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BRASIL

Setembro Amarelo: para além do marketing, uma campanha de saúde pública

Ariane Raiol*
Divulgação

A campanha ‘Setembro Amarelo’, que tem como marco oficial o dia 10, acontece durante o mês todo e objetiva prevenir e reduzir os números de suicídios no país, por meio da conscientização de que sintomas depressivos precisam ser tratados. Segundo a Organização Pan Americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos, sendo a segunda principal causa de morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos.

Tais dados analisados a partir da perspectiva de raça, revelam que, a cada dez jovens entre 15 e 29 anos que cometem suicídio, seis são negros. Fica evidente a gravidade do racismo na sociedade brasileira, evidenciando não apenas uma disparidade racial, como também a necessidade de politicas públicas mais eficientes para a população negra.

Esse cenário revela que é impossível falar sobre a prevenção ao suicídio sem que este esteja aliado à defesa, ao fortalecimento e ao financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS). A saúde mental é uma política pública, não é neutra. Assim, é indiscutível a necessidade da campanha do ‘Setembro Amarelo’ defender um sistema público de saúde forte o suficiente para oferecer redes de atenção psicossocial estruturadas.

Resgatando a história, é importante ressaltar que a reforma da assistência à saúde mental no Brasil fortaleceu-se no final da década de 70, protagonizada pelo Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental que era formado por diversos atores como profissionais de saúde, associações de familiares com longo históricos de internações em hospitais psiquiátricos, sanitaristas e sindicalistas. O movimento criticava a lógica hospitalocêntrica e asilar de tratamento, permeada por situações de violência e maus-tratos.

Após um longo processo, a luta antimanicomial culminou com o que ficou conhecida como Reforma Psiquiátrica no Brasil. Vários avanços foram conquistados desde então, e as redes de atenção psicossocial foram criadas para substituir os hospitais psiquiátricos. Tais redes contam com a instituição de diversos serviços voltados para assistência à saúde mental, como os Centros de Atenção Psicossocial, Serviços Residenciais Terapêuticos, e etc.

Ocorre que desde o governo Temer até Bolsonaro estamos vivenciando um desmonte dos centros de atendimentos psicossociais por questões ideológicas. Cabe destacar que, no ano passado, os hospitais psiquiátricos e as comunidades terapêuticas foram reinseridos nas redes de atenção. Os investimentos públicos passaram, então, a serem destinados novamente a estes, o que demonstra uma nítida tentativa de destruir as diretrizes da reforma psiquiátrica e retomar uma lógica manicomial, que é fortemente estruturada em pilares patriarcais e racistas, que não atende à comunidade e sim aos interesses farmacológicos.

A reforma psiquiátrica, que permitiu a reabilitação psicossocial e viabilizou a universalização do acesso aos serviços, encontra-se ameaçada nesse cenário político de retrocesso. Segundo a OMS, 79% dos suicídios ocorreram em países de baixa e média renda, assim, defender a saúde mental e o combate ao suicídio é defender a saúde pública.

É importante lembrar que os maiores usuários do SUS são pessoas negras. Uma campanha que se cala diante do subfinanciamento do SUS deixa clara que a saúde mental é apenas para aqueles que podem pagar. Prevenção ao suicídio se faz com financiamento e fortalecimento da rede de atenção psicossocial, e passa pela defesa do SUS. Se o ‘Setembro Amarelo’ apenas destina-se àqueles que detêm privilégios socioeconômicos, ela é mercadológica, sendo apenas uma campanha de marketing, não de saúde pública.

*Ariane Raiol é assistente social, integrante da Resistência Feminista do Pará e do Afronte.

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