, e a possibilidade é concreta, visto as pesquisas eleitorais. Há na memória da história da capital as duas grandes gestões municipais quando Edmilson ainda era do PT, há um clamor acumulado na garganta pelo seu retorno. O PSOL ganhar a Prefeitura de uma cidade tão importante como Belém, na Amazônia do país, com certeza será uma enorme derrota para Bolsonaro e sua política de ódio, mas também para os partidos da burguesia e seus representantes repulsivos, que se revezam no comando desse Estado com uma política corononelista.

A chapa estava formada por Edmilson e Ivanise Gasparim (PT), mulher negra de importante trajetória, mas há poucos dias da convenção do PSOL e do PT, esta se retirou alegando motivos de saúde, e sem nenhum debate no PSOL sobre a troca, esse cargo de vice foi ocupado pelo ex-deputado estadual do PT, professor Edilson Moura, homem negro com longa e reconhecida trajetória em Belém. Vejamos, aqui a discussão não é contra o professor Edilson, mas a favor da paridade numa chapa eleitoral, um principio político que o PSOL não deveria abrir mão. É lastimável que a direção do PT em Belém não tenha feito a análise concreta da realidade concreta, e esta é: o movimento feminista é imparável, os partidos da esquerda e do campo progressista, democrático-popular deveriam ter isso como política central, tarefa de mulheres e homens, promover políticas reais de construção de mulheres figuras públicas, de incentivo às suas candidaturas, principalmente, negras, nós que historicamente somos ainda mais invisibilizadas, altamente desrespeitadas, caladas. A combinação do machismo com o racismo é esmagadora também dentro dos partidos políticos. A batalha é dura, mas não nos furtaremos de fazê-la. Com certeza, no PT Belém, há companheiras para cumprir com brilhantismo e competência política essa tarefa.

Nós da Resistência/PSOL nos solidarizamos ao conjunto de mulheres do PT que estão contrárias ao não respeito da paridade e iniciaram uma discussão dentro desse partido e no movimento. Rever essa decisão seria um importante sinal de respeito à nossa luta e história, das que construímos as maiores marchas contra o então candidato neofascista, o “#ELENÃO”. Porém, é importante reafirmar que cada gota do suor da nossa militância será para eleger Edmilson Rodrigues futuro prefeito de Belém e uma boa bancada de vereadoras mulheres, sobretudo, negras, como a Bancada Mulheres Amazônidas, contudo a construção política saudável entre nós não pode escamotear as críticas e reflexões necessárias, que em nossa opinião devem ser feitas baseadas no debate fraterno.

Uma futura gestão do Edmilson irá enfrentar um caos também do ponto de vista das políticas voltadas às mulheres, são 16 anos sem política concreta que enfrente o alto índice de feminicídio, de violência doméstica, do grande desemprego entre as mulheres, de desconfiança em relação à atuação da polícia e da guarda municipal, enfrentamento a explosiva violência urbana onde nós somos as maiores vítimas. Sem falar no assédio no transporte público, bizarros casos de racismo, de transfobia. Uma gestão que proporcione o mínimo de dignidade aos cerca de mil indígenas venezuelanos Waraos (visivelmente nas ruas notamos que a maioria desses são mulheres com seus filhos crianças pedindo ajuda nos semáforos); que tire das piores condições de trabalho as trabalhadoras da Assistência Social (sim, usei só no feminino porque somos a maioria nessa política); que construa uma rede de combate à violência contra a mulher, que se comunique, que pare de atuar de forma setorizada; que invista na construção de mais pronto socorros, pois, comprovadamente, somos nós mulheres negras as que mais acessamos o SUS; que construa creche pública e nas periferias e em parceria com o Governo Estadual construa “sub-DEAM’s ”nos distritos, além de capacitação dessas e desses agentes públicos, na tentativa de não revitimizar essas mulheres, e uma longa lista de necessidades em diversas áreas. Mas, como o programa de governo está sendo construído a partir da escuta popular, não há dúvidas de que essas e outras questões serão apreciadas. Agora, vamos à luta para eleger o Ed, que o processo não está dado. Saudações amazônida, feminista e socialista!

 

*Gizelle Freitas é integrante da Resistência PSOL/Belém

Marcado como:
eleições / pará / psol / pt