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Ta Thu Thau: Um revolucionário inigualável e fundador do trotskismo no Vietnã

Por LUCHAS (Liga Unitária Chavista Socialista). Tradução: Célia Regina

Ta Thu Thau nasceu em 5 de maio de 1906, na aldeia de Tan Binh, ao sul da cidade de Long Xuyen, que estava situada no delta do rio Mekong e pertencia à Cochinchina, parte da Indochina dominada pela França. (1) Sua família era pobre e levava um estilo de vida semi-camponês. Seu pai era um carpinteiro itinerante e, quando sua família se estabeleceu na cidade, Ta Thu Thau pôde frequentar a escola primária e, trabalhando como servente, durante suas férias pôde continuar estudando.

Muito jovem, já começou a ter um papel importante na luta anticolonial. Em 1926, organizou manifestações pela libertação de dirigentes nacionalistas anamitas da velha geração.

Em 1927, foi para a França estudar Ciências, na Universidade de Paris.

Nesse mesmo ano, foi fundado o Partido Comunista da Indochina (PCI), liderado por Ho Chi Minh, e Ta Thu Thau, em Paris, participava do Partido da Independência Anamita (PIA), que atuava sobre a emigração indochinesa, o qual chegou a dirigir.

Em janeiro de 1929, um grupo fascista atacou uma manifestação do PIA em Paris. Em uma delimitação inicial com o PC francês, Tha Thu Thau atacou seu jornal, L’Humanité, por ter relatado de ”má fé” o ocorrido e por não ter defendido os anamitas presos na manifestação.

Em julho de 1929, participou do Segundo Congresso da Liga Anti-imperialista em Frankfurt. Nos círculos de esquerda em Paris, teve contato com intelectuais como, Daniel Guérin (anarquista) e também Alfred Rosmer (da Oposição de Esquerda Internacional), tendo, aos 23 anos, ingressado na corrente trotskista. 

Em fevereiro de 1930, ocorreu em Yen Bay, guarnição militar no delta do rio Vermelho em Tonkin, no Norte da Indochina, um levantamento de soldados nativos utilizados pelas forças coloniais. A organização do levante foi feita pelos nacionalistas burgueses, inspirados no Kuomintang chinês. Mal preparado, prematuro e isolado dos demais destacamentos do exército colonial e das lutas sociais, o levante foi esmagado pelas forças do governo colonial. No mesmo ano, uma grande onda de lutas, operárias e, depois, camponesas, explodiu no que seria hoje o Vietnam, em meio à crise econômica agudizada pela crise mundial de 29, que tornou as condições de vida intoleráveis. Em certas regiões do centro da Indochina (Annam), houve levantamentos camponeses que expulsaram as autoridades locais, dividiram as terras, eliminaram alguns impostos particularmente odiosos e organizaram formas de autogoverno próprios, mas ficaram isolados e foram brutalmente esmagados pelos franceses, inclusive com bombardeios aéreos: o resultado foram 10 mil mortos e milhares de presos e deportados para o campo de concentração de Poulo Condore. (2) Este ciclo de mobilizações mostrava que amadurecia a revolta anticolonial, que o país havia criado uma indústria, minoritária, mas que seus trabalhadores começavam a participar das lutas de forma importante. Havia ainda teria um trecho de experiência e aprendizado para concluir e poder enfrentar os poderes coloniais, como se veria nos 45 anos subsequentes.

Alfred Rosmer ofereceu a Ta Thu Thau as páginas do jornal do grupo trotskista francês, La Verité, para expor suas posições sobre o que ocorria em sua terra natal: 

“A burguesia nacional, artificialmente criada, não é capaz de fazer nenhuma revolução (…) incapaz de uma vida independente, ligando-se firmemente à burguesia francesa (…) que a utiliza para destruir a luta revolucionária do nacionalismo anamita (… ) O mal organizado levante em Yen Bay (…) sem ligação entre sua organização e a população civil(…) foi lançado sob fundamentos ideológicos confusos (…) uma síntese sunyatsenista (3) de democracia, nacionalismo e socialismo(…) um tipo de misticismo nacionalista. (…) Essa política obscurecia as relações de classe concretas, e a ligação orgânica, real, entre a burguesia local e o imperialismo francês(…) aqueles que falam sobre a independência imediata e integral não possuem nada mais do que uma concepção mecânica e formal da luta. Nenhum deles pode duvidar que, por trás dessas palavras impressionantes, há um povo no seio do qual se processam mudanças moleculares perpétuas das classes sociais, que são todas imperceptíveis, pois são ocultas pela aparência de conflitos entre raças, que aos olhos de muitas pessoas, são eternos(…) Nem o terrorismo, nem o Gandhismo irão resolver o problema colonial(…) Uma revolução baseada na organização das massas proletárias e camponesas é a única capaz de libertar as colônias(…) A questão da independência deve estar ligada com a da revolução proletária socialista”.

Ta Thu Thau criticava ainda a III Internacional pela “falsa política”, pela “capitulação aos partidos nacionalistas e acrescentava que “a revolução chinesa [de 1925-27] tinha sido conduzida ao cemitério”

A organização de Ta Thu Thau então, o “Grupo de Emigrados Anamitas” em Paris, com outros militantes como Huynh van Phuong e Phan van Chanh, convocou, junto com a Liga Comunista trotskista, em abril de 1930, uma mobilização quando do julgamento do recurso de 39 condenados à morte pelas lutas na região de Yen Bay. O panfleto que escreveu para a convocação concluía:

“Proletários e oprimidos, impeçam os crimes imperialistas. Colonialistas, assassinos, liberem nossos condenados à morte de Yen Bay”.

Oito dias depois era deportado, com dezenas de outros, para a Indochina.

Em 1930, a Oposição de Esquerda foi criada na Indochina e deu origem a três grupos, inclusive o “Comunismo Indochinês” de Ta Thu Thau, que incorporou frações que tinham rompido com o stalinismo pelo balanço dos levantes camponeses de Annam. A repressão era severa e ele conheceu a primeira de suas muitas prisões. Apesar disso, os grupos trotskistas começaram a se fortalecer com sua ênfase no trabalho entre as massas urbanas. 

Em 1933, em uma iniciativa sem paralelo no mundo, os trotskistas do grupo de Ta Thu Thau formaram uma frente eleitoral – com o PC da Indochina – a Lista dos Trabalhadores – para concorrer às eleições municipais de Saigon. Editaram um jornal legal em francês denominado La Lutte (o poder colonial só permitia publicações sem censura em francês, o que obviamente limitava o alcance delas), que foi como ficaram mais conhecidos. Seu programa era de defesa das reivindicações imediatas dos trabalhadores (direito de greve, jornada de 8 horas e a luta pelo sufrágio universal).  O esforço foi recompensado e La Lutte conseguiu expressivos resultados eleitorais nas eleições em Saigon, em 1933 conquistando dois dos 6 postos reservados aos anamitas (contra 14 para os colonos franceses). (4) O poder colonial anulou a eleição dos representantes de La Lutte, alegando falta de pagamento de impostos!

Após a eleições, La Lutte deixou de aparecer, mas em 1934, houve um novo acordo eleitoral formal entre o PCI, alguns nacionalistas e os trotskistas, em que se acordou que não haveria ataques mútuos entre os comunistas e os trotskistas e tinham um programa que incluía: a anistia política para todos, um parlamento eleito sob o sufrágio universal , a liberdade sindical, o aumento dos salários, a repartição dos arrozais e terras comuns entre os trabalhadores rurais, a distribuição dos arrozais abandonados  e dos estoque de arroz abusivos dos proprietários fundiários, a divisão das grandes propriedades fundiários entre os camponeses pobres e a supressão imediata do imposto pessoal a que eram submetidos os camponeses. 

Em 1935, novamente, essa frente eleitoral conquistou ótimos resultados. Na eleição para o conselho colonial (que era um organismo somente consultivo, mas que servia como base para propagar publicamente suas ideias), que era censitário, conquistaram 17% dos votos e nas eleições municipais a seguir conquistou 4 dos seis postos reservados aos anamitas  

A Internacional Comunista não via o tema com bons olhos, como se pode imaginar. Em 1935, um artigo no jornal do PCF dizia que o PCI estava em desacordo com a linha de Moscou e que “tal ação é incompatível com o princípio do centralismo democrático, com a disciplina de ferro e com a Comintern”.

O Grupo Outubro, a outra organização trotskista importante, rejeitava a aliança com o PC e publicava um jornal clandestino em idioma anamita, “Centelha”.

Com a chegada da Frente Popular ao governo na França, abriu-se um espaço com a diminuição temporária da repressão na colônia.

Ambos os grupos trotskistas (e também o PCI) aproveitaram a oportunidade dessa limitada liberdade para realizar um trabalho amplo contra a repressão colonial e pelo direito de sindicalização. Chegaram a formar parte também de uma frente nacionalista ampla denominada “Congresso da Indochina”, que transmitiria reivindicações ao governo francês de Leon Blum, que jamais as respondeu. A mobilização pelo “Congresso” foi intensa e teve importante repercussão entre os assalariados urbanos e os camponeses e, segundo a própria polícia colonial, permitiu a formação de 600 “comitês de ação” para debater as propostas populares, dos quais 200 eram dirigidos por La Lutte. O Congresso foi dissolvido pela administração colonial e Ta Thu Thau passou preso dois meses, como preso comum e só foi libertado depois de 11 dias de greve de fome.

A maior onda de greves e mobilizações antes da guerra ocorreu entre 1936 e 1937, na qual os dois grupos trotskistas intervieram a fundo e estabeleceram um, jornal sindical (Unidade) e uma federação sindical na região de Saigon. Tinham trabalho em 39 empresas importantes, incluindo o arsenal governamental, a companhia de energia elétrica, o serviço de bondes e a companhia francesa de petróleo. 

Em mais uma demonstração do grau de mobilização na Indochina, em janeiro de 1937 milhares de operários e empregados administrativos se manifestaram quando da chegada de um ministro francês em Saigon, aos gritos de “Liberdades democráticas, liberdades sindicais”! e milhares de camponeses foram bloqueados pela polícia quando tentaram fazer o mesmo por suas reivindicações 15 dias depois.

A polícia colonial dizia em fevereiro de 1937 que:

“A influência dos agitadores revolucionários favoráveis à IV Internacional progride na Cochinchina, notadamente nos meios operários da região de Saigon-Cholon”. E em julho complementava, “o elemento operário é conquistado mais pelo partido trotskista do que pelo PCI”

Durante a vigência do governo de Frente Popular na França abriu-se um debate sobre a posição dos colonizados em relação à metrópole. Segundo o dirigente do PCF àquela época, Maurice Thorez, “os interesses dos povos das colônias estavam em uniões livres…com a França democrática (…)forjar essa união era a missão da França pelo mundo”. (5) Ou seja, deveriam abandonar as bandeiras da libertação nacional, pois seria a melhor forma de enfrentar o fascismo.

Essa posição foi adotada pelo PCI, que começou a construir a unidade com setores burgueses locais, deixando a luta frontal contra a administração colonial.

Sob pressão de Moscou e do PCF, o PCI rompeu com La Lutte em junho de 1937, depois de a Frente ter ganho novamente as eleições municipais em Saigon. Nessa ruptura, o trotskismo vietnamita cresceu em influência, impulsionando organizações legais, semilegais e clandestinas.

Mas a administração colonial rapidamente voltou à atitude habitual e lançou uma onda repressiva contra os trotskistas e também o PCI. Ta Thu Thau foi novamente preso, desta vez por dois anos. Em setembro de 1937, realizou nova greve de fome de 12 dias, resistiu à tentativa de alimentação forçada, ficou paralisado no lado direito do corpo e foi conduzido de maca para a audiência no tribunal de Saigon, que confirmou sua sentença de dois anos de prisão, de onde só saiu em fevereiro de 1939, às vésperas do ano novo lunar (Tet). Sua primeira ação foi escrever, em La Lutte, um chamado a seus camaradas para que se unissem à IV Internacional fundada em 1938 quando estava preso.

Mesmo com a repressão, a atividade dos trotskistas teve um auge em 1939, poucos meses antes da deflagração da II Guerra: com o fim da censura aos jornais em linguagem local, os dois grupos trotskistas lançaram publicações em idioma em linguagem local, o Centelha e La Lutte, o novo jornal do grupo de Ta Thu Thau.

Nas eleições para o Conselho colonial em Saigon, em maio de 1939, a chapa encabeçada por Ta Thu Thau teve 80% dos votos, ficando o restante com os nacionalistas. O PCI teve menos de 1% dos votos, fruto de seu abandono da luta pela independência naquele período e seu apoio ao “esforço de guerra francês” no marco do aumento de impostos e das condições de vida cada vez mais insuportáveis. O Programa de Ação apresentado pelos trotskistas proclamava a oposição a todos os preparativos de guerra, ação direta para obter a legislação social, incluindo a negociação coletiva, a semana de trabalho de 40 horas com seguridade social, seguridade social e auxílio-desemprego, construção de escolas, hospitais e casas baratas; anulação das dívidas e da renda fundiária para os pequenos proprietários e camponeses pobres e isenção de impostos aos pequenos proprietários; liberdades democráticas, anistia aos presos políticos, a independência nacional e a eleição de uma assembleia constituinte indochinesa com sufrágio universal, entre outros pontos.

Os dirigentes trotskistas indochineses, Ta Thu Thau, Tran Van Trach e Phan Van Hum – diziam em uma carta a Trotsky: “apesar da vergonhosa aliança dos burgueses de todos os tipos e os stalinistas, obtivemos uma estonteante vitória. Fomos à batalha com a bandeira da IV Internacional totalmente desfraldada (…) Queremos lhe dizer que, mesmo neste remoto rincão do Extremo Oriente, neste país atrasado, você tem amigos que concordam com você, camaradas que lutam por aquilo pelo qual devotou sua vida, pelo socialismo, pelo comunismo”(6)

Trotsky saudou essa “brilhante vitória” construída na “luta irreconciliável contra o imperialismo francês e as mistificações da ‘frente popular’, como um exemplo a ser seguido pelos militantes na Índia e em outros países coloniais”. O historiador J. Buttinger comentou sobre esse período: “… o Partido Comunista foi durante muitos anos eclipsado por um movimento trotskista tão forte que chegou a ser, por um curto período, o principal grupo no comando da totalidade dos comunistas e nacionalistas”.

Mas o êxito dos trotskistas não passou despercebido pelo governo colonial. Em um telegrama de 20 de maio de 1939, o governador geral da Indochina de Saigon dizia a seus superiores em Paris que “a campanha recente de Ta Thu Thau e seus partidários exige (…) uma repressão urgente a fim de assegurar a manutenção da autoridade francesa neste país”

Em 23 de agosto, o governador geral tenta se livrar de Ta Thu Thau e lhe concede permissão para ir ao exterior tratar da saúde. No entanto, com a eclosão da II Guerra, as organizações nacionalistas e de esquerda são banidas e ele é detido em 10 de outubro em Singapura e deportado para a Indochina. 

Em 1940, o Japão invadiu a Indochina, no marco de sua expansão imperialista. A perseguição política foi geral, e a maioria dos ativistas foram enviados aos campos de trabalho forçado e para os presídios. Ta Thu Thau foi condenado a 5 anos e enviado ao campo de concentração de Poulo Condore.

No final de 1944, o grupo Outubro constituiu a Liga Comunista Internacional (LCI) e Ta Thu Thau, já liberado do campo, reconstruiu seu trabalho no grupo La Lutte.

A guerra, particularmente seus últimos anos, representou grande sofrimento para a população vietnamita. A ocupação japonesa (que manteve a administração colonial francesa) estimulou a produção de matérias primas para o esforço de guerra, o que diminuiu a produção de alimentos. Ao final da guerra, isso se transformou em pilhagem direta para alimentar as tropas, o que foi piorado pelos bombardeios americanos no Norte, que cortaram as rotas de abastecimento de arroz do Sul para o Norte. O resultado foi que entre 1 e 2 milhões de habitantes morreram de fome e doenças, em particular no Norte do país. 

O PCI havia se transformado em Viet Minh e se recuperado das terríveis perdas anteriores, sob a proteção das tropas do Kuomintang no território chinês. Atuava em Tonkin, nas proximidades da fronteira sino-vietnamita, sempre sob o ataque das tropas francesas ligadas ao regime de Vichy e que colaboravam com os japoneses. Em 15 de março de 1945, os japoneses resolvem assumir toda a administração colonial da Indochina, nomeiam um governo fantoche e as tropas francesas se retiram de Tonkin e se refugiam na China. Com isso, os guerrilheiros do Viet Minh ocupam o vazio que não foi coberto pelas tropas japonesas. 

Os trotskistas também encontram espaço e se reorganizam segundo as mesmas linhas do pré-guerra: Ta Thu Thau e seus companheiros relançam La Lutte em anamita, que chegou a publicar entre 15 e 20 mil exemplares por número entre agosto e setembro de 1945, com centro no Sul do pais. Os remanescentes do grupo Outubro se reorganizam sob o nome de Liga dos Comunistas Internacionalistas. Ambos os jornais eram diários àquela altura.

A capitulação do Japão em 15 de agosto de 1945 reavivou a esperança de independência, no contexto da brutal crise social e humanitária, e desatou uma onda revolucionária no futuro Vietnã.

No Norte, em Tonkin, houve inúmeras ocupações de terras e confiscação dos bens dos ricos, assim como a constituição, entre final de agosto e novembro, de uma verdadeira comuna entre os 30 mil mineiros do carvão em Hongay-Campha. Nos subúrbios de Saigon foram formados Comitês Operários e Populares armados, que assumiam o controle administrativo e político de seus territórios. Imensas mobilizações tomaram conta de Saigon. Os militantes da Quarta Internacional tiveram um papel destacado nessa maré revolucionária.

Ho Chi Minh proclamou a República Democrática do Vietnã (RDV) em 2 de setembro de 1945, formando um governo de coalisão com forças nacionalistas burguesas, latifundiárias e religiosas com sede em Hanói.

No Sul, houve um relativo vazio de poder entre a queda do regime japonês e a chegada das tropas inglesas em setembro. Imensas manifestações de massas ocorrem no mês de agosto, em que os trotskistas participam com colunas de milhares de pessoas. Em 25 de agosto, um governo ligado dominado pelo Viet Minh se instala no poder. 

Os ingleses, cujos batalhões estavam para chegar à cidade, ordenaram às tropas japonesas que mantivessem a ordem. Como parte dos acordos de Stalin com os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, o Viet Minh de Ho Chi Minh pronunciou-se por uma independência tutelada pela França, apoiando o desembarque de tropas britânicas em 13 de setembro, em Saigon. A chegada dessas tropas provocou um levantamento popular em 23 de setembro, durante o qual os trotskistas estiveram na primeira linha. A rebelião não contou com o apoio do Viet Minh, nem do governo da RDV, que apostavam ainda na negociação com os ingleses.

Mas a Inglaterra e a França haviam feito um acordo que entregava a Síria e o Líbano para a primeira e a Indochina, para a segunda. As tropas francesas se reorganizaram sob a cobertura inicial dos ingleses e o general francês Philippe Leclerc à frente da Força Expedicionária, declarou que sua missão era a de “restaurar a ordem” e “construir uma Indochina forte dentro da União Francesa”. A sublevação, por fim, foi esmagada, com milhares de mortos. A França tinha conseguido restabelecer a ordem colonial na Indochina.

Muito dirigentes e militantes trotskistas morreram lutando contra a reocupação francesa. Outros, inclusive Ta Thu Thau, foram liquidados por capangas stalinistas desde quando estes assumiram o governo em Hanói e depois temporariamente no Sul. Não se sabe ao certo quantos foram, as várias fontes consultadas falam em centenas, apenas se sabe o nome de alguns dirigentes conhecidos, além de Ta Thu Thau, como Tran Van Trach, Phan Van Chanh e Phan Van Hum. Devemos citar a morte em combate contra as tropas aliadas de provavelmente 200 trotskistas, cerca de sessenta dos quais trabalhadores da companhia de bondes de Saigon, organizados em brigada armada pela Liga.

A repressão mortal prosseguiu até 1950, quando os últimos remanescentes da Liga, que tinham se reagrupado após a volta das tropas francesas, foram atraídos para uma emboscada e assassinados pelo Viet Minh. 

O assassinato do líder de La Lutte, Ta Thu Thau, foi emblemático. No começo de setembro, estava reorganizando o trabalho político no Norte do país, quando foi preso em Qung Ngãi. Sua popularidade era tão grande que foi absolvido em três ocasiões pelos tribunais populares, até que foi fuzilado por ordem do chefe do Viet Minh.

Não se tratou de algo inesperado, nem de excessos de subordinados sem controle como alegado posteriormente, mas algo longamente concebido e disseminado. Em 1939, Ho escreveu em cartas publicadas em vietnamita, republicadas pelos Cahiers Leon Trotsky:

“Os trotskistas chineses (como os trotskistas de outros países) não representam um grupo, menos ainda um partido político. Eles não são mais do que um bando de malfeitores, cães de guarda do fascismo japonês (e do fascismo internacional)” (7)

Para que não restem dúvidas sobre a sua posição, vale a pena citar seu relatório ao Comintern de julho de 1939 em que dizia: “Com relação aos trotskistas, nenhuma reconciliação ou concessão são possíveis. É preciso desmascará-los como agentes do fascismo, é preciso exterminá-los politicamente”.

Em 1946, ao ser interpelado em Paris, Ho Chi Minh respondeu a Daniel Guérin: “Thau foi um grande patriota e devemos chorar por ele, mas todos os que não sigam a linha que traçamos serão esmagados”. (8)

Em março de 1946, o Viet Minh assinou um acordo com a França, aceitando o retorno das tropas francesas em troca do reconhecimento da autonomia da RDV como um “estado livre” dentro da União Francesa. O imperialismo francês aproveitou para ganhar tempo com esse acordo e em novembro do mesmo ano bombardeou o porto de Haiphong no Norte, matando cerca de 6 mil civis e depois invadiu Tonkin e expulsou o Viet Minh do governo em Hanói.

Recuando seus militantes para o interior do país, Ho começaria depois uma longa guerra revolucionária de libertação nacional, expulsando os franceses em 1954 do Norte, e os estadunidenses do Sul, em 1975. A guerra custou cerca de três milhões de mortos ao povo vietnamita.

Até 1985, havia uma rua no centro de Saigon denominada Ta Thu Thau e só então, dez anos depois da libertação do Sul do país, teve seu nome mudado. Mas ele permanece nos corações de todos os que lutam pela IV Internacional e um dia receberá, junto com seus demais camaradas assassinados, as devidas homenagens também no Vietnã!

NOTAS

1 – O Vietnã, que foi reunificado em 1975 com a vitória sobre os norte-americanos, estava dividido em três: Cochinchina, Annam e Tonkin. 

2 – O presídio estava situado em uma ilha do Mar do Sul da China, em que as condições eram terríveis. Os prisioneiros mais visados eram colocados nas tristemente famosas jaulas de tigre, em que eram obrigados a ficar acocorados, o que frequentemente causava paralisia nos membros inferiores.

3 – Referência a Sun Yatsen, fundador do partido nacionalista chinês Kuomintang.

4 – As cifras são aproximadas, mas para se ter uma ideia, havia cerca de 40 mil franceses na Indochina e 23 milhões no que hoje é o Vietnã.

5 – Citado por Pirani, Simon, em marxists.org

6 – https://www.marxists.org/portugues/ta/1939/05/18.htm

7 – https://www.marxists.org/francais/clt/1991-1995/CLT46-Jul-1991.pdf pp. 93-98.

8 – Daniel Guérin, Au services des colonises 1930- 1953, p. 22, Paris 1954

 

Fontes:

Prensa Obrera

http://banderaroja.blogspot.com

https://www.marxist.com/vietnam-1945-la-revolucion-descarrilada.htm

https://www.marxists.org/francais/clt/1986-1990/CLT40-Dec-1989.pdf

https://www.marxists.org/francais/clt/1986-1990/CLT40-Dec-1989.pdf