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MUNDO

A prisão de Bannon e um muro no meio do caminho de Trump

Rogério Freitas, Canadá

Foi em um belo iate na costa de Connecticut que Steve Bannon, principal estrategista da extrema direita mundial, foi preso na semana passada. O iate foi emprestado pelo chinês Guo Wengui, um dos bilionários que frequentemente aparecem na lista da Forbes e tem grande espírito de perseguidor de democracias, a exemplo, do seu ódio contra os duradouros protestos de Hong Kong. Bannon foi acusado de desviar recursos da campanha coletiva da construção do muro da vergonha de Donald Trump. O projeto chamado “We Build the Wall” tem grande adesão da população branca, racista e republicana que apoia Trump e políticas antidemocráticas. A campanha ganhou muita visibilidade porque foi criada por Brian Kolfage em 2018, um veterano de Guerra, e impulsionada pelo poder político e ideológico de Bannon. Além do estrategista outras personalidades estão envolvidas neste projeto como o ex-secretário de estado do Kansas Kris Kobach e David Clarke, ex- Sheriff de Wisconsin. Essas pessoas representam uma espécie de Comitê Internacional do ódio. Clarke, por exemplo, o ex-Sheriff de Wisconsin é o principal responsável pela difusão do discurso anti-imigrante em Wisconsin e recentemente, por ocasião dos últimos protestos contra a truculência policial que matou mais um jovem negro, desta vez Jacob Blake, afirmou: “Estou cansado de ver esses subumanos serem autorizados a destruir propriedades”1.

Bannon saiu da prisão poucas horas depois de pagar uma fiança de 5 milhões de dólares. Seu sorriso irônico combinou com suas primeiras palavras, declarando perseguição contra ele pelos inimigos da nação americana. Seu discurso faz coro com o de Brian Kolfage que declarou em suas redes sociais que a “caça as bruxas começou” fazendo referência ao sistema judiciário americano que segundo ele está cada vez mais autoritário, e que os EUA está a beira do colapso e, portanto, a única alternativa é Trump ser vitorioso nas próximas eleições2. Horas após a prisão de Bannon, Trump em entrevista disse que não estava envolvido neste fato e que lamentava o ocorrido com Bannon. Todavia, o quadro geral desta prisão representa o momento hodierno que os Estados Unidos vive. Para Amanda Carpenter3, a prisão de Bannon não se trata de uma anomalia, mas sim uma característica própria do governo Trump: corrupção. Diz ainda ironicamente que Bannon é o mais recente aliado de Trump depois de receber o par de “braceletes de metal” e segue o mesmo destino de outros como o de Roger Stone.

A prisão de Bannon e a construção do muro conectam-se ainda com a recente tensão comercial entre México, Estados Unidos e Canadá. Desde o início deste mês de agosto Trump decidiu restaurar a tarifa de 10% sobre as importações de alumínio do Canadá, o que imediatamente fez Trudeau criar tarifas retaliatórias contra essa medida dos EUA. No México a pressão aumenta na fronteira com os EUA. Trump ameaça cobrar imposto sobre todos os carros que passarem na divisa dos dois países. Essa taxa seria revestida para a construção do muro e assim Trump cumpriria em parte a promessa feita de que os mexicanos é quem pagariam pela construção do muro. O prefeito da cidade de Juarez, Cabada, criticou esse imposto e disse que se trata de uma manobra política destinada a angariar apoio antes das eleições nos EUA em novembro”4.

Bannon que deixou a casa Branca em 2017 e parece retornar por tabela como um dos aliados de Trump, sem o dever de depor na próxima semana no tribunal de Manhattan, simboliza perfeitamente, o “privilégio branco” da classe média conservadora que alimenta o sentimento de ódio contra imigrantes, além do racismo estrutural existente na cultura americana. Bannon foi preso em um iate luxuoso e foi acusado de gastar o dinheiro desviado para pagar viagens, carros, cassinos, cartões de créditos, enfim, as luxurias da burguesia branca. Por outro lado, devido à pandemia muitos trabalhadores perderam seus empregos; outros perderam suas vidas e ainda outros milhares estão por morrer por não ter o que comer. São milhões de americanos que estão passando fome em meio à pandemia. O portal da CNBC contou a situação de Sheila Ritter, residente em Denver, que foi despedida de seu emprego em 14 de março no mesmo dia do aniversário de sua filha. Ela disse que isso foi devastador e que nas últimas 48 horas tinham comido apenas uma tigela de mingau de aveia e um cachorro-quente5.

A prisão de Bannon revelou o “jogo sujo” por trás das construções do muro da vergonha. Acredito que o desespero maior existente neste momento nos EUA e associado com a iminente eleição americana é o medo da “América” não ser mais branca. É o medo dos conservadores perderem seus privilégios. É o medo dos oprimidos não terem mais medo do establishment da elite americana que se produz e reproduz na figura nauseante de Donald Trump e seus correligionários como Steve Bannon.

Depois da morte de George Floyd que sacudiu o mundo de dor e revolta, agora foi a vez de mais um jovem negro, Jacob Blake, ser assassinado com 7 tiros por um agente de polícia em Wisconsin. Todavia, a resistência contra as truculências policiais tem só aumentado nos Estados Unidos. A próxima eleição americana tem como palco uma panela de pressão prestes a explodir. O momento é decisivo. Os supremacistas brancos reagem atirando com fuzil em manifestantes antirracistas como se viu na cidade de Kenosha, em Wisconsin, mas o desafio é não desistir e lutar contra qualquer forma de opressão e construir uma rede de solidariedade internacional. O objetivo é derrotar Trump nas próximas eleições derrubando muros e construindo esperanças. Resta saber se no terreno das eleições Biden está disposto a mudar o establishment ou manter os simbolizados privilégios de Bannon. Ainda assim, o que se sabe é que independentemente das eleições a luta de classes só tende a aumentar no próximo período, no ainda coração do capital, os Estados Unidos.